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Mecanismos legais de proteção a investidores no mercado de capitais dos EUA

André de Almeida, Chet B. Waldman, Emily Madoff e Natalie Yoshida

A finalidade deste artigo é retratar como os mercados de valores mobiliários nos EUA são regulados, a fim de familiarizar os investidores brasileiros e seus advogados com as ações disponíveis de proteção para os seus investimentos nos EUA.

terça-feira, 20 de agosto de 2013

Atualizado em 16 de agosto de 2013 12:02

1. Introdução

Nesta introdução, compararemos brevemente a tradição e a evolução dos mercados de valores brasileiros e norte-americano. Adicionalmente, analisaremos as normas americanas mais relevantes sobre o tema, bem como as medidas judiciais disponíveis para os investidores prejudicados nos EUA, trazendo, por fim, um breve descritivo das leis brasileiras correlatas ao tema.

Os investimentos nos mercados financeiros dos EUA estão protegidos por leis Federais, executadas por órgãos do governo (principalmente, a SEC - Securities and Exchange Commission) e/ou por investidores privados. Além da legislação Federal, cada um dos Estados individualmente considerados têm leis que visam à proteção dos investidores.

Na primeira fase do mercado financeiro americano, quando ocorria o seu desenvolvimento inicial, os investidores só podiam contar com as leis estaduais se eles fossem defraudados ou prejudicados por empresas que comercializavam papéis nas bolsas de valores norte-americanas.

No entanto, no rescaldo da histórica queda da bolsa de valores de Nova York de 1929, seguida da Grande Depressão, o Congresso dos EUA, competente para legislar em âmbito Federal, aprovou novas leis para proteção dos investidores contra fraudes e ofertas de mercado.

Já no Brasil, antes da década de 1960, os investidores normalmente se concentravam em acervos imobiliários a fim de evitar investimentos em empresas públicas ou privadas. Isto porque, naquela época, a inflação era extremamente elevada e havia regras que fixavam a taxa de juros máxima em 12% aa, fatores que contribuíram para limitar a evolução dos mercados de valores mobiliários brasileiros.

Tal situação começou a mudar em abril de 1964, quando o governo Federal lançou um programa com mudanças profundas no sistema econômico nacional, incluindo a reestruturação dos mercados financeiros. Naquela ocasião, muitas leis foram promulgadas, entre outras, a lei 4.537/64, que criou um fator de correção monetária; a lei 4.595/64, que reestruturou o sistema de intermediação financeira e criou o Banco Central do Brasil; e, principalmente, a lei 4.728/65, a primeira lei de valores mobiliários que regulou esse mercado e estabeleceu diretrizes para o seu desenvolvimento.

Com a aprovação destas normas houve muitas mudanças estruturais no mercado de ações brasileiro, tais como a reformulação da legislação sobre as bolsas de valores, a criação de bancos de investimentos e a profissionalização da corretagem.

Todo este novo arcabouço jurídico gerou um aumento dos investimentos no mercado de valores mobiliários brasileiros e, juntamente com vários benefícios fiscais concedidos pelo governo Federal, produziu um rápido crescimento na demanda por ações. Contudo, as ofertas de venda de ações permaneciam nos mesmos patamares. Logicamente, este descompasso entre demanda e oferta acabou por aumentar a especulação e, consequentemente, os preços das ações.

Foi então que, em julho de 1971, alguns investidores mais sofisticados começaram a vender suas ações, movimento que coincidiu com novas ofertas de ações. As consequências deste boom foram sofridas durante vários anos de depressão econômica, quando as ações de muitas empresas, devido ao seu baixíssimo valor, provaram ser pouco valiosas, gerando prejuízos para os investidores e uma desconfiança geral no mercado.

Esses anos de depressão econômica foram seguidos por várias tentativas do governo de regular diretamente o mercado de valores mobiliários. Muitos foram os incentivos a investimentos, quer por meio da isenção fiscal de ganhos obtidos em bolsa e pela dedutibilidade dos investimentos do imposto de renda, quer por meio de concessões de linhas de financiamentos através do BNDES.

