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Para quem resiste

Neste XI de Agosto, minhas humildes palavras não são dirigidas para quem preocupa-se apenas com os honorários. Os parabéns hoje são para homens e mulheres que resistem neste inesgotável ofício que é a advocacia.

segunda-feira, 8 de agosto de 2016

Atualizado às 08:00

"Antes da manifestação do ato que pôs em andamento a Criação, o Indefinido havia formado em seu pensamento um desdobramento representado pela balança" M.V.K. Enel, autor de "Os Mistérios da Vida e da Morte"

Para manter uma balança equilibrada não é necessário uma dieta rígida. É preciso que haja pessoas que tenham em si o intrínseco desejo de a assim deixar. A balança, entretanto, cada vez mais pende ou para um lado ou para o outro. Está cada vez mais difícil vê-la exata, como estava no mais antigo dos dias. Isso, porquê, quem dela deveria cuidar, está ocupado com outras coisas, como passar em concursos com salários acima de dois dígitos. Falta vocacionados. Mas ainda há quem resista.

Neste XI de Agosto, minhas humildes palavras não são dirigidas para quem preocupa-se apenas com os honorários. Os parabéns hoje são para homens e mulheres que resistem neste inesgotável ofício que é a advocacia.

Sim, minha cara advogada e meu caro advogado, os parabéns são para vocês, que buscam garantir que a justiça seja feita, mesmo que isso lhe custe gastrite por (não) comer mal enquanto espera as nem sempre pontuais audiências.

Sim, minha cara advogada e meu caro advogado: esta profissão é tão complexa de se definir que o professor Plácido e Silva teve que usar 93 linhas em seu "Vocabulário Jurídico" para tentar dizer o que são na verdade, resistentes (a saber: calúnia tem 53 e nulidade, 124).

Sim, minha cara advogada, você que ainda resiste nesta profissão mesmo com incontáveis convites para sair e insiste em despachar no fórum, dar carga em autos sob outros também altos saltos e, muitas vezes, foi privada do seu direito natural de gestar, parir e amamentar porque tinha prazo.

Sim, minha cara advogada e meu caro advogado, você que resiste ao ouvir mais lamentações de quem, com aflição, lhe procura pedindo uma solução na lei, mas que não está muito além do perdão.

Você, que usa os códigos que a vida lhe deu em grandes e pequenas comarcas, e jurou defender o Estado Democrático de Direito e que, como nos ensinou Rui Barbosa, tem o coração não apenas como um "assombro fisiológico", e permite que toquem as mais bradas injustiças para usar suas palavras e (tentar) corrigi-las.

Para você, que está em uma profissão regulamentada por Claudio, mas ainda insiste em ter audiências a R$25 e cujo prestígio foi trocado pelo descaso ao se ver visto pela sociedade como um "espertalhão".

Você, minha cara advogada e meu caro advogado, que tem direito e garantias, mas anda recebendo cartas bombas e visitas não convidadas para revirarem seu sagrado local de trabalho.

É para estes que resistem nesta bela, mas muitas vezes árdua tarefa de defender a Constituição, que estão não apenas os meus parabéns como a mais profunda gratidão e inspiração em continuar os estudos da lei, mas, acima de tudo, resistir na equidade da balança. Para sempre.

Este texto é inspirado no meu pai, Renato Farias Santos (OAB 68641/SP), que considero o mais talentoso dos causídicos e abdicou da advocacia, sua grande e apaixonante vocação, para criar seus filhos com trabalho honesto, justo e digno no ramo da construção civil.

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*Ivy Farias, 35 anos, é jornalista, estudante de Direito que almeja ser uma resistente um dia.






*Foto: Gustavo Scatena/Imagem Paulista/Divulgação.

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