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A flexibilidade procedimental como instrumento aliado da celeridade e da efetividade do processo

No sistema processual adotado em 1973 e ora vigente, não há flexibilidade procedimental. (...) O projeto do novo CPC contém interessantíssimas e inovadoras disposições nesse sentido. Assim como na matéria relativa à fundamentação das decisões judiciais, também nas disposições relativas ao contraditório e em muitas outras, o projeto é inovador.

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Atualizado em 20 de agosto de 2013 14:31

O procedimento costuma ser definido como o modo de ser do processo, isto é, a forma como se dá o encadeamento dos atos processuais em cada processo que tramita perante o Poder Judiciário.

Já houve certa confusão entre ambos os conceitos, talvez em razão da etimologia da palavra processo. Hoje se entende que processo não significa a forma de organização dos atos processuais. O processo é definido a partir de sua própria teleologia. Assim, se os fins do processo estão ligados à função de solucionar a parcela do conflito de interesses levada ao Poder Judiciário pela parte, o processo é visto como instrumento estatal de pacificação dos conflitos no Estado de Direito.

Acertadamente se diz, na doutrina, que processo e procedimento são diferentes aspectos de um mesmo objeto.

O sistema normativo processual prevê que o processo de conhecimento terá seu curso através das regras do procedimento comum, ordinário (aplicável à generalidade dos casos), sumário (previsões específicas do CPC) ou sumaríssimo (JEC).

O procedimento comum é o meio de que se serve a parte autora para veicular a maior parte dos pedidos em juízo. Assim, o legislador processual reservou esse procedimento básico, ou padrão, ou assim dizer, para a generalidade dos casos.

Peculiaridades existentes no plano do direito material foram consideradas e previamente escolhidas pelo legislador para compor o estreito elenco de hipóteses a que se destinaram alguns procedimentos "fora do padrão", isto é, procedimentos especiais, previstos em livro próprio do CPC ou em leis avulsas.

O procedimento comum, que me permito chamar de procedimento padrão, é o que serve, portanto, ao maior número de pretensões de Direito material, se prestando a veicular, diante do Poder Judiciário, pedidos ligados às situações mais corriqueiras, que não contenham especificidades que, a critério do legislador, mereceriam um procedimento diferenciado.

Já o elenco de procedimentos especiais foi criado pelo legislador em razão de especificidades de alguns tipos de pretensões de Direito material, capazes de justificar, segundo critérios escolhidos pelo legislador, suas respectivas indicações à obtenção de tratamento procedimental diferenciado. Os critérios de que se terá servido o legislador para escolher os temas de direito material aptos a comportar especial procedimento quando levados ao Poder Judiciário são de diversas ordens: econômicos, políticos, conjunturais, históricos etc.

A eleição da matéria possessória, por exemplo, como merecedora de tratamento procedimental especial, certamente decorreu de escolha política do legislador. Do mesmo modo ocorreu em relação à obrigação de prestar contas e assim por diante.

No sistema processual adotado em 1973 e ora vigente, não há flexibilidade procedimental. Com isso quero dizer que, fora das hipóteses de procedimentos especiais previstas pelo legislador, após sua observação no plano do Direito material, nada mais há, no processo de conhecimento, que possa sugerir qualquer tipo de adaptação do procedimento.

Se se trata de matéria que não se encaixe em qualquer dos procedimentos especiais, o procedimento comum é que deverá ser adotado, não havendo margem para qualquer alteração. Ressalvo, claro, as hipóteses do procedimento comum sumário (CPC) e sumaríssimo (JEC).

O projeto do novo CPC contém interessantíssimas e inovadoras disposições nesse sentido. Assim como na matéria relativa à fundamentação das decisões judiciais, também nas disposições relativas ao contraditório e em muitas outras, o projeto é inovador. Ousaria dizer que é verdadeiramente revolucionário e que trará, como proposto na exposição de motivos do projeto preparado pela comissão de juristas disso incumbida pelo Senado Federal, profunda simplificação do sistema, com inegáveis resultados no alcance da tão desejada efetividade do processo.

Analiso, em seguida, alguns dos dispositivos relativos à flexibilização procedimental.

O art. 139, que trata dos deveres do juiz (assim como o faz o atual art. 125) contém diversas novas disposições, muito mais abrangentes do que as que hoje constam do art. 125. Dentre elas, destaco a que prevê a possibilidade de o juiz "VI - dilatar os prazos processuais e alterar a ordem de produção dos meios de prova, adequando-os às necessidades do conflito de modo a conferir maior efetividade à tutela do direito".