Desde a década de 1990, com a abertura da economia brasileira aos mercados estrangeiros, o número de investidores estrangeiros tem aumentado significativamente. Além disso, as empresas brasileiras começaram a ter acesso aos mercados estrangeiros, listando suas ações em outras bolsas de valores, principalmente na bolsa de valores de Nova York, sob a forma de ADR's - American Depositary Receipts.

Embora algumas normas brasileiras tenham se espelhado na regulação americana, a tradição de regulamentação do mercado de valores mobiliários foi significativamente diferente no Brasil e nos EUA. Certamente alguns fatores, como a intervenção do governo no mercado e a notória lentidão no sistema judiciário brasileiro, fizeram com que os mercados funcionassem de maneira distinta.

2. Leis relativas a investimentos

As leis norte-americanas relativas a investimentos em títulos são bem desenvolvidas, complexas e baseadas em uma filosofia de publicidade, que protege a integridade dos mercados financeiros ao exigir dos emissores e dos ofertantes de ações plena divulgação de todas as informações relevantes, propiciando tomadas de decisões conscientes por parte dos investidores.

No âmbito federal, a Securities Act de 19331 (lei que regula os valores mobiliários) e a Securities Exchange Act de 19342 (lei do mercado de capitais), são as leis mais severas no que tange aos investidores norte-americanos contra fraudes, declarações falsas e enganosas, e/ou a falta de divulgação de informações3 relevantes.

Com empresas públicas levantando bilhões de dólares anualmente através da emissão de títulos no mercado primário, a Securities Act, lei que regula estas emissões primárias (também conhecidas como "Oferta Pública Inicial" ou "IPO") e as ofertas subsequentes de valores mobiliários, ocupa lugar fundamental no ordenamento jurídico dos EUA juntamente com o Exchange Act, regulamento que, por sua vez, encarrega-se de regular o comércio secundário desses títulos no mercado (como por exemplo nas operações que as instituições financeiras executam para seus clientes investidores).

A Securities Act estabelece uma política de transparência, exigindo que qualquer oferta ou venda de valores mobiliários seja registrada junto à SEC. Em geral, os formulários de registro exigem (i) uma descrição do patrimônio, do negócio da empresa e da garantia à venda ou à oferta, além de (ii) informações sobre a gestão da empresa e (iii) que as demonstrações financeiras sejam certificadas por auditores independentes. Aqui, é importante destacar que a SEC apenas exige que as informações fornecidas sejam precisas, mas não garante que tais informações assim o sejam. Desta forma, os investidores que compram títulos e sofrem perdas têm direito de ação contra as empresas que emitiram os títulos (e outras pessoas ou entidades envolvidas nas ofertas) se puderem provar que houve divulgação incompleta ou imprecisa de informações relevantes.

Aprofundando nossa análise sobre o Exchange Act, destacamos que este regulamento foi promulgado para forçar as empresas a divulgarem aos investidores informações essenciais para a tomada de suas decisões de investimento. Assim, o Exchange Act (i) exige que as empresas de capital aberto relatem periodicamente (anual e trimestralmente) certos pontos críticos (por exemplo, procuração para votar, ofertas públicas e outros eventos4 relevantes); (ii) proíbe a fraude e estabelece penalidades para a prática de insider trading ("Insider trading" pode ser conceituado como o uso de informações privilegiadas por parte de pessoas que estão na estrutura da corporação e que tenham tido acesso a tais informações em virtude de seu cargo, realizando operações em benefício próprio); e (iii) garante aos investidores defraudados o direito de ação contra pessoas e empresas que praticaram insider trading.

Ainda, pode-se dizer que o sistema antifraude estabelecido pelo Exchange Act prevê todos os tipos de comportamento de má-fé, tais como declarações falsas e enganosas em registros e documentos da companhia, insider trading e casos de manipulação de mercado, tornando possível aos investidores, por meio de ação judicial, recuperar a inflação do preço das ações gerada por afirmação falsa, enganosa ou por falta de divulgação das informações relevantes por parte do emitente/ofertante. Há também a possibilidade de a SEC aplicar sanções aos participantes do mercado, tais como multas e outras penalidades, sempre com a finalidade de disciplinar os participantes do mercado que violarem as leis Federais de valores mobiliários5.

