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Treze dados que vão te desanimar

Marco Antonio Leonel Caetano

O matemático apresenta 13 dados que explicam o motivo pelo qual "o Brasil não arranca para o futuro".

domingo, 10 de novembro de 2013

Atualizado em 8 de novembro de 2013 16:57

"... Não é possível que ocorra aquele tipo de política que ocorreu na década de 20 e que se caracteriza pela desvalorização competitiva... Nós não brincaremos com a inflação, nós seremos um governo que terá, portanto, metas inflacionárias, da mesma forma que teve o governo Lula...". (Presidente Dilma Rousseff, 2 de novembro de 2010).

Não se pode afirmar que a presidente Dilma e seu governo não estão fazendo nada para controlar a alta do dólar. Desde 2010, os discursos da presidente e do ministro Mantega têm sido alinhados na mesma direção. Mas também não se pode afirmar que ambos têm uma óptica correta sobre a forma de atuar contra essa alta do câmbio. É correto que a alta tem o fator especulativo, muitas vezes impulsionado pelos próprios países que têm a potência e a hegemonia da moeda americana. Mas não é só isso. Enxergar a alta do dólar apenas como movimento especulativo é tentar criar uma neblina sobre os erros do governo. Treze dados importantes e oficiais são aqui expostos, adquiridos do Banco Central, do IPEADATA e do IBGE. O objetivo é entender por que o Brasil não arranca para o futuro, sob o ponto de vista da economia.

1 - O câmbio

Sob o olhar crítico desse dado, vemos que a presidente Dilma tinha razão sobre a preocupação cambial. Desde 2010, o dólar saiu do patamar de R$ 1,70 para o de R$ 2,40. Essa alta de 41% em pouco mais de três anos não foi sempre assim. Pode-se observar que ocorreu certo controle até junho de 2011 e então a disparada do câmbio voltou forte.

2 - A inflação

Com a alta do dólar, a luz laranja ascendeu no painel de controle do governo. Afinal, a presidente tinha dito em seu discurso e em diversas entrevistas que a meta do governo era crescimento sem inflação. Mas como se pode observar, a inflação medida mensalmente, referente a 12 meses passados, começou a aumentar em janeiro de 2011, ultrapassando os 7% anuais. O governo se mostrou preocupado, mas em vez de segurar a inflação de imediato, se sentiu aliviado por dois motivos relatados a seguir.

3 - O desemprego

A taxa de desemprego em queda aliviou a pressão no governo, pois em seu entendimento as pessoas estavam conseguindo ser atendidas em postos de trabalho. Sua referência era sempre a Europa, que tinha, e tem até hoje, as maiores taxas de desemprego do mundo. Sempre com o discurso voltado para a comparação com a Europa, o grande alarde do governo era que a política econômica estava no caminho correto, pois as pessoas estavam conseguindo empregos, o que era verdade. De janeiro a dezembro de 2010, a taxa de desemprego caiu de 7,5% para 5,5%, um grande triunfo da política do governo. E ainda continuou em queda, entre janeiro de 2011 e dezembro, indo de 6,5% para 4,5%.

4 - Rendimento médio assalariado

Outro dado que deixou o governo Dilma ainda mais confiante era o rendimento do assalariado. Estava em alta em 2010, caiu no primeiro semestre de 2011, mas se recuperou. Então, se as pessoas têm emprego suficiente e tem salário compatível, a economia está saudável. Olhando o dado do desemprego e do rendimento parece que sim. Mas muitos fatores ficaram escondidos, ou pelo menos, não percebidos pelo governo. E assim, para aumentar o plano de navegação no rumo do crescimento, erros começaram a acontecer. O governo começou a errar e continua errando até hoje em sua expansão do crédito. No pensamento do governo, se as pessoas estão empregadas e o rendimento está se mantendo, nada melhor do que oferecer a chance para essas pessoas gastarem.

