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O Judiciário como exemplo

Celso Luiz Limongi

Enquanto o Poder Legislativo expõe suas vísceras ao país, revelando ligações suspeitas com o Executivo, o Judiciário brasileiro continua demonstrando independência e seriedade no cotidiano dos tribunais. Desde o início da crise política que há meses assola a cena política nacional, e antes mesmo dele, decisões judiciais em quatro estados cassaram os direitos políticos de dois ex-governadores, dois ex-prefeitos e dois governadores, além de rejeitar as contas de campanha de um deles.

terça-feira, 22 de novembro de 2005

Atualizado em 21 de novembro de 2005 07:50


O Judiciário como exemplo


Celso Luiz Limongi*


Enquanto o Poder Legislativo expõe suas vísceras ao país, revelando ligações suspeitas com o Executivo, o Judiciário brasileiro continua demonstrando independência e seriedade no cotidiano dos tribunais. Desde o início da crise política que há meses assola a cena política nacional, e antes mesmo dele, decisões judiciais em quatro estados cassaram os direitos políticos de dois ex-governadores, dois ex-prefeitos e dois governadores, além de rejeitar as contas de campanha de um deles.


Por mais que todos os casos admitam recursos e em dois as decisões tenham sido reformadas, o fato é que todas elas, embora eminentemente técnicas, revelam a importância política de um Poder Judiciário independente e imune a pressões de qualquer ordem.


O presidente da República não se cansa de dizer que mais de mil pessoas já foram presas por corrupção desde que ele tomou posse. Não podemos esquecer de que todas estas prisões aconteceram em cumprimento a ordens judiciais, emitidas por juízes que não o deixam de fazer nem quando o acusado é um colega de toga.


A Justiça brasileira tem sido exemplar em cortar na própria carne desde o escândalo do desvio de recursos das obras do prédio do Tribunal Regional do Trabalho em São Paulo, em 1998. Não foi diferente quando, em 2003, veio a público a chamada Operação Anaconda, da Polícia Federal, onde magistrados foram processados e condenados, e um deles permanece preso. Nada disso aconteceria sem a participação decisiva, ainda que com motivações - importante repetir - puramente técnicas, de juízes e juízas a quem couberam os julgamentos das ações penais.


Todos nós sabemos que os desdobramentos dos escândalos de corrupção que hoje paralisam boa parte do Congresso Nacional e da administração federal haverão de acabar na mesa de um juiz. Seja em foros especiais ou na justiça comum, o Judiciário será mais uma vez chamado a agir diante da gravidade dos fatos e perante a sociedade brasileira.


O lamentável é que alguns dos acusados lançam mão do direito de só se pronunciar na Justiça porque apostam na sua morosidade para ganhar tempo, beneficiando-se de um sistema viciado por ritos processuais antigos e ultrapassados, que eternizam o julgamento dos litígios. Distorções como estas, que só a profunda reforma dos códigos de processo pode consertar, ensejam muitas vezes a prescrição da punibilidade de seus crimes, por decurso de prazo.


Nada disso, contudo, tira do Judiciário a relevância de seu papel como Poder da República no desempenho de suas atribuições constitucionais, ao julgar conflitos de interesses e crimes contra o erário público de forma isenta e desapaixonada, como quer o país e como esperam muitos observadores internacionais. A magistratura, nesse contexto, sente ser imprescindível uma bem fundamentada instrução dos inquéritos policiais, para que, quando se transformarem em processos, não careçam de provas consistentes. Ou seja, para que não se repita o surrado bordão de que "a polícia prende e a justiça solta".


Pesquisa de opinião realizada no ano passado por encomenda da Associação dos Magistrados Brasileiros revelou que o Judiciário é lento e fechado em si mesmo. O levantamento apontou também níveis de popularidade mais baixos para os poderes Executivo e Legislativo. Se os entrevistados não têm uma boa imagem do Judiciário, disseram ter profundo respeito pela figura individual do magistrado. Com o Congresso Nacional o estudo indicou o contrário. Para a sociedade, a instituição é mais importante que os parlamentares.


Quaisquer que sejam os resultados de todas as trocas de acusações, desmentidos, processos administrativos, interpelações judiciais, apreensão de documentos e quebras de sigilos, o importante é o resguardo da democracia e da estabilidade econômica. São elas que criam ambiente atrativo para os investimentos, a produção, a geração de empregos e de renda. E a elas um país só chega com instituições fortes. É fundamental que a crise política não contamine sua credibilidade, por mais combalidas que estejam.


O que nos move em momentos difíceis como o que vivemos agora é a certeza de que o Poder Judiciário brasileiro não se omitirá de fazer a sua parte, como tem demonstrado inúmeras vezes à opinião pública, sem a necessidade de comissões especiais de investigação.
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*Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo






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