A regularização ambiental de imóveis rurais de acordo com o Novo Código Florestal
As inovações do Novo Código Florestal são de grande relevância para o agronegócio, pois conciliam o interesse econômico dos produtores rurais e a proteção do meio ambiente.
sexta-feira, 28 de novembro de 2014
Atualizado em 27 de novembro de 2014 15:26
As leis 12.651/12 e 12.727/12, que dispõem sobre a proteção da vegetação nativa, revogando o código florestal (lei 4.771/65), são resultado de 12 anos de exaustivos e aclamados debates em todo o Brasil. Em que pesem os argumentos favoráveis e contrários com relação à elaboração legislativa do novo marco legal, o "Novo Código Florestal Brasileiro"1 está em um momento de consolidação na interpretação e aplicação de seus dispositivos legais, cujo desfecho é essencial para o agronegócio brasileiro.
A novel legislação permite a continuidade da atividade agropecuária e o desenvolvimento sustentável brasileiro, ao entender a convivência necessária entre o meio ambiente e a produção rural, além de dar um tratamento diferenciado aos agricultores familiares. Ademais, o novo código florestal prevê instrumentos importantíssimos para as políticas agrária e ambiental do Brasil. Protelar a aplicação imediata da desse novo marco legal significa desconsiderar seu processo democrático de elaboração legislativa, bem como as profundas mudanças ocorridas no meio rural brasileiro durante as últimas décadas.
Em linhas gerais, o Novo Código Florestal estabelece, dentre outras, exigências diferenciadas para a preservação e recomposição das áreas de florestas e matas nativas de acordo com o módulo fiscal de cada imóvel rural. Além disso, a legislação florestal ainda inovou ao criar o Cadastro Ambiental Rural (CAR), o Programa de Regularização Ambiental (PRA), o Programa de Apoio e Incentivo à Preservação do Meio Ambiente, além de prever outras normas que beneficiam o produtor rural e o meio ambiente.
Não obstante a relevância da Área de Preservação Permanente (APP)2, em especial em lagos e lagoas naturais, nascentes e olhos d'água, encostas e topos de morro, iremos tratar, especificamente, sobre as inovações e benefícios da regularização ambiental do imóvel rural quando feita através da compensação da área de Reserva Legal florestal em outro imóvel rural, bem como sobre o CAR.
I - REGULARIZAÇÃO DA RESERVA LEGAL
A princípio, os proprietários e posseiros de imóveis rurais cuja área de Reserva Lega florestal seja inferior ao previsto no Código Florestal, devem providenciar sua regularização ambiental no órgão ambiental competente. Para essa regularização, a lei prevê três mecanismos para cumprimento, a saber:
(i) a recomposição;
(ii) a regeneração; ou
(iii) a compensação da área de Reserva Legal.
Primeiramente, cabe ressaltar que a área de Reserva Legal Florestal3 deverá ser registrada no órgão ambiental competente por meio de inscrição do imóvel rural no CAR. Essa inscrição, por sua vez, desobriga a averbação do percentual mínimo da área de Reserva Legal Florestal no Registro de Imóveis.
Ao optar pela compensação de sua área de Reserva Legal Florestal em imóvel rural alheio, o produtor rural agrega valor econômico ao seu imóvel na medida em que pode utilizar todo o potencial agrossilvipastoril de seu imóvel, na medida em que não precisa se preocupar com os altos custos para manutenção da vegetação. Ademais, a compensação da Reserva Legal Florestal desobriga o produtor rural a promover a recomposição durante anos. Em outras palavras, o "déficit" de Reserva Legal em um determinado imóvel pode ser suprido através da atribuição do regime de especial proteção de área de Reserva Legal florestal excedente em outro imóvel. Dessa forma, o produtor rural consegue conciliar seus interesses econômicos com a preservação do meio ambiente.
Além disso, há inegável ganho ambiental decorrente dessa operação, uma vez que áreas utilizadas para fins compensatórios asseguram a prestação e manutenção dos serviços ambientais essenciais, na medida em que estimula a utilização de mecanismos que valorizam as florestas e outras formas de vegetação ainda existentes em imóveis rurais, além de propiciar a formação de áreas contínuas e de maior extensão submetidas ao regime de especial proteção ambiental, o que pode contribuir para os objetivos de conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e da biodiversidade.
