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Assembléia de credores no processo de recuperação judicial

Como votam os credores trabalhistas na assembléia geral de credores de uma empresa em recuperação judicial?

quarta-feira, 5 de outubro de 2005

Atualizado em 4 de outubro de 2005 10:25


Assembléia de credores no processo de recuperação judicial


Jorge Lobo*


Como votam os credores trabalhistas na assembléia geral de credores de uma empresa em recuperação judicial?


A resposta, dita e repetida, por jovens e, também, provectos advogados, especialistas em Direito Falimentar, tem sido: "com fundamento no artigo 41, § 1º, da Lei de Recuperação e Falência da Empresa - LRFE, os credores trabalhistas votam sempre por cabeça, independentemente do valor de seus créditos".


Apesar da ênfase, com que a sustentam, da reiteração, com que a fazem, e do número de sequazes, que a professam, a resposta está errada.


Está errada por má interpretação literal do artigo 41, § 1º, da LRFE; está errada por má interpretação lógico-sistemática e teleológica dos artigos 38, 45, §2º, 83, § 1º, e 83, VI, c, da LRFE, que cuidam da forma de votação na assembléia geral de credores no processo de recuperação judicial; está errada, enfim, por má compreensão do sentido e do alcance da LRFE, como diligenciarei demonstrar.


O artigo 38, inspirado no princípio da proporcionalidade, formula a regra geral, ao prescrever que "o voto do credor será proporcional ao valor de seu crédito" quando estiver em pauta decidir sobre qualquer matéria submetida à assembléia geral, salvo, declara, textualmente, o artigo 38, "nas deliberações sobre o plano de recuperação judicial", em que se aplica o disposto no artigo 45, § 2º.


O artigo 45, § 2º, a seu turno, deixa claro que, "nas deliberações sobre o plano de recuperação judicial" "na classe prevista no inciso I do art. 41" (dos credores trabalhistas) "a proposta deverá ser aprovada pela maioria simples dos credores presentes, independente do valor de seu crédito", vale dizer, quando a deliberação da assembléia geral versar sobre o plano de recuperação, os credores trabalhistas votam por cabeça e não em função do valor de seus créditos.


Por conseguinte, quanto à forma de votação na assembléia geral de credores, a regra geral está no artigo 38 e a regra especial, no artigo 45, § 2º.


Vejamos agora o artigo 41, § 1º, da LRFE.


Para bem compreender o § 1º, do artigo 41, é indispensável atentar para (a) o artigo 83, I, que limita o privilégio dos créditos trabalhistas a 150 salários mínimos; (b) o artigo 83, VI, c, que declara que os créditos trabalhistas, que excedam 150 salários mínimos, passam à categoria de quirografários, e (c) o artigo 41, § 2º, que estabelece que os "credores com garantia real votam com a classe II até o limite do valor do bem gravado e com a classe III pelo restante do valor de seu crédito."


Bem interpretados os artigos 41, §§ 1º e 2º, e 83, I e VI, c, da LRFE, concluir-se-á que o § 1º, do artigo 41, visa evidenciar que, qualquer que seja o valor de seu crédito, ainda que superior a 150 salários mínimos, os credores trabalhistas votam sempre como integrantes da classe I, diferentemente dos credores com garantia real que, como assinalado, votam como integrantes da classe II até o limite do valor do bem dado em garantia e da classe III, pelo que exceder.


Sobre o assunto, no livro Comentários à LRFE, coordenado pelos ilustres PAULO TOLEDO e CARLOS HENRIQUE ABRÃO, ed. Saraiva, pág. 98, escrevi: "Embora 'os saldos dos créditos' trabalhistas 'que excederem 150 salários mínimos' sejam considerados quirografários (art. 83, VI, c), seus titulares permanecem votando como integrantes da classe I, visto que o artigo 41, 1º, não contém a ressalva que votarão com a classe III, conforme ocorre em relação aos credores com garantia real, que votam como integrantes da classe II, 'até o limite do valor do bem gravado' e com a classe III 'pelo restante do valor de seu crédito', na forma do art. 41, § 2º".


Em resumo, portanto (a) quando a deliberação for sobre qualquer outra matéria, o voto dos credores trabalhistas será proporcional ao valor de seus créditos; (b) quando a deliberação for sobre o plano de recuperação, os credores trabalhistas votam por cabeça; (c) o artigo 41, § 1º, apenas explicita que os credores trabalhistas votam sempre como integrantes da classe I, mesmo os que têm créditos superiores a 150 salários mínimos.


A idêntica conclusão chegou o eminente magistrado MANOEL JUSTINO BEZERRA FILHO, quando afirma, categórico:

"Aquele que pertence à classe dos créditos trabalhistas vota com o total do crédito do qual é titular. A Lei fez este esclarecimento, tendo em vista que para o pagamento dos credores trabalhistas há limitações em diversos pontos do texto (parágrafo único do art. 54, inciso I do art. 83), limitações que não influem na valoração do voto" (Nova Lei de Recuperação e Falências Comentada. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2005, 3a ed., p.123).

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*Doutor e Livre Docente em Direito Comercial pela UERJ






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