Métodos adequados de solução de controvérsias - mediação empresarial
Vislumbram-se iniciativas profissionais e acadêmicas promissoras que pretendem o maior diálogo entre as ciências que regem a vida empresarial, em especial na promoção de métodos adequados de resolução de conflitos.
domingo, 1 de junho de 2014
Atualizado em 29 de maio de 2014 15:23
Um tema sempre recorrente no dia a dia empresarial, tanto por sua complexidade, como por sua importância, em termos negociais e jurídicos, o conflito societário desperta indagações que há muito estão sem uma resposta definitiva entre os operadores do Direito.
Só para se ter uma ideia, por exemplo, questões como a justa causa caracterizadora da exclusão extrajudicial de sócios em sociedade limitada, ou a apuração dos haveres do sócio expulso judicialmente de sociedades contratuais são completamente indefinidas no nosso ordenamento legal, o que acaba por gerar uma profunda insegurança jurídica e negocial.
Em linhas gerais, o que se pode perceber é que as causas que levam aos conflitos societários nunca foram estudados sob o enfoque multifacetado e interdisciplinar da psicologia, antropologia, sociologia, contabilidade e economia, a fim de buscar as verdadeiras razões dos conflitos, com objetivo de, de fato, resolvê-los.
Nossos tribunais, apenas e tão somente, contentam-se em fundamentar suas decisões na quebra da affectio societatis, algo que, segundo alguns renomados juristas, pode inclusive não estar contemplado na Teoria da Empresa, considerando o hibridismo das sociedades limitadas e a relevância do papel do capital na sua atividade.
Quer dizer: as atividades negociais giram em constante mudança e evolução e nem sempre o Direito tem acompanhado a contento o dinamismo esperado. Neste sentido, sabe-se que as relações empresariais se tornam cada vez mais complexas e abrangentes, com a internalização de inúmeros interesses; a multiplicação da velocidade das transações econômicas; bem como o aumento da quantidade e volume de operações societárias, que adotam estruturas cada vez mais modernas e criativas.
Deste modo, os conflitos decorrentes da empresariedade também alcançam patamar de maior complexidade. Felizmente, alguns métodos alternativos (ou melhor, adequados) de solução de controvérsias, embora ainda tímidos, passam a ganhar cada vez maior relevância.
É nesse contexto que se insere a mediação empresarial, método de solução de controvérsias caracterizado pela presença de um terceiro imparcial, que tem como objetivo o fortalecimento da relação entre as partes envolvidas no conflito. O intuito não é, necessariamente, chegar rápida e diretamente a um acordo, mas sim promover o intercâmbio de interesses entre as partes, dando a oportunidade para que elas próprias alcancem a composição.
A mediação é um método tão efetivo que é extremamente difundido em países com maior tradição empresarial, como os Estados Unidos e a Inglaterra. Entretanto, pouco se ouve falar de mediação aqui no Brasil, muito menos da mediação como forma de resolução de conflitos empresariais. Por que será que isso se dá e não há um desenvolvimento efetivo da mediação, no Brasil?
Para começar, não há arcabouço legislativo satisfatório. A resolução 125/10, do CNJ, que trata da instituição da chamada Política Judiciária Nacional de tratamento dos conflitos de interesses, por meio da qual os órgãos judiciários devem oferecer meios consensuais de solução de controvérsias, tais como a conciliação e a mediação é extremamente deficiente. Os previstos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania, nos quais ocorrem as sessões de mediação, são instalados junto às varas cíveis, fazendária, previdenciária, de família, ou nos Juizados Especiais. E aqui começa a preocupação.
Não enfrentando a questão de que muitos dos conflitos empresariais não se encaixam em nenhuma das áreas de atuação dos Centros, a capacitação solicitada pelos mediadores, segundo a Resolução do CNJ, independe de sua área de atuação. Ou seja, do mediador que atuará em conflitos empresariais se exige capacitação igual a daquele que atuará em conflitos familiares.
Isso apenas se agrava quando vemos o conteúdo dos cursos de capacitação. Estes são normalmente ministrados por advogados, magistrados, ou por psicólogos. Trata-se, no máximo, de uma forma adequada para preparar mediadores para determinados tipos de conflitos, como familiares. E para os mediadores que atuarão em conflitos empresariais? Para compreender os interesses em jogo, deve-se saber como um empresário pensa. Onde estão a capacitação em contabilidade, em administração de empresas, em economia, na dinâmica do mercado de ações?
Essas perguntas, que ficam sem resposta empírica satisfatória, justificam também o porquê de os bacharéis em direito não estarem preparados para atuar em mediação de conflitos empresariais, sejam como consultores da parte envolvida no conflito, sejam como mediadores.
Se as capacitações são deficientes, destino diverso não é vivenciado nos cursos de bacharelado em Direito. Em primeiro lugar, tendem a ser legalistas, com pouco ou nenhum diálogo com ciências essenciais para compreensão do mundo empresarial, como Economia, Administração de Empresas e Contabilidade. Além disso, ficam insertos em uma cultura de litígios, que se propaga implícita ou explicitamente no universo jurídico brasileiro. Sem contar que há uma falta de informação dos alunos sobre áreas de atuação que vão além das clássicas carreiras jurídicas e as "inovações", a exemplo dos métodos adequados de solução de controvérsias, que exigem uma compreensão dos interesses envolvidos muito maior do que o domínio de um arcabouço jurídico-teórico, e existem há muito tempo.
O que se tem, assim, é uma situação muito preocupante: uma política judiciária ineficiente que deixa para a inciativa privada a responsabilidade de dar uma resposta satisfatória para a mediação empresarial. Iniciativa privada, esta, que tem como ponto de partida uma formação acadêmica insuficiente. O método adequado mostra-se, curiosamente (ou não), inadequado.
Felizmente, vislumbram-se iniciativas profissionais e acadêmicas promissoras que pretendem o maior diálogo entre as ciências que regem a vida empresarial, em especial na promoção de métodos adequados de resolução de conflitos. Afinal, resta mais do que evidente que só o Direito não basta.
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* Armando Luiz Rovai e Pedro Alves Lavacchini Ramunno são advogados.