Taxa de lixo
Em fevereiro de 2.002 foi promulgada a Lei Municipal n. 13.478/02, que instituiu a "Taxa de Resíduos Sólidos Domiciliares - TRSD", popularmente conhecida por Taxa de Lixo. Trata-se de tema atual e polêmico do direito brasileiro, visto que grande parte dos juristas e até mesmo parcela dos Tribunais já a considera inconstitucional.
terça-feira, 22 de julho de 2003
Atualizado às 13:57
Taxa de lixo
Fábio Porto Godinho da Silva*
Em fevereiro de 2.002 foi promulgada a Lei Municipal n. 13.478/02, que instituiu a "Taxa de Resíduos Sólidos Domiciliares - TRSD", popularmente conhecida por Taxa de Lixo.
Trata-se de tema atual e polêmico do direito brasileiro, visto que grande parte dos juristas e até mesmo parcela dos Tribunais já a considera inconstitucional, ou seja, a nova taxa instituída pela Prefeitura Municipal de São Paulo pode estar se conflitando com a Constituição Federal de 1.988.
Inicialmente, cumpre salientar a diferença entre "taxa" e "imposto" no que tange a seu fato gerador. De acordo com a CF/88, os impostos são tributos graduados pela capacidade econômica do contribuinte ao passo que as taxas são cobradas em razão de atividade estatal posta à disposição dos mesmos.
Neste passo, a taxa de lixo que vem sendo cobrada dos moradores da cidade de São Paulo, baseada na metragem de suas propriedades, tem natureza própria dos impostos, o que a torna inconstitucional. Haja vista o artigo 145, §2ºda CF: "As taxas não poderão ter base de cálculo própria de impostos".
Assim, de acordo com tal preceito constitucional, o fato gerador da taxa de lixo não poderia ser o tamanho da propriedade, mas sim a utilização do serviço. No entanto, é certo que a forma justa de se calcular o montante que cada um deveria pagar a taxa, qual seja, de acordo com a quantidade ou o peso do lixo que cada um usou, é inviável e até mesmo impossível, porém, isso não dá direito ao Município cobrar do contribuinte um serviço por ele não utilizado.
Tome-se como exemplo um grande terreno baldio, onde não haja moradores e sequer construções. Nesse caso, de acordo com a lei vigente, o proprietário terá que pagar uma alta taxa de lixo sem ter sequer se utilizado do serviço. Ou até mesmo uma casa de campo ou de praia, com freqüência somente nos finais de semana e produzam pouco lixo; se houvesse tal taxa nos respectivos municípios os proprietários teriam que pagar, a título de taxa de lixo, o mesmo que seus vizinhos, que tem como residência fixa uma casa do mesmo tamanho e até mesmo com maior número de moradores, que produzem, logicamente, uma quantidade de lixo significantemente superior aos outros.
Não bastasse isso, já está "incorporada" no Imposto Predial e Territorial Urbano - IPTU - alíquota destinada à limpeza pública, o que configura, ainda, a bi-tributação sobre o mesmo serviço, mais um motivo para que seja entendida como inconstitucional a taxa de lixo.
Por fim, o artigo 145, inciso II da CF/88, confere aos Municípios a competência para instituir:
"taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos à sua disposição" (grifei).
No entanto, desrespeitando a reserva constitucional, a Lei 13.478 classificou os serviços também em indivisíveis, como fica claro no artigo retirado da própria lei:
Art. 21 - Segundo sua natureza, os serviços de limpeza urbana prestados em regime público classificam-se em: I - serviços divisíveis; II - serviços indivisíveis essenciais; e III - serviços indivisíveis complementares. (grifei)
No mesmo sentido, anote-se a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em recurso interposto no Estado do Rio de Janeiro: "Iniciado o julgamento de embargos de divergência em que se discute se os serviços públicos custeados pela taxa de coleta de lixo domiciliar instituída pela Lei 691/84, do Município do Rio de Janeiro, são específicos e divisíveis para efeito do art. 145, II, da CF ("Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: ... II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição;"). A Ministra Ellen Gracie, relatora, em virtude da divergência entre as Turmas, proferiu voto no sentido de conhecer dos embargos de divergência e a eles dar provimento por entender que o referido tributo vincula-se à prestação de serviços de caráter geral, insusceptíveis de serem custeados senão por via do produto de impostos, no que foi acompanhada pelos Ministros Nelson Jobim, Maurício Corrêa e Ilmar Galvão. De outra parte, o Min. Gilmar Mendes proferiu voto no sentido de conhecer e desprover os embargos, suscitando, ainda, a aplicação do art. 27 da Lei 9.868/99 no processo incidental. Após, o julgamento foi adiado em virtude do pedido de vista do Min. Carlos Velloso".
(Clique aqui para ler a decisão no site do STF)
Nota-se, ante todo o exposto, claro desrespeito à Constituição Federal e, de modo geral, a todos os cidadãos que sofreram ou sofrerão as conseqüências desta Lei, arcando, indevidamente, com pagamentos referentes a serviços não usufruídos ou já pagos em razão de imposto que já recolheu.
Como o valor individual da taxa de lixo domiciliar tende a ser relativamente baixo os contribuintes deveriam se organizar em grupos ou associações para questionar os citados pagamentos em juízo, depositando os valores judicialmente enquanto perdurar a ação.
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*Advogado do escritório Ceglia Neto, Advogados
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