Ao contrário do sistema jurídico brasileiro, nos EUA o modelo adotado é o do Common Law. Há leis e códigos, mas nem todas as normas estão escritas, haja vista que a maioria delas são desenvolvidas com base na jurisprudência dos tribunais. Mesmo nos casos em que existe uma lei específica, é comum haver opiniões judiciais que esclarecem o conteúdo e a forma de aplicação do texto legal em diferentes situações.

Para elucidar melhor essa característica, analisamos alguns exemplos de casos trazidos julgados de acordo com o Exchange Act, bem como os tipos de réus envolvidos: um fundo de pensão público iniciou uma ação por fraude de títulos da Motorola, Inc. e três de seus antigos executivos - In re Motorola Securities Litigation, processo 03 C 00287 (ND Ill). O caso envolveu alegações de declarações falsas e omissões pelos réus com relação ao financiamento da Telsim pela Motorola, uma empresa start-up de telecomunicações turca. Após da realização de estudos abrangentes que levaram quase quatro anos, alcançou-se um acordo extrajudicial no valor de US$ 190 milhões, três dias antes do início do julgamento, em abril de 2007.

Os investidores no maior complexo de fraudes, Bernard Madoff - aqueles comercializados pela Fairfield Greenwich Group (FGG), estão atualmente movendo uma ação contra FGG para recuperar seus investimentos na fraude perpetrada, e hoje amplamente divulgada, pelo famoso Bernard Madoff, Pacific west healthv Fairfield Greenwich Grp, 09-cv-0118 (VM) (S.D.N.Y.). O tribunal já emitiu um parecer sustentando a maioria das reivindicações feitas pelos demandantes contra a FGG, seus executivos e contadores, incluindo alegações de fraudes, violação do dever fiduciário, negligência grave, descumprimento contratual em benefício de terceiros, enriquecimento sem causa e auxílio na execução da fraude.

Há vários anos, dois casos foram julgados contra a Mattel, Inc. (o fabricante de alguns dos brinquedos mais conhecidos no mundo), principalmente em relação a declarações sobre a situação financeira da Mattel e a aquisição de uma empresa chamada The Learning Company, Inc. Um dos casos estava fundamentado no § 14 (a) do Exchange Act e sustentava que as informações transmitidas aos acionistas, a fim de que deliberassem sobre a aquisição, continham declarações falsas e enganosas, além de material omitindo informações importantes para os investidores, [Dusek v Mattel, Inc., CV-99-10864- MRP (CD Cal.)]. O segundo caso estava fundamentado no sistema antifraude do Exchange Act [§ 10 (b)]. Após uma fase contenciosa árdua, chegou-se a um acordo em ambos os casos na soma de US$ 122 milhões.

Um tipo diferente de caso de fraude é retratado na ação ajuizada na Flórida envolvendo Sunbeam Corporation, 98 8258-CIV Middlebrooks (SD Fl.). Embora a Sunbeam estivesse falida, os demandantes do caso conseguiram recuperar US$ 110 milhões da empresa de contabilidade que certificava os balanços da Sunbeam, Arthur Andersen, um dos maiores julgamentos já ocorridos envolvendo uma empresa de contabilidade, e US$ 31 milhões aos réus restantes.

Na hipótese de uma operação de fusão ou aquisição de empresas, é comum que os investidores acreditem ter recebido uma compensação insuficiente pela venda de suas ações. Além disso, diretores e gerentes frequentemente entram em conflitos de interesses, e a preocupação principal não é a de maximizarvalores para os acionistas. Nesses casos, os acionistas podem intentar ações para obter, entre outras coisas, um preço justo por suas ações, ou até evitar que ocorram transações injustas. Estes tipos de pedidos são submetidos às leis de vários estados e não, via de regra, a leis federais (a menos que uma procuração para voto falsa e enganosa seja emitida em conexão com um voto da transação, hipótese em que o investidor pode optar por interpor uma ação no tribunal Federal alegando violação das disposições acerca das procurações para voto estabelecidas no Exchange Act).