5 - O crédito

De 14% do PIB, o governo brasileiro passou a fornecer crédito tanto para pessoas físicas como para empresas em grandes proporções. No final de 2011, o crédito já era 16% do PIB. No final de 2012, chegamos a 10% do PIB, no total geral segundo os dados do Banco Central. Qual o problema? Aparentemente nenhum, se nossa população tivesse educação de qualidade, a fim de ter uma disciplina nos gastos. O governo incentivou os gastos e a população mais carente aceitou esse desafio. Nada melhor do que equipar sua casa com as melhorias do mercado, mas a que ponto? Então as prestações começaram a chegar.

6 - Comprometimento familiar

Assim como abelha gosta de mel, a população mais carente resolveu montar a colmeia. É salutar a ideia de oferecer a chance de famílias de baixa renda terem ascensão social. É maravilhoso poder ver o rosto de felicidade das pessoas comprando eletrodomésticos nunca sonhados. Mas assim como nossa irmã Portugal, que se deleitou com o "farto" e "vasto" dinheiro da região do Euro, ninguém oferece nada de graça. Como Portugal caiu em desgraça por gastar o que não tinha, o governo brasileiro tinha a obrigação de frear os gastos para preservar as famílias mais pobres. O exemplo estava ali, no noticiário diário. Mas o governo não o fez, pelo contrário, apoiou o gasto e o crédito fácil.

A conclusão é que a dívida familiar no Brasil disparou. Se em 2010, 19% das famílias brasileiras estavam endividadas, a partir de setembro de 2011, atingiu 23%. Quase um quarto do Brasil está endividado e comprometido com pagamentos de cartões de crédito. O comprometimento, em sua maior parte, é das famílias mais carentes, que se endividaram acreditando no governo.

7 - A inadimplência

Sim, pararam de pagar. Devo, não nego, mas pago quando puder. Claro que seria injusto acusar as famílias de baixa renda pela inadimplência. Mas também elas estão nesses dados. Em março de 2011, os devedores eram 4,8% e saltaram em maio de 2012 para quase 6% da população no Sistema Financeiro Nacional (medido pelo Banco Central). Como quem comprou não pagou, o primeiro a sentir foi o comércio. Ocorreu uma estagnação geral e preocupante, exigindo do governo que retirasse todo e qualquer tipo de alíquota de imposto.

8 - Consumo de energia elétrica no comércio

Tentando usar todas as fichas, a presidente Dilma veio a público em pronunciamento oficial anunciar o corte dos impostos para a energia elétrica. Ao baratear a energia, o governo imaginou que novamente sobraria dinheiro para a população pagar suas dívidas e continuar consumindo e comprando. E isso iria incentivar o comércio a comprar mais da indústria, fazendo a taxa de desemprego cair ainda mais. Realmente, os gastos do comércio com o consumo de energia caíram drasticamente. Também a inadimplência começou a cair, mas o comprometimento familiar estagnou num patamar alto de 21% e o lucro do comércio não foi repassado para o salário que continuou no mesmo patamar de três anos antes. E se o comércio sentiu... A indústria sentiu mais ainda.

9 - Consumo de energia elétrica na indústria

O grande problema de tornar a energia elétrica mais barata é que, talvez, com a melhor das intenções, o próprio governo saiu prejudicado. Quando mexeu em diversos parâmetros ao mesmo tempo, perdeu referencial de causa. Quando se observa o dado da queda no consumo de energia pelo comércio, a redução parece compatível, em torno de 16%. Mas quando se observa a da indústria, a queda foi de quase 30%. Seria apenas a energia mais barata que afetou esses dados? Certamente não, e o pior componente e alerta é que a nossa indústria está parando de produzir.

10 - A variação do PIB

E o que confirma que a indústria está parando é a variação do PIB. Dos otimistas 4% para 2013, o próprio governo já desistiu dessa meta e o Banco Central já projeta apenas 2,5% para esse ano de 2013. Em nossa projeção no site "Mudanças Abruptas" a previsão é de 2,1% no quarto trimestre desse ano em comparação com o ano passado.

