Previdência do servidor público
Não há exagero na afirmação de que a maioria dos que optam pelo serviço público o fazem levados pela idéia de segurança, de estabilidade, de garantia de um futuro tranqüilo, que inclui uma aposentadoria que permitirá uma velhice com dignidade.
sexta-feira, 25 de julho de 2003
Atualizado em 24 de julho de 2003 16:38
PREVIDÊNCIA DO SERVIDOR PÚBLICO
Hugo de Brito Machado *
Quando se fala em reforma da Previdência, algumas questões devem ser colocadas para suprir a omissão das autoridades que gastam o dinheiro público em campanhas publicitárias, bem elaboradas para criar um clima favorável na opinião pública.
Uma dessas questões diz respeito ao financiamento da seguridade. No setor privado, o empregador paga contribuição bem mais elevada do que a contribuição paga pelo segurado. Já no setor público, o empregador simplesmente não paga absolutamente nenhuma contribuição.
Não se quer dizer com isto que o Estado deva pagar contribuição patronal. Não é isto. Mas o Estado deve realmente arcar com os custos da Previdência de seus servidores. Se não paga contribuições para esse fim, deve arcar com o ônus dos benefícios. Ninguém, aliás, será melhor segurador de seus servidores do que o próprio Estado. Perene, não sujeito à falência, titular de infinitos meios de recomposição, o Estado deve de fato garantir a segurança daqueles que prestam serviços públicos.
Nas sociedades ditas capitalistas, cada um dispõe de duas importantes opções quanto à obtenção dos bens materiais. Uma, é a denominada iniciativa privada. A outra, o serviço público. Cada uma delas tem suas vantagens e suas desvantagens, e a escolha certamente dependerá do temperamento de cada um.
Na iniciativa privada o risco está sempre presente. Pode-se ganhar bem durante algum tempo e de repente, em face de uma crise econômica, pode-se perder tudo. Tem-se mais liberdade de ação e pode-se até chegar a formar um patrimônio significativo, mas a insegurança estará sempre presente, a exigir trabalho incansável e criatividade permanente.
No serviço público o risco é mínimo. Ganha-se pouco mas se tem a segurança de que o ganho, embora pequeno, está garantido. E se tem sobretudo a certeza de que basta ser um bom cumpridor de normas, um bom seguidor da orientação governamental, ser pontual e assíduo, e o futuro está garantido. Não há nenhuma possibilidade de se formar patrimônio, agindo honestamente, mas se tem garantia de uma vida digna estável, inclusive com uma aposentadoria que garantirá os bens materiais necessários à subsistência até o fim da vida.
Não há exagero na afirmação de que a maioria dos que optam pelo serviço público o fazem levados pela idéia de segurança, de estabilidade, de garantia de um futuro tranqüilo, que inclui uma aposentadoria que permitirá uma velhice com dignidade. Existem, por certo, os que optam pelo serviço público movidos por motivações outras, nem sempre confessáveis. Mas com certeza estes compõem a minoria, talvez mesmo uma parcela não significativa no contingente de servidores públicos.
Agora, a propósito de reforma da Previdência, e a pretexto da carência de recursos financeiros, pretende o governo federal limitar a aposentadoria do servidor público a um teto, e além disto cobrar contribuições dos inativos. Cogitam de um argumento absolutamente falacioso, segundo o qual a garantia de proventos integrais só pode referir-se ao valor líquido dos vencimentos. Com isto estaria justificada a redução dos proventos, ou a cobrança de contribuição dos inativos. Tal argumento é falacioso porque proventos integrais é expressão que na verdade indica proventos iguais aos vencimentos. E sem o desconto de contribuição porque esta se destinava exatamente à formação de um fundo para fazer face à aposentadoria. Uma espécie de prêmio de seguro, que não tem mais sentido depois da aposentadoria porque outra aposentadoria não se vai mais alcançar.
Pior de tudo, porém, é que as restrições à aposentadoria do servidor público atingem precisamente aquela vantagem que motiva a maioria das pessoas que ingressam no serviço público, isto é a garantia de uma aposentadoria que lhes permite uma vida digna na velhice. Sem essa garantia, talvez as opções pelo serviço público sejam apenas, ou na maior parte, as daqueles que optam pelo serviço público por motivações inconfessáveis.
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* Juiz aposentado do TRF da 5ª Região, Professor Titular de Direito Tributário da UFC, Presidente do Instituto Cearense de Estudos Tributários e autor de diversas obras, entre elas o Curso de Direito Tributário editado pela Malheiros Editores.
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