Processos contra corretores de valores mobiliários movidos por seus clientes/investidores, lesados pelas condutas destes (como violação dos deveres profissionais ou fiduciários), também são regidos pelas leis estaduais. Esses tipos de casos são habitualmente regulados pelos acordos que os investidores individuais firmam com empresas de corretagem e que, geralmente, elegem a arbitragem como forma de solução de conflitos.

Diferentes tipos de casos podem ser levados para o tribunal por investidores contra a sua corretora, seu banco, sua empresa ou seus consultores dependendo da natureza do crédito e da natureza da relação entre estes investidores e o banco, corretora ou consultores. Por exemplo: muitos grandes investidores de fundos de pensão públicos moveram um processo contra a BNY Mellon e State Street Bank, banco que executava operações de câmbio. Nos processos alega-se em geral que os bancos repassavam as piores taxas e preços das operações para os seus clientes, como taxas que tinham sido comercializadas durante o dia, em vez da taxa de mercado no momento do negócio e, em seguida, embolsavam a diferença. As denúncias alegavam que essa conduta violava os deveres fiduciários assumidos pelos bancos perante seus clientes, além de infringir os contratos celebrados entre estes.

Ainda, casos regidos pela legislação estadual envolvendo fusões ou aquisições são muitas vezes interpostos de forma sumária. Isto porque, é comum que uma operação de fusão ou aquisição não tenha data de fechamento prevista (geralmente o que se tem são períodos compreendidos por semanas ou até meses).

Ocorre que os demandantes muitas vezes pleiteiam mudanças nos termos da transação que está com seu fechamento pendente, tais como aumento no preço da oferta ou redução de benefícios para "insiders" e divulgação de informação relevante adicional para os acionistas que votam sobre estas operações, para que possam tomar uma decisão.

Se os acionistas não tiverem êxito em modificar as condições da operação em tela, em vários estados o processo pode ainda prosseguir com "demandantes tentando provar que os réus violaram os seus deveres fiduciários e agiram de má-fé na estruturação da transação". Sob tais circunstâncias, os processos poderão demorar mais tempo para serem finalizados do que quando eles processados sumariamente.

Temos alguns exemplos simples deste tipo de litígio: No processo dos acionistas da Aramark Corporation, Consolidado C.A. 2117-N (Del. Ch.), um fundo de pensão público contestou uma transação na qual o diretor executivo da Aramark, o presidente do conselho de administração, outros membros da administração que controlavam cerca de 40% do total dos votos da companhia, juntamente com vários patrocinadores financeiros, tentaram comprar a saída (buyout) dos acionistas públicos da Aramark. Como resultado deste litígio, a proposta de aquisição das ações inicial foi aumentada por um benefício financeiro agregado aos acionistas públicos da Aramark no valor de US$ 222 milhões e os membros da administração da companhia concordaram em reduzir seu poder de voto a um décimo do que tinham, dando assim aos acionistas públicos o poder irrestrito de vetar as aquisições de ações, se assim desejarem. Em Rice versus Lafarge North America, Inc., Civil n º 268974-V (consolidado) (Circuit Court, Md.), um fundo contestou uma oferta feita em 2006, no valor de US$3 bilhões, pelo acionista majoritário da Lafarge North America, Inc. ("LNA") de $75 dólares por ação, alegando que esta seria manifestamente insuficiente para os acionistas públicos minoritários da LNA. Depois de expor suas reivindicações, os demandantes finalmente tiveram o caso resolvido quando o acionista majoritário da LNA alterou sua oferta para $85,50 dólares por ação, o que representou um aumento total de $383 milhões dólares para membros desta classe a partir do preço inicial contestado na justiça.

