Em defesa do ensino e da formação jurídica
1. Introdução. 2. A Comissão de Ensino Jurídico da OAB. 3. A Advocacia diante da crise do ensino jurídico. 4. Soluções para a crise: a atuação das Subsecções da Ordem dos Advogados do Brasil. 5. Conclusão. 6. Bibliografia
sexta-feira, 14 de outubro de 2005
Atualizado em 30 de setembro de 2005 07:55
Em defesa do ensino e da formação jurídica
Carlos Roberto Faleiros Diniz*
1. Introdução. 2. A Comissão de Ensino Jurídico da OAB. 3. A Advocacia diante da crise do ensino jurídico. 4. Soluções para a crise: a atuação das Subsecções da Ordem dos Advogados do Brasil. 5. Conclusão. 6. Bibliografia
1. Introdução
Falar em crise no ensino e na formação jurídica significa dar início a uma calorosa discussão, que, além de advogados, juízes, promotores e professores de Direito, cartorários, serventuários de Justiça, envolve também outros profissionais da educação, posto que o assunto é de relevante interesse social. Em que pese a amplitude dessa discussão, o assunto interessa mais tangencialmente aos operadores do Direito, os quais se vêm chamados a refletir e a elaborar soluções para a crise que se instala na formação dos bacharéis.
À Ordem dos Advogados do Brasil, mais do que a qualquer outra instituição, a defesa do ensino jurídico interessa de maneira muito incisiva, principalmente por força das conseqüências que uma deficiente formação jurídica pode trazer às profissões jurídicas e à advocacia especificamente. Nesse sentido, o papel que a OAB tem a cumprir na defesa do ensino jurídico é de extrema importância.
José Eduardo FARIA, a seu turno, ressalta que a crise decorre do fato de os cursos jurídicos serem estruturados em "premissas ingênuas e idealistas, distanciada de uma realidade sócio-econômica explosiva, contraditória e conflituosa" (1996, p. 162). Este mesmo autor completa dizendo que:
Os cursos jurídicos perderam seus três papéis básicos, nos últimos trinta anos: o de transmissor de cultura humanística, de valores de natureza científica e de cultura profissional. Hoje, os cursos jurídicos limitam-se a expedir bacharéis com diplomas (1996, p. 163).
Também buscando diagnosticar a crise do ensino jurídico, Joaquim de Arruda FALCÃO destaca o caráter ensimesmado do ensino jurídico, que, ao invés de acompanhar as transformações da sociedade, fechou-se de maneira egocêntrica. Por este motivo, o ensino jurídico não consegue fornecer respostas à mais importante demanda da contemporaneidade: o acesso do cidadão à justiça (1996, p. 147 e ss.).
(...) transmissão do saber jurídico tem como paradigma epistemológico o normativismo-positivista, que procede de uma concepção autárquica do direito onde a ciência jurídica apresenta-se confinada dentro dos limites dogmáticos, e onde a dogmática jurídica, enquanto interpretação de normas - elaboração conceitual em torno de normas - representa o único sistema (...) que realmente reúne consistência científica no campo do conhecimento jurídico (MACHADO, 2000, p. 54).
Verificou-se também grave erro no que se refere ao método de transmissão desse conhecimento. Tal método unidisciplinar faz com que o estudante feche os olhos para a realidade social, econômica, social e cultural na qual está inserido e da qual não pode ser dissociado.
Ademais, constatou-se que esse modelo de transmissão do conhecimento jurídico descarta qualquer tipo de interdisciplinaridade que possa relacionar saber jurídico às estruturas de poder na sociedade, mediando a comunicação entre o contexto jurídico e o contexto sócio-histórico.
Esse ambiente cria uma atmosfera de insegurança e incerteza capaz de moldar as expectativas profissionais do recém formado. Buscando um porto seguro, o bacharel abandona o sonho de atuar na Advocacia e passa a preferir os concursos públicos. Segue-se daí o desprestígio de nossa profissão, alijada dos sonhos dos estudantes de Direito.
INSERÇÃO PROFISSIONAL DESEJADA | ||||
OPÇÃO |
UNIRIO |
CAMPOS |
UERJ |
PUC/RIO |
Concurso público |
76,9% |
70,3% |
47,9% |
50,7% |
Advocacia |
3,8% |
10,9% |
7,3% |
20,6% |
Diante desse quadro, percebe-se que a Advocacia está desvalorizada nos meios acadêmicos, representando a preferência, por exemplo, de apenas 3,8% dos alunos matriculados na UNIRIO.
