Julgamentos rápidos ou justos?
Os julgamentos devem ser rápidos sem perder aderência ao caso concreto e preservando sempre o exercício democrático de manifestação nos autos e de dilação probatória.
quarta-feira, 10 de agosto de 2016
Atualizado em 9 de agosto de 2016 10:35
Julgamentos rápidos ou justos? Realmente o jurisdicionado tem que fazer uma escolha? A aceleração na tramitação dos processos deve mesmo ser confundida com mitigação do contraditório e da ampla defesa? Evidentemente que a celeridade e as demais garantias fundamentais do processo devem caminhar juntas para que os magistrados possam entregar a tutela jurisdicional dentro de um prazo razoável.
O legítimo exercício do direito de defesa, a possibilidade de produção de provas e a liberdade de argumentação devem ser estimulados para que haja qualidade na prestação jurisdicional, sendo certo que todos esses momentos devem ser resguardados dentro de um ambiente de agilidade. A burocracia e a lentidão da máquina estatal não podem ser entraves na atividade jurisdicional e o tempo não pode ser tão nocivo a ponto de afastar o jurisdicionado e permitir o esfriamento do direito tutelado.
Logicamente que a tramitação processual e seus ritos previstos em lei não podem obstaculizar a entrega da tutela jurisdicional, mas apenas garantir que essa ocorra dentro dos limites de igualdade e de respeitabilidade das garantias fundamentais do processo. Um julgamento rápido e sem as devidas cautelas na produção probatória e na exaustiva retórica argumentativa, definitivamente não é um julgamento justo. Por óbvio, o jurisdicionado exige do Poder Judiciário um julgamento dentro de um limite de razoabilidade temporal e com um patamar de qualidade aceitável. Assim, devemos considerar como adequado um julgamento que observa uma razoabilidade na entrega jurisdicional e que guarda relação com a aceitabilidade da decisão proferida.
Por não serem valores antagônicos, o legislador tem verdadeira obsessão por construir leis que tenham por concepção gerar aceleradores na prestação da tutela jurisdicional. Para viabilizar uma atividade de julgamento e de sua efetivação que busque conciliar a duração razoável do processo e as garantias fundamentais do processo, uma série de reformas processuais culminadas pelo novo Código de Processo Civil trouxe vias expressas pretensamente seguras para entrega da tutela jurisdicional. Apenas para ilustrar, a técnica de julgamento de causas-padrão via recursos repetitivos, incidente de resolução de demandas repetitivas e incidente de assunção de competência são vias de alargamento da condição de resolução de casos pelo Poder Judiciário.
Vejam ainda que a valorização dos precedentes e, até o instituto da tutela de evidência, também se presta a encontrar caminhos menos longos para a prestação jurisdicional. Precisamos, por certo, zelar para que os julgadores apenas se valham dessas novas esteiras de condução processual dentro dos limites da legalidade e que as garantias de ampla defesa e contraditório não sejam prejudicadas.
Não basta que o Poder Judiciário produza decisões rápidas, tornando claramente necessário que seja assegurado aos jurisdicionados uma participação efetiva com direito a produção de alegações e provas. Caminhos abreviados não podem ser confundidos com caminhos inseguros, imprecisos ou incompreensíveis. A desburocratização da marcha processual e o objetivo de maior produtividade não podem colocar em risco as garantias fundamentais do processo. Duração razoável do processo e contraditório não são princípios colidentes e devem ser aplicados conjuntamente para a persecução do processo justo.
Aceleração de julgamentos e prestígio a isonomia de decisão não são mantos de proteção para julgamentos descolados da realidade e sem qualquer ponto de contato com a individualidade de cada caso específico. Ao passo que é respeito ao princípio da igualdade o encontro de soluções aproveitáveis para todos os jurisdicionados em situações idênticas, a própria igualdade substancial prevê a imposição aos julgadores de análise de cada caso na sua especificidade.
Os julgamentos devem ser rápidos sem perder aderência ao caso concreto e preservando sempre o exercício democrático de manifestação nos autos e de dilação probatória.
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*Hugo Filard é sócio do setor Contencioso Cível do Siqueira Castro Advogados, doutorando e mestre em Direito pela PUC/SP. Bacharel em Direito pela UFRJ.