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A arbitragem e a vinda da família real portuguesa

A arbitragem e a vinda da família real portuguesa, ou, como andar na moda pode não ser uma boa escolha

Como andar na moda pode não ser uma boa escolha.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Atualizado em 28 de dezembro de 2012 09:36

Como alternativa para a solução de problemas jurídicos no campo dos direitos patrimoniais, a arbitragem tem sido cantada em prosa e verso, ressaltando-se as suas vantagens em relação, comparativamente, a uma disputa deflagrada no carcomido sistema judiciário brasileiro. Que há muitas vantagens isto é sabido por todos os profissionais que têm atuado neste setor em franco desenvolvimento no Brasil. Neste sentido, pode-se dizer que a arbitragem virou uma moda vivamente em voga nos nossos meios jurídicos. Mas as modas podem ser perigosas e podem acarretar situações desagradáveis.

Conta-se que, quando a família real portuguesa chegou fugida ao Brasil, as damas brasileiras, tomando as da corte como modelo, passaram a raspar inteiramente as suas cabeças que eram cobertas com lenços coloridos, o que se tornou uma moda entre elas. Mas a coisa estava fundada em um equívoco:  raspar a cabeça e cobri-la com lenços não se tratava de moda em Portugal, mas a forma mais simples que foi encontrada de se livrarem aquelas damas de uma infestação de piolhos, adquirida na travessia do Atlântico...

No mesmo sentido, o recurso à arbitragem não deve ser tomado como uma moda que, adotada sem os devidos cuidados, pode deixar as partes completamente carecas, pela perda dos seus cabelos por terem sido levadas a andar por um caminho não adequado aos seus interesses e necessidades. E um dos aspectos que tem se revelado mais problemáticos é o do inadimplemento de uma ou de ambas as partes em relação ao pagamento dos custos da arbitragem, especialmente quando se trata daquela de natureza institucional.

Custos existem, tanto no Judiciário, quanto na arbitragem. Mas nesta eles se concentrarão em um período de tempo relativamente curto e geralmente exigem das partes um dispêndio mensal para a cobertura dos serviços prestados pela câmara arbitral escolhida, além dos honorários dos árbitros, geralmente fixados a partir de um patamar mínimo, que sempre será devido. Estas despesas se agregam às que são normais em qualquer ação judicial ou em arbitragens e pode acontecer que uma ou as duas partes se vejam sem condição de cobri-las.  

Diante do inadimplemento de uma parte, o regulamento das câmaras sempre prevê que caberá à outra assumir os valores correspondentes, pagando o seu próprio quinhão e o da outra, podendo ou não recuperar ao final o que lhe for considerado devido. Tanto neste caso, quanto o do inadimplemento das duas partes, a solução dada é a da suspensão inicial do feito para, em algum momento seguinte, a sua extinção no âmbito da câmara de arbitragem. Disto resulta que a prestação jurisdicional não será outorgada ao mesmo tempo que continua vedado o recurso ao Judiciário.

Muitas vezes tem acontecido que a própria parte vencedora, beneficiada por uma sentença parcial, não tem os recursos para sustentar o andamento da arbitragem nos passos seguintes, geralmente relativos à perícia para a apuração dos haveres que lhe foram considerados devidos. A outra parte, perdedora, faz de conta que o assunto não lhe diz respeito, fingindo-se de morta e abandonando o procedimento, inadimplente.

Poderia o vencedor do pleito, excepcionalmente, buscar o Judiciário para a satisfação do seu direito, alegando que sua inadimplência resultaria do prejuízo que lhe teria sido causado pela outra parte e requerer a apreciação do seu pedido perante aquele, sobre o fundamento de que, em caso contrário, teria sido ilegalmente negado o seu direito de acesso à justiça. Mas não se pode até mesmo dizer que a matéria seja controvertida, pois, havendo escolhido, em tese, livre e conscientemente o caminho da arbitragem, o outro lhe seria vedado, pois não lhe seria permitido alegar o desconhecimento dos riscos nos quais incorreria.

Vale dizer que os advogados, quando orientam os clientes nos seus negócios e na celebração de contratos, se entenderem que a inclusão de uma cláusula compromissária com a opção pela arbitragem é a medida mais eficaz, somente assim venham a agir depois de exporem aos seus interlocutores os riscos aos quais estarão sujeitos e neste caso, especialmente o financeiro, cientes de que, uma vez instaurado o feito e a outra parte deixar de honrar as suas obrigações financeiras perante a câmara arbitral, lhes caberá cobrir o débito da outra.

Não atendidos os pressupostos acima, vamos logo buscar a navalha, o pincel, o creme de barbear e um lenço bem bonito para podermos entrar na moda.

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*Haroldo Malheiros Duclerc Verçosa é professor de Direito Comercial da Faculdade de Direito da USP e consultor do escritório Mattos Muriel Kestener Advogados.

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