Quando os interesses estão alinhados, não há conflito
Devemos sempre procurar saídas harmoniosas, sem desgastes para as partes, mas sempre com um esforço interno de ir ao encontro daquilo que é o melhor para si e para o outro.
terça-feira, 5 de julho de 2016
Atualizado em 4 de julho de 2016 17:14
Cada vez mais o mundo está acelerado e as decisões tem de ser tomadas rapidamente. Muitas delas são tomadas sem muito pensar pois as consequências não serão impactantes, ou seja, ocorrem como se fossem automáticas. Porém, há outras que requerem algum tempo para serem pensadas, amadurecidas, maturadas. Quando decidir no automático e quando pensar sobre por um pouco mais? Tudo depende da relevância do assunto naquele momento e de suas consequências previsíveis naquele primeiro momento. Por vezes, minimizamos o impacto de algumas decisões pois entendemos que elas são de menor importância, mas não são. Nunca.
A quantidade imensa de demandas aliada ao curto espaço de tempo que tem de ser resolvidas têm levado as pessoas a um nível alto de stress e ansiedade.
Quantas vezes não conseguimos avaliar o que de fato é importante e relevante em nossas vidas ou em nossas empresas? Quantas vezes não nos deparamos com a seguinte questão: por que mesmo foi que tomei essa decisão? Qual era o contexto?
A motivação da tomada de qualquer decisão chama-se interesse. E por que não damos atenção aos nossos interesses? Por que não refletimos para tomamos qualquer decisão? Por que não tomamos aquela decisão que nos fará mais feliz ou nos trará maior felicidade? Porque para tomar a melhor decisão para si, aquela que trará maior felicidade, requer autoconhecimento. E isso dá trabalho? Sim, dá e muito. Mas essa é a parte boa: tudo está em nossas mãos.
É mais fácil eu dizer que algo não ocorreu de determinada maneira por que havia um outro fator, alheio a minha, a sua, a nossa vontade. É muito mais fácil colocar a culpa que algo não deu certo em outro alguém a tomar as rédeas da própria vida e tornar a decisão consciente.
Então, o que ocorre quando os interesses não estão alinhados? Conflito. Infelizmente. As pessoas ficam desgastadas, o que gera um mal-estar e há um impasse que precisa ser resolvido. Muitas vezes, há que se dizer, desnecessariamente.
Diante desse cenário, algumas pessoas recorrem ao judiciário, outras a arbitragem. Outros ainda a mediação de conflitos, a qual foi regulamentada pela lei 13.140 de 26 de junho de 2015, que dispõe sobre a mediação entre particulares como meio de solução de controvérsias.
No caso do judiciário e da arbitragem, a decisão está sempre nas mãos dos outros. Cada parte contrata seu advogado, apresenta a sua versão dos fatos (que pode ser distorcida, parcial, incompleta, pois depende da percepção de quem conta e do advogado que a escreve) e seus argumentos, provas que evidenciam seu entendimento, mas a decisão é sempre de alguém que não tem interesse algum naquele caso (o que garante a imparcialidade), que pode ou não fazer questionamentos as partes, não pede esclarecimentos apenas toma a sua decisão com base naquilo que foi apresentado, sob a sua visão de justiça, que é parcial pois além de dever ser dada de acordo com a sua interpretação da legislação, há também a questão de foro íntimo próprio do juiz, que também julga de acordo com seus valores e princípios. As partes podem não conseguir aquilo que pretendiam, muito pelo contrário, podem ter um resultado adverso e ficarem surpresas com isso.
No caso da mediação de conflitos ou solução de controvérsias, o conflito já está instaurado e o que se pretende é simplesmente resolver as questões em controvérsia, o que ocorre na judicialização e na arbitragem. No caso da mediação, os mediadores são facilitadores de uma conversa entre as partes, partindo das questões conflitantes, a fim de permitir que as partes possam se compor da melhor forma possível, observando um rito previsto em lei. A ideia é que sejam colaborativos, pois devem colaborar, facilitar o diálogo para que as próprias partes cheguem a um acordo. Muitas vezes também não fazem questionamentos ou pedem esclarecimentos.
Por que o conflito é necessário? Será que as partes, os times nas diversas empresas, as famílias não podem conversar antes de haver um conflito? Por que não sentar e alinhar os interesses, administrar as expectativas e se alinhar para alcançar um bem estar entre todos? Por que não ter uma conversa amigável? Por que não conversar antes da controvérsia ocorrer? O que se vê muitas vezes que o que falta é uma conversa afinada e direcionada para que cada um decida o que é melhor para si e o que e o melhor para todos.
