A educação no Brasil: sala de aula e a Copa do Mundo
Criar leis para resguardar o período da Copa, alterar o calendário de nossas escolas, alterar períodos de férias, suspender aulas, podem ser ações desnecessárias a um país que tem tantos problemas em relação à educação.
terça-feira, 13 de maio de 2014
Atualizado em 12 de maio de 2014 13:48
A escola há muito tempo vem sendo encarada como o local de ensino e aprendizado. Essa ideia fez com que até meados da década de 70, no Brasil, espaço da sala de aula era definido por educadores como sendo um microcosmos onde eram apresentados aos alunos conhecimentos já institucionalizados pela sociedade e que seriam perpetuados pela educação ocidental.
Ao final dos anos 70 o Brasil, já na era da comunicação, começa a perceber outras situações importantes para a vida, mas na verdade é na década de 80 que o brasileiro começa a conviver com outras situações, que o colocam em contato direto com o mundo. O processo de globalização traz à nossa realidade informações e situações, até então distantes, que nos integraram aos mecanismos de outros países e de outras culturas de forma mais direta. Esse processo foi acompanhado por um avanço tecnológico que nos trouxe um novo elemento: a informática. A informação a partir daí começa de maneira ampla e veloz. Logo em seguida entramos em contato com a internet.
A Educação transforma-se em alguns aspectos e prepara-se para essas inovações. A escola tem que adaptar-se a essas novidades e às características da vida desses nossos dias.
Vários temas e eventos passam a ocupar os espaços da educação, nas temáticas desenvolvidas, nas preferências dos alunos, nos assuntos relacionados a trabalhos e atividades, na vida da escola. Mas é preciso que essa profusão de temas e eventos sejam inseridos na educação das crianças e adolescentes de maneira cuidadosa e passem a fazer parte dessa formação que se prevê nos diferentes níveis da educação do país.
Nesse contexto é que devemos entender a inclusão da Copa do Mundo como sendo um dos temas a serem desenvolvidos nas nossas escolas, pelos nossos professores e alunos, mas não o único, com exclusividade. Não se pode perder o conteúdo de ensinamento programado e que irá ampliar o horizonte estudantil.
Sem dúvida que um evento como a Copa do Mundo mereça certo destaque entre nossas crianças e jovens, até como um tema integrador de todos à sociedade, ao patriotismo e à identidade nacional, mas criar leis para resguardar o período da Copa, alterar o calendário de nossas escolas, alterar períodos de férias, suspender aulas, podem ser ações desnecessárias a um país que tem tantos problemas em relação à educação. Embora a realização da Copa do Mundo no país do futebol, 64 anos após a Copa de 1950, no Rio de Janeiro, é um evento que põe em destaque o Brasil para o mundo.
O Brasil, país do futebol, ao receber as demais delegações para esse evento espalhado em várias capitais, realizado em arenas construídas ou reformadas para o campeonato, levará sua imagem para quase todo o mundo. Ao sediar a Copa do Mundo de 2014, abre suas portas para o mundo e, de certa forma, abre-se para toda sorte de oportunidades: campanhas publicitárias; contratação de mão de obra específica para os diferentes roteiros e serviços turísticos; investimentos de inúmeras empresas no nosso país; divulgação de nossa cultura. Enfim, uma oportunidade que congrega diversificadas possibilidades de desenvolvimento.
Esses aspectos, certamente, orientaram algumas decisões governamentais para o apoio do evento, tal como a criação da lei geral da Copa (12.663/12), que em seu artigo 64 trata da alteração dos calendários escolares, segundo as datas da realização do evento. Esse posicionamento tem gerado divergências nas opiniões de diversos segmentos da nossa sociedade, inclusive de profissionais ligados a escolas de ensino fundamental, médio ou superior, que embasados nas necessidades outras do país veem nessas decisões do governo certa arbitrariedade que, ao valorizar o evento, sua realização e seu calendário, coloca em plano secundário outras urgências e prioridades.
Um dos princípios da educação nacional, de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases de 1996, é conferir a garantia de padrão de qualidade. Ora, ensino de qualidade é aquele que proporciona ao aluno as condições básicas e necessárias para que possa atingir as finalidades delineadas nas práticas pedagógicas apropriadas, levando-se em consideração as especificidades de cada região do país. Exige-se, no entanto, um engajamento não só do estudante, destinatário final do produto educação, mas também de novas técnicas pedagógicas que possam estimulá-lo a frequentar e participar ativamente do processo educativo.
O que se vê, no entanto, é um rebaixamento da qualidade de ensino em razão de inúmeros fatores que vão escanteando a educação para um segundo plano. De nada adianta abrir novas escolas com apelos democráticos insculpidos nos programas de políticas públicas se a educação fica cada vez mais desfalcada de qualidade. Não se trata de um projeto que se coloca em prática para cumprir metas e sim para colher resultados educacionais que sejam satisfatórios para o próprio país.
E a Copa do Mundo pede passagem, com sua comissão de frente, alegorias e samba no pé. Antes o ano se iniciava após o carnaval. Agora, outro marco foi estabelecido e fincou o período após o campeonato e já se diz à boca pequena que sofrerá outra interrupção no mês de outubro, período eleitoral. Se as propostas da educação conseguirem conciliar as oportunidades que se apresentam para conhecer as culturas dos povos participantes do evento esportivo e, posteriormente, abrir debates acadêmicos para discutir a responsabilidade do voto como direito inalienável da cidadania e o engajamento de cada um no processo, será um grande avanço. Aí, tudo vale a pena, mesmo com a carga de aula pequena.
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* Eudes Quintino de Oliveira Júnior é promotor de justiça aposentado/SP, mestre em Direito Público, pós-doutorado em Ciências da Saúde, advogado e reitor da Unorp/São José do Rio Preto.
* José Luiz Falotico Correa é professor universitário, licenciado e bacharel em Letras e Pedagogia, mestrado e doutorado em Educação, pró-reitor acadêmico da Unorp/São José do Rio Preto.