Plebiscito todo dia
As marchas dos jovens, independentes, foram e estão sendo uma bela manifestação da opinião pública, assunto sempre abordado pelos teóricos do Estado.
quinta-feira, 11 de julho de 2013
Atualizado em 10 de julho de 2013 15:17
Nos idos de 1984, o vice-Presidente Aureliano Chaves, em resposta ao Presidente Figueiredo, disse, com sua conhecida franqueza: "Ninguém pode ignorar o clamor das ruas!". Nunca esteve tão certo o lúcido e bravo estadista mineiro. Isso aconteceu quando das manifestações em favor das "Diretas Já".
E, agora, em um movimento "internético", impressionante, o povo voltou às ruas. As marchas dos jovens, independentes, foram e estão sendo uma bela manifestação da opinião pública, assunto sempre abordado pelos teóricos do Estado.
Como professor dessa ciência básica, cuido de ressaltar aos alunos a força da opinião pública. E cito Hermann Heller, para quem a opinião pública é "uma força governante, constituindo uma forma singular de relativização do Estado ao povo e da identificação do Poder do Estado com a vontade do povo". Com sua admirada precisão científica, o mestre alemão acrescenta: "A importância da opinião pública para a unidade estatal é tanto maior quanto mais precisa. Esta opinião pública relativamente firme e permanente tem que se diferenciar da opinião política de cada dia".
Para agradável surpresa, a opinião pública brasileira, que estava em letargia e desinteresse nos recentes anos, mesmo com tantos desvios, desmandos e descompassos (para ficarmos em 3D...), acordou, de repente, nas jovens cabeças, e saiu às ruas, praças e viadutos, em clamor sonoro e pacífico (perturbado, infelizmente, por marginais).
A oportuna música do Seu Jorge grita em seu refrão que "não é só pelos 20 centavos que estamos lutando" e, sim, por educação, saúde, segurança, transportes, rodovias, reforma política, honestidade, ética e proficiência na administração nacional.
Reivindicações justas e necessárias que o Congresso Nacional, como titular eleito do poder legislativo e até do poder constituinte derivado, pode e deve, por leis e emendas, atender e elaborar a nova normatização, nos termos da CF de 1988 (o que já poderia e já começou a ser feito sob a pressão das vozes urbanas).
E, no entanto, a nossa Chefe do Executivo, tendo a seu lado o vice-Presidente, professor de Direito Constitucional (!), propõe, primeiramente, a convocação de um Congresso Constituinte Exclusivo e, logo depois, arrependendo-se de tal coisa esdrúxula, vem defender a realização intempestiva de um plebiscito para a reforma política.
Plebiscito é coisa seríssima e não saída demagógica. Não é uma simples pesquisa de opinião. É uma consulta feita ao povo, a priori, isto é, antes que uma legislação seja elaborada pelo órgão próprio do Estado, no caso o Legislativo. Não é uma prova de múltipla escolha, contendo imensas perguntas a confundirem os eleitores, os cidadãos. Deve conter uma pergunta clara e enxuta, para uma resposta "sim ou não". E a resposta será uma ordem ao Governo.
Para reformar a CF, o Congresso Nacional eleito (nem todo ele com acerto), já tem esse poder de revisão, que é limitado, nos termos do art. 60 de nossa Constituição.
O máximo que se pode aceitar é um referendo, após a elaboração da reforma. E, mesmo assim, acho arriscado...
O que se deve escutar agora e não simplesmente ouvir (para refletir e agir) é a voz desta nação, que é a alma do povo. Na palavra inspirada do francês Renan, "a nação é o plebiscito de todos os dias".
O povo brasileiro não precisa agora e não quer um plebiscito ou mesmo um referendo. Seus temas e suas pré-respostas já estão na mesa.
Que o Legislativo e o Executivo, pois, trabalhem com essa pauta. E que o Judiciário, quando provocado, solucione os possíveis conflitos.
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* Ricardo Arnaldo Malheiros Fiuza é membro da Academia Mineira de Letras Jurídicas e editor-adjunto da Editora Del Rey.