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As súmulas vinculantes dos tribunais superiores no novo CPC

Ronaldo Ferreira Tolentino

Já após a vigência do Novo CPC, surge a seguinte indagação: Pode a lei ordinária atribuir efeito vinculante às decisões dos Tribunais Superiores?

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Atualizado em 17 de novembro de 2015 16:46

A estrutura do Poder Judiciário, trazida na Constituição Federal de 1988, demorou alguns anos para ser compreendida pelos operadores do direito, aí incluídos magistrados e advogados.

Durante muito tempo, mesmo após a promulgação da Constituição Federal, os operadores do direito sempre tiveram a impressão de que o Poder Judiciário Brasileiro era composto de quatro instâncias, haja vista a previsão constitucional em ordem vertical destas instâncias e dos seus recursos, aqui na legislação ordinária.

Com o passar dos anos, a Constituição, neste particular, passou a ter uma leitura mais sistemática, separando as instâncias ordinárias das instâncias extraordinárias.

Interessante para esta compreensão, os ensinamentos do advogado e Ministro aposentado Vantuil Abdala1:

"É bom que se lembre que o nosso sistema processual é o do duplo grau de jurisdição. Nada impediria que o nosso legislador tivesse adotado três ou quatro instâncias; mas não o fez; adotou apenas duas instâncias ordinárias. Nós temos o juízo de primeiro grau e a instância recursal de segundo grau, e o processo naturalmente deveria acabar aí. Inobstante, existe no processo do trabalho o recurso para uma instância superior que se destina à proteção do direito objetivo e não do direito subjetivo; à regularidade da aplicação da norma jurídica, em primeiro lugar, e só em segundo plano o direito das partes; à uniformização da jurisprudência e não à justiça do caso concreto."

No mesmo sentido, e de forma mais detalhada o professor e atual Ministro Maurício Godinho Delgado2:

"O Poder Judiciário nos sistemas jurídicos constitucionais contemporâneos, ocupa posição singular: tem o papel de solucionar conflitos surgidos no âmbito da sociedade civil e do Estado e, ao mesmo tempo, fixar parâmetros relativamente claros acerca do sentido da ordem jurídica imperante nessas realidades sociais e institucionais.

Enquanto o primeiro papel lida com o conflito concreto já instaurado, o segundo realiza-se por meio das decisões repetidas no litígios judicialmente propostos, inferindo linhas normativas gerais a partir da interpretação maturada da norma jurídica. Os dois papéis - cada um a sua maneira - cumprem o estratégico objetivo de cimentar as balizas de atuação dos distintos atores estatais e sociais, prevenindo, em vista do espontâneo cumprimento das normas jurídicas, a própria existência de futuros conflitos no cenário do Estado e da sociedade."

Ainda segundo Maurício Godinho Delgado3:

"(...)está muito claro no corpo e no espírito da Constituição que o sistema judicial estrutura-se em dois grandes níveis, intercomunicados, que realizam, cada um à sua maneira, os dois papéis acima já enfatizados. No caso trabalhista, a chamada instância ordinária (Juízos de 1º e 2º Graus), ao lado dos tribunais superiores, ou seja TST e STF.

A função da instância ordinária é da solução aos litígios trazidos a seu exame quer por meio da imprescindível conciliação judicial, quer por meio da decisão prolatada (sentença ou acórdão). Solução célere, pronta, rápida; solução eficaz e que confira efetividade à ordem jurídica.

A função constitucional precípua dos tribunais superiores é racionalizar e uniformizar a leitura da ordem jurídica, em suas matrizes legais e constitucionais, permitindo que a instância ordinária entregue a solução judicial concreta que lhe cabe a partir de parâmetros normativos relativamente harmônicos em toda a República e Federação. Essa função racionalizadora e uniformizadora também tem de ser cumprida de maneira célere, pronta, rápida, para que se permita conferir o máximo de eficácia e efetividade à ordem jurídica do país.

(...)

Não é o TST, evidentemente, suposto terceiro grau de jurisdição, destinado a realizar a justiça do caso concreto, como se tratasse de suposta terceira chance aberta ao jurisdicionado. A sua função constitucional, republicana e federativa é outra, de interesse da ordem jurídica, de interesse da República e da Federação - não sendo mais apenas um mecanismo de solução de litígios concretos ocorridos na vida real"

E também o Ministro Gilmar Ferreira Mendes:

"A função do Supremo nos recursos extraordinários - ao menos de modo imediato - não é a de resolver litígios de fulano ou beltrano, nem a de revisar todos os pronunciamentos das cortes inferiores. O processo entre partes, trazido à Corte via recurso extraordinário, deve ser visto apenas como pressuposto para uma atividade jurisdicional que transcende os interesses subjetivos. Tal perspectiva, a par de fortalecer o papel principal da Corte, qual seja a defesa da Constituição, representa a única alternativa possível para a viabilização do Supremo."4

Diante desta nova leitura da sistemática jurídico-processual e com o ímpeto de racionalizar o sistema recursal e evitar que os Tribunais Superiores sejam obrigados a se manifestarem repetidas vezes sobre a mesma tese jurídica, o novo CPC estabelece no art. 927:

"Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:

I - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;

II - os enunciados de súmula vinculante;

III - os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;

IV - os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional;

V - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados."