No Brasil, durante muito tempo, os mercados de capitais não puderam crescer em importância devido à falta de proteção aos acionistas públicos e à instabilidade dos regulamentos financeiros. Além disso, a falta de transparência na gestão e a ausência de mecanismos corporativos adequados para a supervisão da oferta de ações contribuíram para a desconfiança neste tipo de investimento e impactaram a percepção de risco dos investidores.

Na última década, temos assistido a algumas iniciativas institucionais e governamentais que visam à melhoria das práticas de governança corporativa nos regulamentos brasileiros. Neste contexto, vale destacar a promulgação da lei 10.303/01, que cria a Comissão de Valores Mobiliários, entidade responsável por disciplinar, fiscalizar e desenvolver o mercado de valores mobiliários brasileiro. Vale ainda destacar as iniciativas regulamentares que classificaram as companhias em categorias diferentes, dependendo do nível de governança corporativa que cada um delas pratica, criando o chamado Novo Mercado, segmento de listagem com o mais elevado nível de governança corporativa. Em que pese estas importantes previsões legislativas, em termos de divulgação de informações, a regulamentação das operações com valores mobiliários no Brasil ainda está longe de ser o ideal.

Certamente uma das razões fundamentais da diferença entre o mercado financeiro brasileiro e americano está no fato de o dos EUA ser muito mais maduro que o que temos no Brasil. Este estágio menos desenvolvido, se comparado com o panorama norte-americano, está refletido no desenvolvimento das próprias normas de regulamentação do setor.

3. Procedimentos Processuais

Os casos federais envolvendo valores mobiliários nos EUA ajuizados por investidores privados são muitas vezes iniciados como ações coletivas. Em uma ação de classe, conhecida como ação coletiva no Brasil, a parte prejudicada pode ingressar com uma ação, supostamente representando todas as partes, ou seja, representando todas as outras pessoas com o mesmo problema. Por meio de um procedimento durante o processo conhecido como "certificação de classe", o chamado demandante procura demonstrar que muitos terceiros têm sido igualmente enganados pela empresa demandada e que é capaz de representar os interesses de todos os demais acionistas em situação semelhante no que diz respeito ao crédito em questão.

Os investidores também podem ajuizar ações relativas a valores mobiliários como ações individuais. Porém, devido à complexidade dessas ações, os investidores (privados ou fundos de pensões públicas) precisam ter perdas muito significativas, que compensem a propositura de uma ação. Estas ações individuais são muitas vezes ajuizadas concomitantemente com ações coletivas envolvendo os mesmos demandados.

O Private Securities Litigation Reform Act de 19956, (o "PSLRA") alterou significativamente a forma como as ações privadas sobre valores mobiliários na esfera federal dos EUA são processadas. O PSLRA adota um procedimento elaborado para dar aos investidores, particularmente aqueles que mais afetados, um maior controle sobre a condução da ação coletiva. A legislação prevê a possibilidade de o Tribunal designar um "autor principal", membro ou membros da classe requerente, que este tribunal determine como o mais capacitado para representar os interesses de todos. A lei exige que o requerente que esteja propondo a ação coletiva de acordo com o Securities Act ou com o Exchange Act publique um aviso, no prazo de 20 dias da propositura da ação, informando aos demais membros de sua classe que todos dispõem de 60 dias para oferecer-se ao Tribunal como autor principal. Assim, a legislação cria a presunção de que o membro da classe que tem o "maior interesse financeiro na reparação pretendida pela classe" é o autor mais adequado para representar os demais.

Não há um limite exato de tempo que uma ação pode demorar para ser julgada em um caso submetidos às leis de valores mobiliários americanas (lembrando que podem terminar por acordo ou julgamento seguido de sentença). Alguns casos levam de 2 a 3 anos, enquanto outros levam quatro anos ou mais. O prazo de duração vai depender de muitos fatores, como a natureza do caso, os fatos, o tribunal, o juiz e as estratégias adotadas pelos advogados e seus clientes.

