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Cessão de créditos em segurança de obrigações

Ao contrário da cessão fiduciária de créditos, na cessão de créditos em segurança a transferência de propriedade é definitiva.

quarta-feira, 20 de março de 2013

Atualizado em 19 de março de 2013 13:09

O tomador de um empréstimo transfere ao banco, como garantia, créditos que tem contra terceiros. Quitada a dívida, faz jus a receber o saldo remanescente dos direitos creditórios. Essa operação é conhecida como cessão fiduciária de créditos. Porém, nela não existe propriedade fiduciária, ou seja, aquela que retorna ao fiduciante (no caso, o tomador do empréstimo) quando do pagamento da obrigação garantida. O que existe é transferência definitiva de propriedade com o fim de assegurar o adimplemento de uma prestação. Por isso, melhor falar de "cessão de créditos em segurança".

A expressão é de Pontes de Miranda e cabe perfeitamente para negócios com direitos creditórios. Estes são, em regra, coisas fungíveis, ou seja, podem ser substituídos por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade. A propriedade de uma coisa fungível transferida em garantia não é resolúvel porque o "fiduciante" não tem direito à restituição da coisa em si, podendo o "fiduciário" devolver outra do mesmo gênero e valor. Assim, se o "fiduciário" que recebeu créditos não cumprir sua obrigação de restituição, sobra ao "fiduciante" cobrar judicialmente o montante que lhe for devido.

Tal reflexão revela que, ao contrário da propriedade fiduciária de coisa infungível, em que o fiduciante tem um direito real de reaver o bem se pagar a dívida, na cessão de direitos creditórios o devedor tem apenas um direito pessoal de cobrar do seu credor a quantia que sobejar dos créditos. A propriedade do ativo transferido não retorna ao transferente, permanecendo em definitivo com aquele que a recebe, o qual tem livre disposição sobre o crédito e pode, inclusive, aliená-lo a terceiros.

Esse fato é especialmente evidente na hipótese de o direito creditório cedido ser quitado pelo respectivo devedor. O valor recebido será imputado em pagamento da dívida garantida, e não restituído ao cedente do crédito, mesmo que referida dívida ainda não esteja vencida, caso em que os recursos oriundos do direito creditório deverão ser reconhecidos como pagamento antecipado por parte do cedente.

Dessa forma, na cessão de créditos em segurança não tem sentido falar em pacto comissório (ou em sua vedação), que é a autorização contratual conferida ao credor para ficar com a coisa se o devedor se tornar inadimplente. Como os direitos creditórios são transferidos definitivamente desde o início, seu novo titular os manterá sempre, haja ou não pagamento da obrigação assegurada.

Ademais, se o cessionário dos créditos for solvente, eventuais credores do cedente não poderão questionar o negócio. Isso porque o cedente passa a ser titular de um direito eventual em face do cessionário, que é receber o saldo após pagar sua dívida. Portanto, os credores do cedente podem se apropriar desse direito eventual, que será hígido diante da situação patrimonial positiva do cessionário. Nesse contexto, mesmo que se quisesse aplicar a vedação ao pacto comissório, a operação não seria nula em razão da ausência de prejuízo aos credores do transferente, incidindo o princípio de que pas de nullité sans grief: "não há nulidade sem prejuízo".

De certo modo, a alienação de créditos em segurança de obrigação separa fidúcia e resolubilidade da propriedade em negócios com função de garantia. A fidúcia, no sentido de confiança, continuará presente na crença presumida do cedente de que, quitado o débito, o cessionário lhe "devolverá" eventual saldo dos direitos creditórios cedidos. Já a resolubilidade não se verificará porque, uma vez alienados, os créditos não retornam à esfera patrimonial do cedente, cabendo a este apenas cobrar o excesso do cessionário, inclusive para evitar enriquecimento sem causa dele.

Vale mencionar que a cessão de créditos em segurança de obrigação vem normalmente acompanhada da chamada "cessão fiduciária de conta corrente" do devedor. A conta cedida é a que recebe os pagamentos dos direitos creditórios transferidos ao credor. Nesse caso, porém, existe fidúcia propriamente dita. Na verdade não há cessão fiduciária da conta corrente, mas sim do crédito que o depositante (devedor) tem contra o depositário (instituição financeira) de sacar determinada quantia. Esse crédito é alienado fiduciariamente ao credor da obrigação assegurada, nos termos do artigo 66-B da Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965.

A conclusão é que a cessão de créditos em segurança de obrigação, por não envolver propriedade resolúvel, deve ficar fora das atuais discussões existentes em doutrina e jurisprudência sobre a força das garantias fiduciárias. Na qualidade de proprietário definitivo dos direitos creditórios, o cessionário-credor não deve ser afetado por eventos críticos como insolvência, falência ou recuperação judicial do cedente-devedor. Isso é reforçado quando há cessão fiduciária da "conta corrente", sendo inquestionável que o credor poderá receber os pagamentos relativos aos créditos até a extinção da obrigação assegurada.

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* Kleber Luiz Zanchim é sócio do escritório Souza Araujo Butzer Zanchim Advogados

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