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LC 110/01: exaurimento da finalidade da multa de 10% do FGTS

Paula Elizabeth de Souza Almas

A cobrança da referida contribuição social vem sendo realizada em desconformidade com os preceitos tributários, sendo cabível o ajuizamento de ação para ver reconhecido o direito à repetição do indébito e à não sujeição à sua incidência em fatos geradores futuros.

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Atualizado em 5 de agosto de 2013 14:08

Conforme é de conhecimento geral, a LC 110/01 criou uma nova contribuição social, popularmente conhecida como "multa de 10% do FGTS", devida à União e instituída com o escopo de viabilizar o pagamento da atualização monetária das contas vinculadas de FGTS, que sofreram expurgos por ocasião do Plano Verão (janeiro de 1989) e do Plano Collor (abril de 1990).

Em um primeiro momento, questionou-se a constitucionalidade dessa nova exação, que violaria o disposto nos artigos 149 e 195 da Constituição da República, uma vez que tais dispositivos não autorizam a criação de contribuição com a finalidade de custear o Fundo de Garantia de Tempo de Serviço - FGTS.

No entanto, a tese dos contribuintes foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal, que entendeu pela constitucionalidade da exação, cuja natureza tributária foi reconhecida, constituindo espécie de contribuição social.

Ocorre que, recentemente, os contribuintes retomaram as discussões acerca da constitucionalidade do citado tributo, em vista do exaurimento da finalidade para o qual foi instituído.

Isso porque a Caixa Econômica Federal, responsável pela administração das contas do FGTS, reconheceu que o débito referente à atualização monetária das contas de FGTS foi integralmente quitado no início do ano de 2012. Os valores atualmente arrecadados com a contribuição estão sendo utilizados pela União para realizar o chamado superávit primário e destinados, também, a programas sociais do governo.

Conforme ensinamentos da teoria quinquipartite (ou pentapartida) dos tributos, reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal, as contribuições especiais são tributos afetados a fins específicos. Logo, somente podem ser cobradas na medida do estritamente necessário à implementação da finalidade para o qual foram instituídas. Exaurido o escopo da contribuição, ela perde automaticamente sua legitimação constitucional, em decorrência do requisito da necessidade, ínsito a tal espécie tributária.

Assim, tendo sido amealhados recursos suficientes para o pagamento dos expurgos do FGTS relativos aos planos Collor e Verão, em outras palavras, tendo sido constatado o exaurimento da finalidade para a qual foi instituída, não há nada que justifique a manutenção da cobrança da citada contribuição social.

Cientes do exaurimento de sua finalidade e da necessidade de se reduzirem os encargos incidentes na folha de pagamentos dos empregadores, em 3/7/13 a Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei complementar 200/12, que, no entanto, foi vetado em 25/7/13 pela Presidenta da República.

O veto foi justificado nos seguintes termos: "a extinção da cobrança da contribuição social geraria um impacto superior a R$3.000.000.000,00 (três bilhões de reais) por ano nas contas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS, contudo a proposta não está acompanhada das estimativas de impacto orçamentário-financeiro e da indicação das devidas medidas compensatórias, em contrariedade à Lei de Responsabilidade Fiscal. A sanção do texto levaria à redução de investimentos em importantes programas sociais e em ações estratégicas de infraestrutura, notadamente naquelas realizadas por meio do FI-FGTS - Fundo de Investimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço. Particularmente, a medida impactaria fortemente o desenvolvimento do Programa Minha Casa, Minha Vida, cujos beneficiários são majoritariamente os próprios correntistas do FGTS".

Em primeiro lugar, cumpre ressaltar que não se sustenta o argumento de que a extinção da contribuição geraria um impacto superior a 3 bilhões de reais por ano no orçamento. Ora, como visto, a contribuição foi criada com a finalidade específica de arrecadar fundos para possibilitar o pagamento da atualização monetária das contas vinculadas de FGTS, que sofreram expurgos por ocasião dos Planos Verão e Collor. Assim, os valores arrecadados tem destino certo, não estando disponíveis para aplicação em 'programas sociais' e 'ações estratégicas de infraestrutura', conforme sustenta a Presidenta. Uma vez quitado referido débito, não há que se falar em impacto orçamentário-financeiro decorrente da extinção da contribuição social, visto inexistir atualização monetária de contas de FGTS a ser paga.

É verdade que a lei de responsabilidade fiscal exige a previsão de medidas compensatórias nos casos de renúncias de receita, mas há que se ter em mente que a quitação das dívidas referentes ao pagamento das atualizações monetárias devidas já cumpre a finalidade buscada pela criação de medidas de compensação, consistente no equilíbrio do orçamento público. Isso porque, inexistindo despesa, desnecessária a previsão de receita para lhe fazer frente. Ora, a eliminação da despesa é a contrapartida necessária à renúncia da receita decorrente da extinção da contribuição social.

Em seguida, ressalte tampouco ser factível o argumento de que a sanção do texto levaria à "redução de investimentos em importantes programas sociais e em ações estratégicas de infraestrutura". Como já exaustivamente demonstrado, o valor arrecadado com a contribuição social em pauta tem destinação certa e exclusiva: pagamento das atualizações monetárias das contas vinculadas de FGTS, que sofreram expurgos por ocasião dos Planos Verão e Collor.

Por fim, constata-se, também, que as razões para o veto deixam claro que já foi cumprida a finalidade que legitimou a instituição da contribuição, tanto é que os valores arrecadados passaram a ser utilizados em programas sociais do governo, tais como o Programa Minha Casa, Minha Vida. Não há dúvidas, portanto, acerca da inconstitucionalidade superveniente da contribuição em comento, em razão do exaurimento da finalidade justificadora de sua instituição.

Não obstante não se possa negar a importância dos investimentos governistas realizados no setor social, a classe empresarial não pode continuar a ser onerada com a cobrança de uma contribuição social atualmente inconstitucional. Os encargos incidentes na folha de pagamentos das empresas brasileiras já são enormes e agora corre-se o risco de perpetuação da cobrança de um tributo cuja criação inicial era temporária, ou seja, apenas para viabilizar o pagamento da atualização monetária das contas vinculadas de FGTS, que sofreram expurgos por ocasião dos Planos Verão e Collor.

Há de se ter em mente, portanto, que há mais de um ano a cobrança da referida contribuição social vem sendo realizada em desconformidade com os preceitos tributários ora expostos, sendo perfeitamente cabível o ajuizamento de ação judicial para ver reconhecido o direito à repetição do indébito e à não sujeição à sua incidência em fatos geradores futuros.

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* Paula Elizabeth de Souza Almas é advogada do escritório Piazzeta e Boeira Advocacia Empresarial.

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