Quantas vezes nos dizem o que podemos e o que não podemos fazer, sem procurarmos entender e questionar o que realmente queremos, sem qualquer tipo de julgamento ou limitação, em especial, aquilo que é permitido pela legislação vigente? Quantas vezes nos permitimos sermos nós mesmos na tomada de decisão, para a partir desse questionamento genuíno perguntarmos se é possível (seja do ponto de vista ético, legal ou sob qualquer outro aspecto)? Comunicamos a nossa intenção ao outro da razão daquela tomada de decisão? Isto está evidenciado em algum documento? É importante a transparência entre as partes, sempre. Para que uma relação seja duradora, ela ser transparente e verdadeira, durante toda a sua vida. Ainda que muitas vezes isso traga incomodo às partes.
Costumo dizer que os advogados nos dizem quais são os limites da legalidade. Como se fosse uma mesa, você pode ir até aqui ou até ali e se passar disso, cai na ilegalidade. Mas e o mundo de possibilidades? Ele vai além dos limites da mesa, ele é ilimitado. É essencial que se explore todas as possibilidades, sem qualquer tipo de juízo, de restrição, de limitação para que se alcance e se entenda aquilo que e realmente desejado, pretendido.
Tudo deve ser comunicado sempre, sem a pretensão de se "levar vantagem", pois qualquer tipo de relação deve estar sempre em equilíbrio para ambas as partes. As relações são construídas com base na transparência, verdade e honestidade. Ou seja, cada parte deve sentir que há um equilíbrio no vinculo, qualquer que seja o tipo de vínculo que elas têm. Quando há um desequilíbrio, algum ajuste deve ser feito. Mas antes, deve-se proceder uma boa conversa para comunicar que os interesses precisam ser alinhados novamente. E algumas vezes, precisamos de ajuda de alguém que nos faça esse questionamento, alguém que não esteja envolvido na situação, que tenha uma visão isenta, imparcial.
Muitas vezes aquilo que era importante não é mais, há revisão de crenças, de valores. O que foi relevante quando da assinatura de contrato, quando se decidiu contrair o matrimônio ou quando se decidiu contratar alguém para trabalhar na equipe, pode não mais ser hoje. Hoje, tudo pode ter mudado. Tudo deve ser alinhado o tempo inteiro, muita conversa, muito diálogo. Isso também dá trabalho. E quando não se sabe o que fazer em um mundo que tem essa velocidade? Por que não pedir ajuda? Isso não pode reduzir o atrito?
Aí entra o coaching de mediação de interesses. No coaching de mediação de interesses, procura-se entender o que realmente é pretendido, ou seja, qual o interesse real naquela situação e como pode ser alcançado. Em outras palavras, procura-se alcançar qual o propósito das partes, onde está o limite de cada uma delas e onde cada um está disposto a ser flexível e a fazer renúncias.
Porém há outra questão que se coloca aqui e que é muito importante: nem tudo o que é legal é moral e nem tudo o que é moral é legal. O que é moral hoje, pode não ser amanhã. O que é legal hoje, pode não ser amanhã. E lembrando que a legislação sempre está atrás da realidade, procura sempre ajustar-se a ela. Quantas leis que não foram revogadas, caíram em desuso?
Quantas vezes aquilo que genuinamente queremos ficar de lado muitas vezes? Há uma inversão de prioridades quando da tomada de decisão e isso só é percebido depois de algum ou muito tempo. Em muitos casos de mediação, procura-se negociar cláusulas de contratos sem entender a motivação de elas existirem. Dessa forma, quando está instaurado o conflito, as partes não se lembram do porquê de determinadas motivações ou reconhecerem o que cada uma das partes colaborou desde que assumiram um compromisso até aquele momento. E claro, que muitas vezes o cenário mudou desde a assinatura do contrato até aquele momento atual, por exemplo. Mas essa real motivação ajuda a dar um norte na negociação. Por que renunciar a determinada clausula no momento de assinatura e revê-la algum tempo depois? Houve um desequilíbrio?
O mesmo se aplica a contratações. Quando contratamos alguém para cumprir determinadas funções, quais eram as habilidades que eram pretendidas para aquele perfil de vaga? Qual era a descrição das atividades daquela vaga? O que houve de lá para cá?
Para casamentos vale o mesmo. E sempre, devemos rever as decisões, sem medo. Com tranquilidade, com naturalidade podemos revê-las e discuti-las. Sem entrar em conflito. Sem causar dor a outra parte.
Acredito que em um processo tranquilo, sereno, onde os ânimos estejam calmos e há espaço para o diálogo tudo flui com mais facilidade. Devemos sempre procurar saídas harmoniosas, sem desgastes para as partes, mas sempre com um esforço interno de ir ao encontro daquilo que é o melhor para si e para o outro. Às vezes é hora de deixar para trás, outras é hora de ir além.
Por qual caminho você prefere ir?
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* Patricia Eduardo Cezaroti é coach integral da Núcleo Pluri.