Na mesma linha a CLT traz o art. 896-C, que não é tão direto como o NCPC, mas interpretado junto com a Regulamentação dada pelo TST tem a mesma essência.

"Art. 896-C da CLT:

§ 11. Publicado o acórdão do Tribunal Superior do Trabalho, os recursos de revista sobrestados na origem:

I - terão seguimento denegado na hipótese de o acórdão recorrido coincidir com a orientação a respeito da matéria no Tribunal Superior do Trabalho; ou

II - serão novamente examinados pelo Tribunal de origem na hipótese de o acórdão recorrido divergir da orientação do Tribunal Superior do Trabalho a respeito da matéria.

§ 12. Na hipótese prevista no inciso II do § 11 deste artigo, mantida a decisão divergente pelo Tribunal de origem, far-se-á o exame de admissibilidade do recurso de revista."

ATO 491/2014 - TST

"Art. 21. Publicado o acórdão paradigma:

I - o Presidente ou Vice-Presidente do Tribunal de origem negará seguimento aos recursos de revista sobrestados na origem, se o acórdão recorrido coincidir com a orientação do Tribunal Superior do Trabalho;

II - o órgão que proferiu o acórdão recorrido, na origem, reexaminará a causa de competência originária ou o recurso anteriormente julgado, na hipótese de o acórdão recorrido contrariar a orientação do Tribunal Superior;

III - os processos suspensos em primeiro e segundo graus de jurisdição retomarão o curso para julgamento e aplicação da tese firmada pelo Tribunal Superior.

§ 1º Para fundamentar a decisão de manutenção do entendimento, o órgão que proferiu o acórdão recorrido demonstrará fundamentadamente a existência de distinção, por se tratar de caso particularizado por hipótese fática distinta ou questão jurídica não examinada, a impor solução jurídica diversa."

No âmbito da Justiça do Trabalho, a primeira indagação que vem é: Pode um ato administrativo do Tribunal Superior do Trabalho atribuir natureza vinculante a suas decisões? Parece-nos que a resposta é claramente negativa.

Num segundo momento, já após a vigência do Novo CPC, surge a seguinte indagação: Pode a lei ordinária atribuir efeito vinculante às decisões dos Tribunais Superiores?

Neste caso, quem nos responde é o Supremo Tribunal Federal, que no julgamento da Representação 946/DF, rel. Min. Xavier de Albuquerque, julgou inconstitucional o §1º, do art. 902, da CLT que previa efeito vinculante aos prejulgados do TST.

O fundamento utilizado foi de que os prejulgados, por se tratarem de tese em abstrato aplicada de forma obrigatória ao caso concreto, se assemelhavam a norma, digo aqui lei, e, por isso, haveria invasão do Judiciário na esfera Legislativa. Ainda segundo o Supremo Tribunal Federal, a única exceção seria os casos previstos na própria Constituição, na época, o poder normativo em dissídio coletivo. Quer nos parecer que a hipótese de que trata o NCPC é a mesma, sendo neste caso as exceções previstas nos artigos 10º, §2º e 103-A, da Constituição Federal de 1988. Cumpre destacar também ser este o entendimento do festejado professor Nelson Nery Júnior.5

Não por outro motivo, tramita no Congresso Nacional a PEC 358/05.

Portanto, em que pese a boa e louvável intenção do legislador ordinário, no tocante a criação das súmulas vinculantes para os Tribunais Superiores, temos que esta padece de inconstitucionalidade de forma.

___________________

1 Revista TST, Brasília, vol. 65, n.º1, out/dez 99.

2 Delgado, Maurício Godinho in Efetividade do Direito e Processo do Trabalho/ Ives Gandra Martins Filho (org.) - Rio de Janeiro: Elsevier, 2010. pag. 315/319.

3 Idem.

4 MENDES, Gilmar Ferreira. As decisões do Supremo Tribunal Federal no controle abstrato de normas (art. 22 a 26). Material da 6ª aula da Disciplina Controle de Constitucionalidade, matéria da aula ministrada no Curso de Especialização Telepresencial e Virtual em Direito Constitucional - UNISUL-IDP-REDE LFG. p.100.

5 Comentários ao Código de Processo Civil/Nelson Nery Júnior, Rosa Maria de Andrade Nery - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015. p. 1836/1841.

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*Ronaldo Ferreira Tolentino é sócio do escritório Ferraz dos Passos Advocacia e Consultoria, advogado Militante no TST e especialista em Direito e Processo do Trabalho.

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