Mais Juízes
Se nos hospitais faltam seringas, termômetros, remédios, sobram pessoas sem atendimento; nos fóruns depara-se com o mesmo aglomerado de gente carente por Justiça, só que a reclamação consiste na falta de caneta, papel, computador, etc.
sexta-feira, 20 de setembro de 2013
Atualizado em 19 de setembro de 2013 13:35
A operação "Mais Médicos", importada do governo venezuelano, pode marcar o começo de outros programas para reforço do número de profissionais no pais. Já se fala na operação "Mais Professor" e, quem sabe, poderá sair da mente dos atuais governantes outra operação que bem se poderia denominar de "Mais Juízes", depois de conscientizar o jurisdicionado de que será a forma mais adequada para solucionar a morosidade da Justiça.
A medida para resolver o problema da saúde foi deflagrada pelo governo Federal e visa levar mais médicos para a periferia das grandes cidades e para o interior do país, pois, segundo a presidente Dilma Rousseff, há 700 municípios que não contam com um único médico, daí a providência inusitada de trazer profissionais do exterior para servir no território brasileiro.
O objetivo maior do "Mais Médicos" situa-se nas consultas, tratamento de doenças e prevenção.
Os entendidos da área dizem que não há falta de médicos, mas péssima distribuição dos profissionais; temos 1,95 médicos para cada mil habitantes e a Organização Mundial de Saúde recomenda 1 médico para cada mil habitantes. Portanto, a disponibilidade de médicos no Brasil é quase o dobro da recomendada desse órgão internacional.
A área médica guarda semelhanças com a área jurídica, pois, se nos hospitais faltam seringas, termômetros, remédios para as primeiras necessidades, sobram pessoas sem atendimento; nos fóruns depara-se com o mesmo aglomerado de gente carente por Justiça, só que a reclamação consiste na falta de caneta, papel, computador, informatização, ambiente digno para o trabalho, móveis, etc.
Essa operação, "Mais Médicos", pode não dar certo, por isso que é bem possível a instalação da outra campanha, denominada de "Mais Juízes" e com muito maior motivação, se considerada, para sua criação, a falta de profissionais. É que, segundo pesquisa do Instituto Paulista de Magistratura, IPAM, há falta de juízes, em quase todas as unidades federadas, porquanto a proporção média em outros países é de 24 magistrados para cada 100 mil habitantes, longe dos nossos números, onde a média é de 4, caso da Bahia, a 6 situação de São Paulo, para cada 100 mil habitantes.
A crise no Judiciário é similar à seca no Nordeste, a mobilidade urbana, a corrupção nos poderes da República, ou seja, tornou-se um fenômeno natural que não incomoda nem constrange mais a ninguém, salvo para ocupar as manchetes dos jornais, manter o status quo porque favorece a alguns em função de plataformas políticas por ocasião das eleições. Operadores do direito e todo o povo enumeram as causas da crise indefinida do sistema de prestação de serviço jurisdicional: faltam magistrados, promotores, defensores públicos, servidores, fóruns, presídios, gestores nos tribunais, leis mais adequadas, enfim ressente-se de toda a infraestrutura indispensável para a atividade.
Apenas para se avaliar a fragilidade das leis sabe-se que o município de Barra do Garças, Mato Grosso, editou a lei 1.840/95, destinando um local com área de 05 ha., "para construção futura de um Aeródromo Interespacial", para aterrisagem de discos voadores.
E essa preocupação não é monopólio do legislador nacional, pois em Washington, Estados Unidos, há uma lei que obriga o motorista, que alimenta alguma intenção criminosa, a parar, na entrada da cidade, para comunicar ao chefe de polícia que está chegando com seu instinto de violência.
Como se vê, os juízes importados trabalharão com leis de interesse universal!
É verdade que a operação "Mais Juízes" depara com alguma dificuldade, a exemplo do idioma para os magistrados recambiados, mas isso seria resolvido da mesma forma apresentada para o programa "Mais Médicos". Maiores obstáculos demandaria um curso de imersão para solucionar eventual impasse neste particular. O outro ponto difícil de ser superado seria o trabalho em condições difíceis, a exemplo de fóruns com banheiros imundos, com tetos para desabar ou espaços pequenos, mas a outra operação passa pelos mesmos problemas.
O desconhecimento das leis do país é outro obstáculo que não inviabiliza a operação, na medida em que o foco da medicina é a vida, em qualquer parte do mundo, e o objetivo da Justiça é a garantia da liberdade e do patrimônio, valores caros ao liberalismo universal. Ademais, o Judiciário terá também de impedir possível corrupção na construção do Aeródromo Interespacial, mas contará com a compreensão do motorista que vai confessar seus instintos animalescos.
Da virtual possibilidade da operação "Mais Juízes", programa inusitado e que "nunca antes na história deste país" se ouviu falar, conclui-se que servirá para levantar a imagem da presidente, aumentando seus índices de popularidade.
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* Antônio Pessoa Cardoso é desembargador do TJ/BA.