Como a indústria é um dos principais componentes do cálculo do PIB, esse é um sinal de que a indústria está parando lentamente. Claro que o agronegócio brasileiro é uma das mais fortes fontes de cálculo do PIB, mas a indústria também tem sua parte importante. E se o PIB cai, é sinal que a indústria caiu.

11 - A Bovespa

E se a indústria está parando, o melhor parâmetro são as ações. Com relatórios de lucros fracos, a Bovespa passou o primeiro semestre inteiro de 2013 na parte negativa dos lucros. Está correto também afirmar que com o investimento estrangeiro direto na bolsa, atuando nos contratos futuros de venda, os preços foram sempre forçados para baixo. O volume estrangeiro foi recorde nesse ano de 2013. Mas, se voltarmos ao mundo real, se fosse somente isso, os relatórios trimestrais desmentiriam e as ações voltariam a subir rapidamente.

Como se pode observar, desde 2010 o Ibovespa (índice que mede as ações na Bovespa em pontos) não volta ao patamar de recorde dos seus 73 mil pontos. E com mais esse cenário de perdas e preocupação, todos se voltaram para a inflação. E se olharmos para o cenário do câmbio e inflação nesse ano de 2013, vemos que ambos subiram, enquanto os prejuízos da Bovespa aumentaram. E o governo teve que agir onde não queria.

12 - A taxa de juros SELIC

Sim, o governo cedeu e começaram os aumentos da taxa nominal de juros, conhecida como SELIC, para conter a inflação. O governo não queria aumentar essa taxa, na esperança de que a crise na Europa freasse os preços e tornasse os produtos de importação mais baratos. Quem de certa forma "estragou" tudo, foi o FED (Banco Central dos EUA). Com sua política de recompra de títulos para ativar a economia nos EUA, o dinheiro do FED sobrou no mercado financeiro, fazendo os fundos especularem ao máximo em todas as pontas. E se voltaram, entre outros países emergentes, para o Brasil, em especial para o câmbio. Logo, não havendo alternativa, a estratégia de todos esses anos se mostrou inócua para o controle da inflação e o governo se voltou para a cartilha de sempre: aumento da SELIC. Mas, claro, a culpa não é do FED, mas da estratégia errada do governo do Brasil.

Qual seria o caminho alternativo, para o governo não entrar nessa ciranda, nem mesmo usar da cartilha que afeta o emprego, o rendimento familiar, a inadimplência, enfim, tudo o que ele, governo, construiu?

13 - A dívida pública interna

O segredo está em tudo o que todo mundo faz, e todo mundo que tem educação faz. Não gastar mais do que arrecada. Não inflar sua casa com o que não tem condição de manter. Essa é a regra que o governo não usa. Não usa quando cria quase 40 ministérios e secretarias. Não usa quando contrata, às vezes corretamente e outras desnecessariamente, funcionários públicos, mas não distribui de maneira logística ótima. Isso obriga mais e mais concursos, mais despesas com salários e perde o controle, facilitando esquemas de propinas e roubos. O segredo é encolher a dívida, exatamente o contrário do que se vê.

A dívida pública interna, que estava caindo em 2010 com o "falso ânimo" dos dados, fez o governo abrir o caixa para créditos excessivos, cortes em setores produtivos, cortes em investimentos públicos relevantes tais como transporte, saúde e educação. Agora, em final de mandato, tudo o que poderia ter feito em três anos, se deseja fazer com a correria de obras para aparecer na mídia. Isso não serve apenas como crítica para o governo federal, mas principalmente os estaduais, que são todos fracos, não exercendo de forma educativa fiscalização e investimentos para justificar o total de impostos que a população paga.

Com quase 40% do PIB de dívida líquida, o governo criou seu próprio calabouço de usar a cartilha que nunca desejou. Mas, ele próprio criou esse cenário ao se esquecer da educação primordial de gastar economicamente.

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* Marco Antonio Leonel Caetano é matemático e professor do Insper Instituto de Ensino e Pesquisa.

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INSPER - INSTITUTO DE ENSINO E PESQUISA

 

 

 

 

 

 

 

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