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O Refis e a crise dos processos tributários no Brasil

Priscila Faricelli de Mendonça

É preciso que as autoridades legislativas se distanciem do preconceito que envolve a possibilidade de o fisco dialogar com o contribuinte.

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Atualizado em 20 de dezembro de 2013 13:45

A reabertura do prazo para pagamento de débitos fiscais federais com os atraentes benefícios da lei 11.941/09, nos termos da lei 12.865/13, nos remete a uma ingrata realidade e sugere reflexão sobre os meios postos à disposição dos contribuintes para discussão com o fisco acerca de controvérsias tributárias.

Isso porque muitos contribuintes que litigam (judicial ou administrativamente) contra o fisco optam por liquidar a dívida com os descontos da anistia, a despeito de muitas vezes acreditarem ter bons argumentos para desafiar o crédito fiscal que lhes foi imputado. Tal decisão leva em consideração, sobretudo, vantagens financeiras a comparar-se os custos da manutenção dos processos até decisão final vis a vis os descontos concedidos pela legislação.

Por certo os recursos poupados com o pagamento do débito com desconto podem ser imediatamente percebidos e destinados a aprimorar os investimentos no negócio, gerando mais lucratividade e compensando, por vezes, o desembolso quanto a valores que poderiam, ao final da discussão, ser poupados.

De fato, as estatísticas que envolvem as disputas judiciais entre fisco e contribuinte não são incentivadoras da manutenção da discussão.

Estudo do CNJ sobre os cem maiores litigantes nos tribunais brasileiros mostra que os seis maiores, presentes em 53,73% dos processos distribuídos, são entes públicos, a saber: Instituto Nacional do Seguro Social, Caixa Econômica Federal, Fazenda Nacional/União, Banco do Brasil e Estado do Rio Grande do Sul.

Especificamente sobre processos fiscais, estudo do IPEA publicado em Brasília em 2011 sobre o Custo Unitário do Processo de Execução Fiscal na JF apontou que o custo unitário, considerando tão somente a máquina judiciária (ou seja, excluindo-se a remuneração dos advogados públicos) chega a R$ 4.368.

No entanto, a despeito do elevado custo unitário, a efetividade da solução através das ações executivas fiscais não é satisfatória, como conclui o IPEA/CNJ. Apenas três quintos dos processos de execução fiscal vencem a etapa de citação e, dos 2,6% de casos em que se chega a leilão para adjudicação de bens, somente em 0,2% dos casos há efetiva satisfação do crédito.

Afora a morosidade e baixa efetividade do processo judicial tributário, os custos inerentes à manutenção das discussões judiciais são elevados sob perspectiva do contribuinte, pois envolvem não só honorários de advogados, despesas processuais e custos com manutenção de garantia, mas também despesas decorrentes da discussão para adoção de providências para renovação de certidões negativas, por exemplo. E tais custos prolongam-se por anos a fio, pois o tempo de tramitação das ações judiciais tributárias não raro ultrapassa uma década.

No cenário atual, é muitas vezes financeiramente é atrativo aproveitar os descontos concedidos pelos fiscos em programas de anistia fiscal, muito embora o contribuinte tenha convicção de que o crédito tributário objeto de controvérsia não é devido. É necessário, portanto, repensar o modelo.

O CNJ (no estudo "A execução fiscal no Brasil e o impacto no Judiciário") traz sugestão para que a discussão em torno da arbitragem e conciliação com relação a questões tributárias seja "incluída na pauta de debates sobre a matéria". A conclusão decorre da premissa do estudo de que "o Poder Judiciário Nacional não está aparelhado para lidar com as demandas tributárias".

Para o CNJ, a arbitragem entre fisco e contribuinte é aspecto a ser avaliado como "medida para desobstruir o Judiciário e para dar maior agilidade às ações", o que tem apoio de 71,5% dos entrevistados em pesquisa de campo realizada.

Chegado o momento, assim, de remodelar os meios postos à disposição dos fiscos e contribuintes para solução de controvérsias tributárias. Meios alternativos para solução de controvérsias, notadamente mediação, arbitragem e transação, devem ser seriamente analisados para que o sistema seja mais eficiente.

Vale mencionar que há atualmente dois PLs (5.082/09 e PLC 469/09) tramitando no Congresso a tratar da transação tributária.

É preciso que as autoridades legislativas se distanciem do preconceito que envolve a possibilidade de o fisco dialogar com o contribuinte (realidade, ressalte-se, presente na maior parte dos países) para que o sistema seja mais justo, eficiente e atrativo, sob pena de manutenção de uma realidade que não é benéfica ao Estado nem tampouco aos administrados.

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* Priscila Faricelli de Mendonça é advogada do escritório Trench, Rossi e Watanabe Advogados.




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