Esse dispositivo, assim como proposto, me parece ser absolutamente harmônico com a necessidade de se dar ao procedimento maior flexibilidade, de modo a que desse se extraia melhor resultado. A dilação dos prazos deverá obedecer critérios de razoabilidade e ser determinada se e quando, em hipóteses específicas, se mostrar vantajosa para o efetivo alcance do objeto do processo.

Além disso, deverá respeitar a isonomia. A alteração da ordem de produção dos meios de prova poderá ocorrer também excepcionalmente, em casos nos quais a manutenção da ordem clássica possa ser prejudicial à sua própria produção. Trata-se, no fundo, de uma regra derivada da necessidade de se dar ao processo a necessária racionalidade.

O art. 380, ao dispor sobre o ônus da prova, prevê, como no sistema atual, que ao autor cabe provar o fato constitutivo de seu direito, enquanto que ao réu cabe a prova da existência de fato que se possa opor como impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. Trata-se de regra clássica de distribuição do ônus de provar, que continua sendo a regra geral adotada no sistema processual. Mas o projeto inova, assimilando aquilo que a doutrina denomina de distribuição dinâmica do ônus da prova.

O parágrafo primeiro prevê a possibilidade de atribuição do ônus de provar de modo diverso do previsto na regra geral, se houver impossibilidade ou excepcional dificuldade no cumprimento do encargo ou, ainda, se a obtenção de prova do fato contrário for mais fácil. O parágrafo terceiro possibilita às partes convenção a respeito do ônus probatório.

Diz o parágrafo primeiro que poderá o juiz distribuir o ônus da prova de modo diverso do previsto no caput "Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa, relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário".

O parágrafo terceiro generaliza a possibilidade de distribuição diversa do ônus da prova por convenção das partes, exceções feitas à hipótese de se tratar de prova que envolva direito indisponível da parte ou que crie o risco de "prova diabólica", isto é, de prova cuja produção se torne excessivamente difícil à parte o exercício do direito de provar.

As duas regras são profundamente inovadoras e facilitadoras do alcance dos objetivos da prova. Usadas com equilíbrio, e em casos excepcionais, poderão representar grande avanço ao sistema.

O art. 191, de sua vez, vai ainda mais longe, ao permitir às partes a transação antes ou durante o processo, a respeito de regras de procedimento, desde que se trate de direitos que admitam autocomposição.

O destaque que me permito fazer em relação ao art. 191 é para a possibilidade de disposição a respeito de ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, por via contratual, previamente à existência do processo, mesmo que se trate de contrato de adesão. Essa regra, no que diz respeito à prova, é ratificada, por assim dizer, no parágrafo quarto do art. 380, que prevê a possibilidade de se convencionar a respeito da distribuição do ônus da prova diferentemente do que dispõe a regra geral, antes ou durante o processo.

Os riscos de eventuais abusos nessa negociação anterior ao processo foram previstos pelo legislador. De acordo com o parágrafo quarto, caberá ao juiz controlar a validade dessas convenções, que não deverão ser aplicadas se houver nulidade (por vício de vontade, por exemplo) ou se houver sua inserção de modo abusivo em contratos de adesão.

Há, também, a possibilidade de alterações no procedimento se houver consenso entre juiz e partes, com o objetivo de "ajustá-lo às especificidades da causa", conforme dispõe o parágrafo primeiro do art. 191 do projeto.

É um avanço sem tamanho, na medida em que significa que, ao lado dos procedimentos especiais, eleitos pelo legislador em função das matérias que se destinem a veicular, haverá também a possibilidade de especialização do procedimento comum, de forma a se obter maior operacionalidade e rendimento. O benefício para a efetividade do processo é, ao menos teoricamente, imenso.

A novidade contida no projeto, se aprovada, fará com que passem a coexistir duas hipóteses de uso dos procedimentos especiais: a primeira, fruto de escolha do legislador, conforme critérios que anotei anteriormente; a segunda, decorrente de opção comum às partes e ao juiz, independentemente da matéria veiculada no processo, desde que esta admita autocomposição.

É intuitivo que a adequação do procedimento ao caso concreto tende a dar ao rito maior eficiência, com possíveis bons resultados em termos de obtenção de frutos do processo em tempo menor do que ocorreria se à hipótese levada a juízo fossem aplicadas as regras do procedimento comum.

Embora a celeridade não possa ser considerada um valor preponderante, é verdade que há casos em que a efetividade que o sistema todo deseja anda lado a lado com o tempo do processo.

A alteração das regras procedimentais, que, se aprovados esses dispositivos, deixarão de ser rígidas, tende a contribuir decisivamente para a melhor prestação da tutela jurisdicional.

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* Luiz Rodrigues Wambier é advogado do escritório Wambier & Arruda Alvim Wambier Advocacia e Consultoria Jurídica.



 

 

 

 

 

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