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Retrospectiva e Perspectivas do setor de Saúde

Diante da absoluta falta de estrutura, seja das operadoras, seja da saúde pública, hoje constatamos caos mais difícil de ser solucionado.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Atualizado às 08:59

A 'vida' dos consumidores com os planos de saúde nunca foi fácil. Na década de 1990 os contratos eram extremamente leoninos, com glosas hoje inadmissíveis, como AIDS, doenças infectocontagiosas, doenças crônicas, limites de dias de internação no ano, rescisão unilateral. O perfil dos consumidores também era muito diverso: 90% dos contratos eram individuais ou familiares e representavam 20 milhões de brasileiros.

Surge então a judicialização da saúde, à mercê do CDC, aprimorada com a lei 9.656/98, com a ANS, pelo Estatuto do Idoso e "zilhões" de novos tratamentos.

Como sabemos que uma lei não muda um comportamento social, o sistema continua colapsado, com variantes, obviamente. Na verdade, o que muda um comportamento social é a discussão de uma necessidade emergente naquela Sociedade. Ocorre que, diante da absoluta falta de estrutura, seja das Operadoras, seja da saúde pública, hoje constatamos um caos mais difícil de ser solucionado, pois falamos de mudança de comportamento.

A primeira mudança ocorrida na Sociedade é que os cidadãos aprenderam, de uma forma certa ou não, que para serem atendidos basta ir ao Pronto Socorro. Reflexo da perda do médico de família. Resultado? Atendimentos emergenciais lotados sem real necessidade e comprometendo, inclusive, o atendimento dos casos verdadeiramente graves. Na verdade, o que deveria ensejar a busca de uma consulta médica (de difícil marcação, ressalve-se) acarretou lotação hospitalar.

Mas, não é só isso. Esses atendimentos geram custos totalmente desnecessários às Operadoras, pois exames são pedidos, tratamentos desnecessários são dados e assim por diante. Inexiste, em qualquer País do mundo, um coeficiente leito/paciente que suporte essa busca desenfreada aos hospitais por conta de gripes, dores de cabeça e etc.

É fato que no Brasil temos Operadoras com três milhões de associados e que deveriam ter (pela OMS) disponibilidade de 4 leitos para cada 1.000 associados. Imaginem: 12 mil leitos. Piada! Isso não existe. Imaginem então quando se procura um Hospital por qualquer coisa. E essa realidade não é alterada com a edição de uma Lei. Será necessária uma ampla campanha de esclarecimento.

A segunda causa desse colapso mescla a maior longevidade do brasileiro com a evolução da medicina. É óbvio que a rápida, crescente e cara evolução da Medicina contribuiu em muito para a maior longevidade de nossos cidadãos, mas não podemos esquecer que junto a isso temos melhores condições básicas, como o atendimento multidisciplinar dos programas médicos envolvendo o cuidado de tudo que não é grave, mas é necessário cuidar: higiene, alimentação, vida mais saudável.

Ocorre que como o Brasil oferece direito universal à saúde e a indústria da medicina internacional cada vez oferece mais e mais 'milagres' de oferta de 'prolongamento de vida digna ou não', os médicos e cidadãos querem o mais moderno, o mais novo, independentemente de comprovação, inclusive. Não se recrimina essa busca desenfreada à vida. É da natureza do ser humano.

O século XXI ficará marcado como o século dos medicamentos. Mais e mais descobertas. Mais e mais curas. Mais e mais esperanças. E, com isso, mais e mais pedidos desses tratamentos. É direito do paciente. Mas, temos medicamentos que custam até R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais), seis doses. Essa conta tem que ser paga pelas Operadoras e, obviamente, vai acabar no colo do Consumidor.

É por isso que, na pesquisa divulgada pelo CFM (Conselho Federal de Medicina) feita pelo Datafolha, a negativa de fornecimento de medicamentos aparece como o primeiro lugar de reclamação e insatisfação dos Consumidores, seguida dos incessantes aumentos das mensalidades.

A terceira causa desse colapso decorre, obviamente, da crise econômica. Infelizmente, muitas pessoas estão perdendo seus planos de saúde, seja por conta do desemprego ou de corte de custos familiares / empresariais. E essa realidade está migrando essas pessoas aos SUS, que já detecta aumento de atendimentos em 5% neste ano que passou. Essa realidade não mudará enquanto o Brasil não retomar o curso da economia.

A quarta causa desse colapso decorre do fechamento de venda de contratos individuais ou familiares. Incrível! Os consumidores levaram décadas para formarem direitos básicos, como aumentos regulamentados, tratamentos dados, rescisões proibidas.

O tiro saiu pela culatra.

Justamente por conta dessas garantias, as Operadoras deixaram de vender esses contratos, lançando no mercado novos modelos que podiam ser rescindidos, ter aumentos e com auxílio da ANS, na elaboração do Rol de Procedimentos, negar os tratamentos mais modernos.

Incrível que só a ANS (boazinha) não percebe isso. Como precursora da área no Direito, sinto-me cansada de remar, remar e voltar aos problemas básicos. Não foi à toa que a 4ª maior Operadora do Brasil quebrou. E pior, quebrou tendo a ANS no controle de suas contas desde 2009.

Algo está errado. Os consumidores, os médicos e Operadoras, todos estão insatisfeitos. Quem falta aqui que está silencioso sem reclamar? Quem mais está ganhando, os hospitais, clínicas, laboratórios e indústria farmacêutica.

É curioso. Hospitais passam a ter filiais ou franquias, tal qual lojas de departamentos (estas fechando). Clínicas e Laboratórios lotados, inclusive os dos Hospitais. Indústrias farmacêuticas rindo à toa. Pena que elas não conseguiram pegar as pílulas de São Carlos. Ainda.
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*Rosana Chiavassa é advogada especializada em Direito na área da Saúde do escritório Chiavassa Advogadas Associadas.

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