Nos casos envolvendo valores mobiliários nos EUA, ações coletivas especiais são geralmente tratadas com base em honorários de contingência, isto é, o demandante incorre em honorários advocatícios até que haja uma resolução do caso em benefício dos demandantes, além de honorários provenientes da recuperação (ou, se for o caso, dos valores pagos réus ou por suas seguradoras).

4. Conclusão

Ao contrário das normas brasileiras sobre mercados de capitais, as leis norte-americanas são extremamente mais complexas e detalhadas, sendo que um profundo conhecimento e um bom apoio jurídico são essenciais para o sucesso da reivindicação de um investidor.

Os Tribunais dos EUA estão mais familiarizados com este tipo de ação sofisticada, o que motiva a parte que sofreu os danos a buscar uma compensação justa. Como visto acima, os processos e a sistemática envolvidos nas ações norte-americanas são significativamente diferentes daqueles envolvidos em uma ação semelhante no Brasil. Assim, fatores de fundamental importância como leis bem desenvolvidas sobre investimentos de mercado de capital e a familiaridade dos Tribunais dos EUA com estas ações complexas constituem incentivos cruciais para o investidor buscar o seu ressarcimento nos EUA por perdas injustas relacionadas a seus investimentos.

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1 15 USC . § 77a, et seq.
2 15 USC. § 78a, et seq.
3 Existem outras leis que também merecem ser consideradas, como por exemplo, o Investment Company Act de 1940, que regula a organização das empresas, incluindo fundos mútuos e o Investment Advisers Act de 1940, que regula os investimentos dos consultores. Ainda, a Sarbanes-Oxley Act de 2002 determinou uma série de reformas para melhorar as práticas de governança corporativa e aprimorar as publicações financeiras, combatendo a fraude empresarial e financeira. O Dodd-Frank Wall Street Reform e Consumer Protection Act de 2010, resultado da recente turbulência nos mercados financeiros dos EUA, prepara-se para remodelar o sistema regulador dos EUA em uma série de áreas, como as classificações de crédito, a regulação de produtos financeiros, a governança corporativa, a publicidade e a transparência dos atos praticados no mercado financeiro americano.
4 Um estudo mais aprofundado e extenso sobre as leis de valores mobiliários americanas e as publicações e arquivamentos necessários à sua análise detalhada estão além do escopo deste artigo. Para uma descrição mais abrangente das várias leis e formulários, incluindo os textos detalhados, consulte o site da SEC, 
ou contate a Wolf Popper LLP.
5 Em 2010, a Suprema Corte dos EUA emitiu um parecer que limita a extensão da aplicação dos regulamentos federais sobre valores mobiliários. Em Morrison versus National Australia Bank LTD., __ EUA__, 130 S. Ct. 2869 (2010), o tribunal considerou que a reivindicação trazida por investidores estrangeiros contra empresa estrangeira com base em transações de valores mobiliários em países estrangeiros, não poderia ser julgada nos Estados Unidos ao abrigo dos dispositivos antifraude do Exchange Act. Morrison reiterou o "princípio de longa data que diz que a legislação do Congresso dos EUA foi concebida para ser aplicada apenas no âmbito da jurisdição territorial dos Estados Unidos." O tribunal argumentou que
o foco do Exchange Act é "a compra e venda de valores mobiliários nos Estados Unidos." 130 S. Ct. 2877. O escopo desta decisão ainda está sendo desenvolvido nos tribunais federais. Veja, por exemplo, o caso Absolute Activist Value Master Fund Ltd. versus Ficeto, 2012 U.S. App. LEXIS 4258 (2d Cir. Mar. 1, 2012). Deve-se ressaltar, no entanto, que a decisão de Morrison não exclui necessariamente os investidores estrangeiros de processar nos tribunais dos Estados Unidos, particularmente quando os títulos são os de uma empresa listada na bolsa de valores dos EUA e negociados neste mercado.
6 15 USC. § 78u-4, et seq.

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* André de Almeida e Natalie Yoshida são advogados do escritório Almeida Advogados; Chet B. Waldman e Emily Madoff são advogados.

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