O "Dia Internacional da Mãe Terra"
Ante a proximidade do dia 22 de abril, Dia Internacional da Mãe Terra, questiona-se o que a prefeitura de São Paulo estará a reservar, em termos dignos de comemoração?
quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015
Atualizado às 08:04
No geral, os prefeitos dos Municípios brasileiros, não excetuado, lamentavelmente, o de S. Paulo, Fernando Haddad, professor licenciado da USP, parecem não se dar conta do significado do meio ambiente como fundamento para deveres estatais específicos, positivos e negativos, segundo resumido por Antônio Herman de Vasconcelos e Benjamin (CNJ, Cadernos do CEJ, n. 21). Talvez não saibam que se insere no campo desses últimos, em determinadas circunstâncias, o dever de omissão. Dever para que o Poder Público não atue, impondo-se citar, a título de exemplo, não emitir alvará ou licença para obras ou atividades contrárias à integridade do meio ambiente. Contudo, neste início de 2015, Haddad concedeu licença para a construção de alguns 'espigões' no terreno que, com árvores remanescentes da mata atlântica, na grande cidade tão carecedora de verde, tinha tudo para se transformar no popularmente almejado 'Parque da Augusta', ao mesmo em que, também de forma como que inapelável, autorizou a derrubada de árvores de grande diâmetro de largura, para edifícios outros, no bairro de Moema, na esquina entre as Alamedas Jurupis e Jamaris. Compreende-se que vem a se mostrar difícil para alguém sem formação jurídica e aparentemente educado sob regras individualistas pertinentes ao direito de propriedade, hoje ultrapassadas, a tomada de decisões condizentes com o direito fundamental em causa. Já era hora, todavia, de o alcaide se deixar aconselhar nas decisões por aquilo que, nos artigos 5º, inciso XXIII, 182, parágrafo 2º., e 225, 'caput', a Lei Maior veio a dispor, a saber, que a propriedade não pode ser exercida independentemente de sua função social e, paralelamente, que "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defende-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações". O resultado da conduta do Prefeito: deixar de constar, no futuro, como administrador arguto e merecedor de figurar entre os fiéis cumpridores das exigências e obrigações de seu tempo para consigo próprio e para com a sociedade como um todo. Os cidadãos deram conta da falta de respeito do administrador para com as disposições constitucionais e um denso caudal de críticas suas como que desabou sobre Haddad, bem refletidas estas últimas nos registros da imprensa. Mediante as críticas buscaram fazer ver que não teria custado à Administração se valer de indenização aos proprietários como solução adequada nos ainda recentes problemas. À dificuldade passageira para o dispêndio do dinheiro sempre haveria de se opor a permanente e benéfica presença de paisagens públicas naturais preservadas, esse um pensamento aparentemente ignorado pelo administrador. Por isso, as perspectivas como que deixaram de ser otimistas em relação às decisões futuras, no referente à delicada matéria, na Capital. E isto também talvez em relação às decisões passadas, como a tomada no movimento anterior aparentemente vencido pelos moradores do bairro do Itaim, entre os quais despontou o enorme esforço aplicado pela atriz Eva Vilma, em favor da preservação do estado de determinada área.
Essas considerações se dão ante a proximidade do dia 22 de abril, quando, segundo deliberado pela ONU, se impõe comemoração, internacionalmente, do 'Dia da Mãe Terra', de cuja saúde depende a própria vida de todos os seus habitantes, das gerações presentes e futuras. O que a Prefeitura de S. Paulo estará a reservar, em termos dignos de comemoração? A volta do controle de emissão de gases nocivos dos veículos a motor? Uma concreta atuação pelo desenvolvimento sustentável no Município? O efetivo e honesto exercício do poder de polícia, de modo a dar remédio e a estancar invasões e loteamentos em áreas de preservação ou proteção ambiental? A introdução de uma política contínua de educação da população para não lançar lixo às ruas, calçadas e cursos d'água, bem como para respeito à 'Lei do Silêncio'? O combate que seja possível ao lançamento de efluentes domésticos em córregos e rios sem prévio tratamento e também do despejo neles de resíduos de empresas?
Um prefeito, por força das disposições legais, para fiel cumprimento da missão de governar uma cidade, tem que se envolver com essas e outras questões pertinentes ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Do mesmo modo, cabe ao Poder Judiciário, no que tange à proteção do meio ambiente, quando chamado a essa tarefa pelas pessoas interessadas, pelas associações ou pelo Ministério Público, o exame das respostas ou não do administrador a tais indagações, para o bem da mãe Terra. Como disse Helena Allegretti, então no Ministério do Meio Ambiente, a conciliação de desenvolvimento com preservação da natureza constitui um desafio. Na verdade, desenvolvimento não pode significar degradação dos recursos naturais e proteção do meio ambiente não pode ser o mesmo que manter a população na pobreza. O Poder Judiciário, nesse quadro, não deve ser apenas um espectador, mas sim tem de colaborar para o encontro de soluções viáveis para problemas de tal grandeza. Como também se manifestou o Juiz Álvaro Luiz Mirra, o Judiciário teria passado a ser o canal de que pode se valer a sociedade para o controle da Administração na área ambiental, dando importância a se poder obter pela ação civil pública até mesmo a supressão das omissões estatais lesivas ao meio ambiente.
Bastante ter se situado um complexo de normas de proteção do meio ambiente na Lei Maior do Estado brasileiro para se entender a seriedade máxima com que devem ser tratados os assuntos hoje ligados à própria sobrevivência da humanidade. Ao fazê-lo, o Brasil, e as outras nações que também assim procederam, como também algumas poucas mais que ainda não lograram tornar constitucionais as regras de proteção do meio ambiente, buscam cumprir as recomendações da Declaração de Estocolmo sobre o Meio Ambiente Humano, de 1972, em que se admitiu a exploração da natureza e se aceitou o desenvolvimento, mas não qualquer desenvolvimento, e sim o desenvolvimento sustentável. É o que temos todos de gravar e respeitar, de forma muito especial os administradores.
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*José Geraldo de Jacobina Rabello é desembargador aposentado do TJ/SP.