A causa, como dissemos, é complexa e está ligada à insegurança que a profissão oferece para os que desejam integrar seus quadros. Numa realidade mutável, que exacerba em leis e outras espécies normativas como é o caso da brasileira, torna-se muito mais cômodo recorrer a profissões que garantam estabilidade financeira e empregatícia, do que desafiar o universo da Advocacia, ainda que, para muitos, esta profissão represente a realização pessoal e profissional. É preciso considerar ainda que os concursos públicos são barreiras intransponíveis para larga parcela dos que sonham tornar-se funcionários públicos. Em grande parte dos casos, após serem derrotados várias vezes pelas provas e por falta de opção, inúmeros bacharéis acabam inscrevendo-se nos quadros da Ordem e exercendo a Advocacia contra sua própria vontade. Daí existirem muitos advogados não vocacionados e frustrados com sua profissão.
Essas são apenas algumas dentre as muitas formas de atuação que poderiam ser descobertas com o desenvolvimento da relação entre OAB, Faculdades de Direito e estudantes. As Subseções não podem se negar a funcionar como instrumento de ação direta da Ordem dos Advogados do Brasil junto às instituições de ensino jurídico. Essa é uma de suas mais relevantes missões diante do processo de mercantilização da Advocacia e da decadência por que tem passado o ensino jurídico.
Ademais, projetos que envolvam a participação de estudantes junto à comunidade e que estimulem atividades de extensão devem ser apresentados e defendidos pelas Subsecções diante das instituições de ensino, de modo que o estudante aprenda, logo no início de seu curso, a se aproximar das situações concretas da vida, e também a fazer leituras críticas a respeito do Direito e de seus métodos, de modo que o jurista seja capaz, também, de modificar sua realidade.
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6. Bibliografia
AGUIAR, Roberto A. R. de. A crise da advocacia no Brasil: diagnóstico e perspectivas. 3ªed. São Paulo: Alfa-Omega, 1999.
FARIA, José Eduardo. Ensino jurídico.
ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. CONSELHO FEDERAL. OAB ensino jurídico: diagnóstico, perspectivas e propostas. 2ª ed. Brasília: Conselho Federal da OAB, 1996.
GARÇON, Maurice. O advogado e a moral. Tradução de Antônio de Souza Madeira Pinto. Coimbra: Armênio Amado, 1963.
JUNQUEIRA, Eliana Botelho. Faculdades de Direito ou fábricas de ilusões? Rio de Janeiro: IDES: Letra Capital, 1999.
MACHADO, Antônio Alberto. Ministério Público: democracia e ensino jurídico. Belo Horizonte: Del Rey, 2000.
MELO FILHO, Álvaro. Inovações no Ensino Jurídico e no Exame de Ordem. Doutrina, Legislação, Modelos e Portarias. Belo Horizonte: Del Rey, 1996.
MOTTA, Elias de Oliveira. Direito Educacional e educação no século XXI: com comentários à nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília: Unesco, 1997.
NALINI, José Roberto. O Futuro das Profissões Jurídicas. São Paulo: Oliveira Mendes, 1998.
OAB Ensino Jurídico. Diagnóstico, Perspectivas e Propostas. 2ª edição. Brasília/DF: Conselho Federal da OAB, 1996.
OAB Ensino Jurídico. Balanço de uma Experiência. Brasília/DF: Conselho Federal da OAB, 2000.
OAB Ensino Jurídico. Parâmetros para Elevação de Qualidade e Avaliação. 2ª edição. Brasília/DF: Conselho Federal da OAB, 1996.
OAB Recomenda: Um Retrato dos Cursos Jurídicos. Brasília/DF: Ordem dos Advogados do Brasil/Conselho Federal, 2001.
XV Conferência Nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, 04 a 08 de setembro de 1994. São Paulo. Anais. São Paulo: JBA Comunicações, 1995.
RAMOS, Gisela Gondin. Estatuto da Advocacia: comentários e jurisprudência selecionada. 3ª edição. Florianópolis: Ordem dos Advogados do Brasil/Secção de Santa Catarina, 2001.
WARAT, Luis Alberto. CUNHA, Rosa Maria Cardoso da. Ensino e saber jurídico. Rio de Janeiro: Eldorado, 1977.
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*Advogado em Franca/SP e Ex-Conselheiro Seccional da OAB/SP, Ex-Presidente da 13ª Subsecção da OAB/SP e Presidente da Associação dos Advogados de Franca/SP.
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