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Processo eletrônico e a virtualização da lentidão processual

O processo digital é uma realidade que foi criada para atender dois anseios dos jurisdicionados: facilitar o exercício do direito de ação e dar maior celeridade aos processos judiciais.

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Atualizado em 3 de dezembro de 2013 16:11

Nas últimas décadas, o legislador tem empreendido uma verdadeira cruzada na tentativa de eliminar a lentidão processual, causada, em um primeiro momento, pelo aumento da litigiosidade e pela garantia plena de acesso ao Poder Judiciário.

Medidas - algumas importadas de sistemas estrangeiros - foram adotadas para agilizar a tutela jurisdicional, como a regulamentação da tutela antecipada, a reforma da sistemática de alguns recursos e a criação de mecanismos para impedir a análise do mérito de apelos para as cortes superiores, como o famigerado requisito da repercussão geral, acrescentado no ano de 2006.

Passados alguns anos, os resultados obtidos inicialmente não mais se mostram visíveis, sendo certo que as Cortes Estaduais e Federais permanecem atulhadas em processos, que se arrastam por anos sem um desfecho, inclusive no âmbito do STJ e do STF.

Mais recentemente, os Tribunais passaram a adotar o processo eletrônico, criado pela lei 11.419/06, proclamando-o como verdadeira revolução rumo à celeridade processual.

Sem prejuízo das inegáveis qualidades do novo sistema implementado, inclusive com a diminuição dos custos extrajudiciais aos jurisdicionados (as custas processuais permanecem elevadas e bastante proibitivas, especialmente em São Paulo e no Rio de Janeiro), a virtualização dos processos não é uma solução à morosidade processual, ao menos, tal como atualmente instalada.

Isso porque, o principal tendão de Aquiles do sistema informatizado reside inexistência de automação. Ou seja, a digitalização dos processos foi desenvolvida de tal forma que o sistema depende - e muito - da prática de atos de servidores que, manualmente, juntam petições e outros documentos aos autos, remetem os autos à conclusão, encaminham decisões e despachos à Imprensa Oficial etc.

Em outras palavras, a despeito de facilitar o trabalho dos advogados e o acompanhamento dos processos pelos jurisdicionados, a virtualização sofre das mesmas dificuldades enfrentadas no âmbito das contendas em papel, além de inúmeras outras inerentes ao próprio mundo digital, como, por exemplo, aquelas derivadas da impossibilidade de se acessar o sistema por problemas no servidor.

Exatamente por isso que, em algumas varas espalhadas pelo Brasil, os processos digitais já começam a caminhar na mesma toada das ações tradicionais; uma providência simples acaba por tardar alguns meses para ser realizada pelo serventuário.

Se a falta de servidores e de magistrados suficientes para atender ao incremento da judicialização dos conflitos sociais é o maior entrave para acelerar a tramitação dos processos, por que, então, não se pensou em um sistema com o mínimo de autonomia para praticar automaticamente atos mais simples, como a juntada de documentos e a disponibilização dos autos aos magistrados?

Uma resposta plausível a essa pergunta se justifica ainda mais em se considerando que os primeiros processos inteiramente digitalizados surgiram no ano de 2007, com a inauguração do Foro Regional da Nossa Senhora do Ó, localizado na cidade de São Paulo e concebido como incubadora desse novo modelo.

Exatamente por ser um espaço experimental, lá surgiram as primeiras intempéries do sistema digital, tendo a excelentíssima juíza Teresa Cristina Antunes, em seu discurso de posse como diretora daquele Foro, no ano de 2011, afirmado que "não se fez uma análise, estudo da área territorial de abrangência e sua consequente população para estimar o número de processos que receberia e daí calcular quantos funcionários, juízes, promotores e defensores públicos seriam necessários". Naquela ocasião, a OAB-SP apurou estarem pendentes de digitalização e juntada mais de dezoito mil petições apenas naquele Foro Regional.

Conquanto essas dificuldades fossem do conhecimento de todos desde 2011, poucas adaptações foram feitas à digitalização dos processos, mantendo-se, todavia, toda a dependência do sistema à prática manual de atos que poderiam ser automatizados.

O reflexo dessa dependência humana se reflete no próprio orçamento dos tribunais, que poderia ser reduzido caso o sistema digital pudesse, com certa autonomia, praticar atos mais simples, deixando, evidentemente, as questões de caráter decisório ao juiz. Nesse cenário, o número de funcionários necessários para movimentar um processo reduzir-se-ia muito, autorizando os Tribunais a alocar recursos (financeiros e de mão-de-obra) onde realmente necessários.

Pontofinalizando, o processo digital é uma realidade que foi criada para atender dois anseios dos jurisdicionados: facilitar o exercício do direito de ação e dar maior celeridade aos processos judiciais. Conquanto o primeiro objetivo já tenha sido plenamente atingido, a concretização da segunda meta depende de adequações de automação ou de maiores investimentos na infraestrutura humana, sob pena de sermos o primeiro país a digitalizar a lentidão processual. Ademais, corremos o risco de desperdiçar a grande chance de eliminar (ou, ao menos, minimizar) a insegurança jurídica causada pela morosidade judiciária.

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* Diego Santiago y Caldo é advogado do Pacífico, Advogados Associados.








    

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