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É a falta de mudança no comportamento social que nos indigna!

Esquecemos que há responsabilidade individual no social, de tudo o que fazemos. Vamos ser politicamente corretos.

sexta-feira, 10 de junho de 2016

Atualizado em 8 de junho de 2016 10:08

No Rio de Janeiro, adolescente foi vítima de estupro. Causou indignação o número de agressores, nada menos do que 33. Na polícia, a jovem, segundo declarou, foi exposta e desrespeitada; nas mídias sociais, está sendo julgada. Não apenas por homens, mas também por mulheres. Uns dizem que ela está mentindo, que ela é prostituta, que gosta de sexo coletivo, outros, que se trata de uma grande "armação" entre os envolvidos, inclusive ela. Há os que até acreditam na agressão, mas a responsabilizam. Deixemos todos estes argumentos de lado e nos concentramos no essencial, no crime de estupro, que é abominável e vitima diariamente inúmeras mulheres em todo o Brasil. É contra o estupro, um crime já contumaz, que devemos envidar todos os esforços para conseguir o seu fim.

O estupro, talvez muitos homens e mulheres ainda não saibam ou fingem que não, deixa marcas que jamais se apagam. Em todas as suas vítimas, independentemente de classe social, cor de pele, religião, idade ou grau de instrução. Esta dor as persegue por toda a vida e muitas, mesmo com apoio da família, dos amigos e até psicológico, não conseguem superá-la. Somente a vítima ou quem convive com ela conhece de fato esta realidade, indiscutivelmente bastante difícil. Nenhuma vítima de estupro é responsável pelo crime, qualquer que seja a circunstância. Isso tem que ficar bastante claro, inclusive para algumas autoridades. E estupro hoje, pela Lei, é muito mais do que a penetração.

Impressiona-me a maneira como algumas pessoas, não sei se por ignorância, conservadorismo ou machismo retrógrado trafegam pelo caminho fácil do julgamento. Desrespeitam a mulher e a tratam como um ser de segunda categoria, como se não tivessem direitos ou se estes fossem diferentes aos seus. Muitos ainda não entenderam ou não querem entender que a mulher é dona exclusiva de seu próprio corpo. E nada e ninguém pode tocá-lo sem o seu consentimento. Tá difícil compreender ou precisa desenhar?

Esta postura desumana, frequente sobretudo nas redes sociais, é evidente nos comentários referentes ao caso polêmico ocorrido com a adolescente no Rio de Janeiro. Falaram de suas roupas provocantes, de suas amizades "pouco recomendáveis" e sobre sua visita a casa do namorado. Sobraram críticas até para os seus pais que, na opinião destes juízes amadores, deveriam tê-la sob rédeas curtas. Um absurdo atrás do outro, um desrespeito total à vítima, à mulher. Até quando?

Enquanto isso, mundo afora, um cartunista brasileiro perdeu o emprego que tinha na Chiaroscuro Studios, a maior agência do mundo em HQ porque fez um comentário sarcástico na mídia social sobre esse estupro coletivo entendido pela empresa como distante da sua política interna e externa. A ONU repudiou também a ocorrência do RJ e pediu fortes medidas. Isso é ser politicamente correto.

Não nos cabe julgar, não nos cabe falar mal da vítima. Para isso existe a Justiça. Devíamos nos preocupar com um delegado falando que não ocorreu estupro, quando há um vídeo mostrando o estupro, no conceito atual da Lei. Devíamos nos preocupar com quem continua falando o que pensa, sem pensar! Esquecemos que há responsabilidade individual no social, de tudo o que fazemos. Vamos ser politicamente corretos.

Enquanto essa cultura não mudar, veremos cada vez mais atos, fatos, pensamentos e desfechos que não mudarão a realidade. Infelizmente!

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*Rosana Chiavassa, advogada (Chiavassa Advogadas Associadas), é presidente da ASAS - Associação das Advogadas, Estagiária e Acadêmicas de Direito do Estado de São Paulo.

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