II - CADASTRO AMBIENTAL RURAL
Considerado como um dos grandes avanços da nova legislação florestal, o CAR é um registro público eletrônico, de âmbito nacional, obrigatório para todos os imóveis rurais. O CAR ainda é responsável por impor à União, Estados e ao Distrito Federal, a implantação de Programas de Regularização Ambiental, com objetivo de adequação dos imóveis rurais aos termos da legislação ambiental vigente.
Ao reunir as principais informações de cada imóvel rural em seu aspecto ambiental, o CAR é um instrumento que poderá auxiliar as futuras políticas públicas, seja no âmbito da agricultura, seja para fins de conservação ambiental, dentre outras, uma vez que todas as propriedades rurais, sejam elas grandes, médias ou pequenas, são obrigadas a estarem inscritas nesse cadastro em até um ano após a sua implementação. Além disso, o CAR é um sistema de informação capaz de auxiliar na detecção de problemas ambientais, buscar alternativas para sua solução, avaliar e monitorar as medidas adotadas pelos órgãos ambientais e possibilitar o controle social na medida em que a sociedade tenha acesso a esse conjunto de dados e informações.
Não obstante as vantagens ambientais decorrentes da implementação do CAR, ele irá impactar financeiramente o agronegócio, porque após 2017, os agentes financeiros só concederão crédito rural para aqueles que estiverem inscritos no CAR.
Por fim, merece destaque o papel do CAR na desburocratização do cumprimento das obrigações ambientais. Vale dizer, o CAR irá contribuir para tornar mais simples e célere o processo de regularização ambiental quando comparada à sistemática então adotada pelo Código Florestal revogado. Pelo CAR, estamos dando mais um passo para erradicar a "cultura do balcão" nos órgãos administrativos, promovendo maior segurança aos produtores rurais, além de concentrar nos próprios órgãos ambientais as informações relativas às áreas de Reserva Legal florestal do imóvel rural, evitando eventuais dificuldades fundiárias e registrais quando do cumprimento das obrigações ambientais.
III - CONSIDERAÇÕES FINAIS
As inovações apresentadas pelo novo Código Florestal demonstram ser de grande relevância para o agronegócio, pois são capazes de conciliar o interesse econômico dos produtores rurais e a proteção do meio ambiente. Nesse contexto, as formas de regularização ambiental, em especial a compensação de Reserva Legal Florestal, e o CAR, demonstram ser formas seguras e eficientes para atender ao disposto na legislação ambiental. Essas medidas demonstram ser capazes de desburocratizar e simplificar o processo de regularização ambiental dos imóveis rurais. Além disso, os instrumentos e regras previstas no novo Código Florestal revelam ser uma maneira ágil e eficiente para delimitarmos as Áreas de Preservação Permanente, as áreas de Reserva Legal Florestal e os remanescentes de vegetação nativa localizados no interior de todos os imóveis rurais, em especial nas propriedades privadas. Este novo marco legal, além de incentivar o cumprimento da legislação ambiental, está contribuindo para uma melhor compreensão de todo o patrimônio florestal do país.
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1 Nomenclatura consagrada pela agora revogada lei n.º 4.771/1965.
2 Área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com fundação ambiental e ecológica.
3 Área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, com função de assegurar o uso econômico sustentável dos recursos naturais, proteger a fauna e a flora e contribuir na conservação da biodiversidade.
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*André Marchesin é sócio do escritório Furlanetto Bertogna - Sociedade de Advogados. Formado pela Pontifícia Universidade Católica (PUC/SP), pós-graduado em Direito Ambiental e Gestão Estratégica da Sustentabilidade pela Pontifícia Universidade Católica (PUC COGEAE/SP) e em Direito Ambiental: Novas Tendências, pela Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas-FGV. Cursou a Extensão Universitária em Direito Ambiental pela Escola Paulista de Magistratura-EPM. Atua nas áreas de Direito Ambiental, Direito Agrário e Direito Registral.