Perda de rumo
Todavia, a par dalguns equívocos (a evidenciar, no mínimo, despreparo para a solução pontual das mazelas nacionais), sobrelevou a questão da "promessa de importação de milhares de médicos estrangeiros".
domingo, 14 de julho de 2013
Atualizado em 12 de julho de 2013 10:02
O inesperado movimento popular, com histórico afluxo de pessoas às ruas, nitidamente, preocupou o governo brasileiro.
Decerto, até o temor por algo pior visitou a mente dos governantes, especialmente da presidente da República.
Nesse contexto, fez-se preciso alguma resposta, que esfriasse o ânimo da população (possível cortina de fumaça), justamente indignada por abusos sistemáticos de toda ordem - carga tributária extorsiva, sem contraprestação devida; saúde gravemente enferma; insegurança generalizada; educação relegada a plano terciário; transportes de péssima qualidade, com tarifas em alta (substancialmente, a cargo do povo); superfaturamento de obras, com desvio de dinheiro; inequívoca falta de infraestrutura, em quase todos os setores de atividade; leis penais frouxas, a só prestigiar o direito dos bandidos; obrigatoriedade do voto, inconcebível numa democracia de verdade, e por aí vai...
E, como natural, essa resposta veio na forma dum discurso, no qual fixadas "metas".
Todavia, a par dalguns equívocos nele refletidos (a evidenciar, no mínimo, despreparo para a solução pontual das mazelas nacionais), sobrelevou a questão da "promessa de importação de milhares de médicos estrangeiros" - mais especificamente, de Cuba.
E por que viriam? Para dar vazão à necessidade de áreas carentes de mão de obra, abstração feita ao fato de que, neste momento, quase todas as áreas estão dela carentes - a indicar que a vida nacional tem sido regida mais por discursos vazios, feitos para seduzir, do que por ações efetivas a bem da população, já farta dessa lengalenga.
Ora, a ampliação do atendimento do SUS passa, antes de qualquer coisa (e só bom senso o mostra), pela melhor qualificação da mão de obra do próprio país e, mais que isso, pela concessão, pelo governo, de melhores condições de trabalho (até como contraprestação dos escorchantes impostos cobrados), passando-se a tratar a população, hoje abandonada nos corredores dos hospitais, como gente - e não como bicho.
Dito isto, vê-se assomar o discurso populista, ideológico e eleitoreiro, no sentido de, à distância da obrigatória visão da incompetência administrativa governamental, se arrumar solução que tape o buraco duma lição de casa não feita, de mau prognóstico.
Médicos, e bons, o Brasil tem. Para que aqui cliniquem, faz-se preciso aprovação em prova específica. Do que se tem notícia, a medicina cubana é das mais atrasadas do mundo (segundo reportagem de Veja, publicada em 15/5/13) e, nos últimos dois anos, apenas 5% dos médicos de lá oriundos passaram na prova do Revalida, criada para que formandos no exterior comprovem sua aptidão.
Evidencia-se o fato, pois, de que, além de não resolver o grave problema do atendimento público de saúde, a ideia da Presidente traduz razão ideológica - a afinidade do PT com a ditadura dos irmãos Castro. De fato, persistirão as causas motivadoras do mau atendimento, de ordem estrutural/governamental. Continuará a faltar muita coisa (equipamentos e congêneres), inclusive macas.
Positivamente, a solução dessa questão passa por outro tipo de abordagem e bem à distância do só discurso populista, ao que se infere, propositalmente lançado para "acalmar os ânimos". Há de se prestigiar o profissional nacional, dando-lhe efetiva condição de trabalho digno, sem a desculpa infundada, quão conveniente, arrumada para agradar o povo, de que outros, doutras plagas (regiões ou países), em prejuízo daqueles, farão mais e melhor.
É o cúmulo, decididamente. Engraçados os dirigentes brasileiros. Enquanto discursando, enaltecem o atendimento do SUS (alguns, até, dizem que o procurarão, caso necessitem). Porém, quando doentes, privilegiados por uma realidade muito distante do povão, não hesitam em se tratar em hospitais privados de alta conceituação e custo. Aqui, como em tantas outras coisas neste País, grita a hipocrisia - que só começa a ser entrevista pela população.
Ou seja, não faltam médicos. Falta, sim, o cumprimento do dever legal de servir positivamente ao povo, sem que dele se sirvam. Falta, sim, a sincera seriedade no trato da coisa pública - a bem desse mesmo povo. Dê-se ao médico nacional, pois, a estrutura necessária, tratando-o como se deve, e o prestígio da nossa medicina implicará o automático benefício da população que se ergue nas ruas.
Chega de diz que diz. Passou da hora de se dar rumo novo às coisas de interesse do Brasil. Menos conversa e mais ação; mas, com competência e patriotismo, de forma a privilegiar não mais os interesses particularistas, mas o verdadeiro interesse nacional. O povo está à espreita... e ainda grita lá fora! Avante Brasil.
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* Edison Vicentini Barroso é magistrado e cidadão brasileiro.