Dizer, o que?
De Getúlio ao "durão" General Médici, muitos representantes da nação brasileira não se esquivaram de dirigir a palavra aos trabalhadores no 1º de maio. Dilma, entretanto, optou por não aparecer em rede nacional para celebrar a data.
sexta-feira, 15 de maio de 2015
Atualizado em 14 de maio de 2015 11:23
A multidão lotando as arquibancadas irrompia em vivas e aplausos como se o Vasco, o dono do estádio, tivesse feito mais um gol. Não era nada disso, não.
Era o Getúlio chegando num carro aberto. Baixinho, precisava ficar em pé, no banco de trás, para ser visto pelo Povo. Cumprida a volta olímpica, agora no palanque:
- Trabalhadores do Brasil!
O estádio, até então o maior do Brasil, espocando alegrias, parecia ir abaixo, tamanhas as emoções que se espraiavam.
Sem outra saída a não ser a renúncia ante as fortes pressões militares, inclusive porque dobrara em 100% o salário mínimo e não podendo estender o mesmo percentual aos quarteis, voltava à Presidência da República agora pelo voto direto:
- Eis-me aqui outra vez ao vosso lado para falar com a familiaridade amiga de outros tempos, para dizer que voltei a fim de defender os interesses mais legítimos do Povo e promover as medidas indispensáveis ao bem estar dos trabalhadores.
Foram os franceses, querendo que ninguém esquecesse o massacre que policiais e capangas de patrões fizeram em Chicago, Illinois, (USA), em 1886, contra trabalhadores que só pediam melhores condições de trabalho e salários justos, quem instituíram o 1º de maio como o Dia do Trabalhador.
Coincidentemente, era o Dia de São José, o operário carpinteiro, data que já estava na liturgia católica como o Dia do Trabalhador. Depois da França, seguiu-se a mesma celebração nos calendários mundo afora.
No Brasil, o Dia do Trabalho foi instituído pelo presidente Artur Bernardes, aquele que diante de tantas pressões governou por quase o mandato inteiro sob o estado de sitio (15/11/22 a 15/11/26).
Juscelino foi outro a brilhar unindo seu sorriso aos dos trabalhadores no 1º de maio no estádio do Vasco da Gama.
Jango, mesmo sem os seus poderes presidenciais, que nem a Dilma hoje, sob um parlamentarismo pra inglês ver, celebrou o Dia do Trabalho com os operários na Usina Siderúrgica de Volta Redonda.
- A reforma eleitoral, disse Jango, impõe-se para formar cada vez mais autêntica a voz do Povo no Parlamento, evitando-se injunções estranhas e inadmissíveis - demagógicas ou financeiras - na formação das assembleias populares.
Até os generais de plantão na mais longa das ditaduras não se esquivaram a dizerem algumas coisas aos trabalhadores no 1º de maio.
O mais durão deles, o General Médici, por exemplo, se disse empenhado pelo fortalecimento do sindicalismo e pelo crescente bem estar da família operária.
Sob Figueiredo, o do prendo e arrebento quem for contra a abertura, foi que a direita dos quarteis aprontou o atentado do Rio Centro, onde havia uma celebração pelo Dia do Trabalho. Só morreu um sargento em cujo colo a bomba explodiu, antecipadamente.
Getúlio profetizou que "um dia um de vocês, trabalhadores, chegará a este lugar onde hoje eu estou" e esse dia chegou com Lula Presidente, ao qual nunca faltou o que dizer dia nenhum, principalmente no Dia do Trabalho.
Dou razão à Dilma.
No Brasil de agora, 61% das famílias estão endividadas. A renda do trabalhador caiu 2,8%, a maior nos últimos 12 anos. A inflação está em 8,3%, o que aumenta os preços dos alimentos e dos remédios e também os lucros dos supermercados e da indústria farmacêutica. Carestia de 3,2 pontos acima dos chamados reajustes salariais.
Não escapam nem as esperanças dos que sonham em ganhar na mega sena. A aposta mínima fica 40% mais cara a partir de hoje. Com isso o governo que não cai com nada vai ter um ganho extra de mais de 1 bilhão de reais. Mais da metade do que precisa para pagar os juros da dívida externa.
Os juros para empréstimos e impostos parcelados estão na maior taxa desde 2008 (Selic em 13,25%) e os lucros dos bancos, como o Santander, indo a 31,9% no trimestre. E o Bradesco lucrando 4 bilhões e 200 milhões de reais líquidos nos últimos 90 dias. Muito mais que os 3 bilhões e 44 milhões do 1º trimestre do ano passado.
E as roubalheiras? Petrobrás, grandes sonegadores pagando propinas milionárias a conselheiros da receita, superfaturamentos em obras, serviços públicos de péssima qualidade, crianças e jovens sem escolas, ensino superior deficiente, zero em ciência, zero em tecnologia, zero em saúde, zero em segurança pública - ah ninguém aguenta mais ouvir essas coisas de todo o dia na nossa indignação.
Tem razão a Dilma, razão só pra ela, é claro, em não aparecer em lugar nenhum, nem mesmo na televisão, para saudar a magna data do trabalhador brasileiro. Se aparecer pessoalmente, vai ser vaia na certa. Se aparecer na televisão, vai ter panelaço nas janelas do país inteiro.
Ah coitada. Vai estar como o velho da canção do Chico, ah de novo o Chico - "e diga agora o que é que eu digo ao Povo / o que é tem de novo pra deixar? / nada, só a caminhada longa pra nenhum lugar (...)".
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*Edson Vidigal é advogado e foi presidente do STJ e do CJF.