O Brasil e seu problema único
A falta de educação é a verdadeira chaga do país. E não é a educação da sala de aula, mas sim a do berço.
quinta-feira, 28 de junho de 2012
Atualizado em 27 de junho de 2012 16:37
É histórico e cultural nosso hábito de discutir os problemas do Brasil, ora vislumbrando soluções, ainda que na roda do happy-hour, ora pondo toda a culpa no Governo, o que também é da nossa índole.
Ocorre que, nessa discussão, são muitos os pontos da pauta, mas raras as vezes em que, de fato, identificamos o mal inicial: a falta de educação.
Sim, é a falta de educação a chaga verdadeira do Brasil. É ela que faz alguns indivíduos abrirem a janela do carro e jogar o lixo na via, é ela que faz alguns pais deixarem o filho desrespeitar o professor e emprestar sem devolver a caneta de um colega, é ela que causa brigas em festas, que acabam na delegacia. Da sujeira na rua ao crime hediondo, a diferença é só o tamanho, mas tudo é falta de educação, simples assim. E por ser tão simples, temos dificuldade de enfrentar, porque somos programados para operar máquinas complexas, controles em idiomas estrangeiros, sistemas sensíveis, mas não o básico.
Pessoalmente, fico observando a comunidade onde vivo e prevendo as desgraças que, embora quase não aconteçam, porque Deus é grande, teriam espaço se a lógica se operasse. No pequeno mundo da escola da minha filha, de classe média alta, gente bem arrumada, com curso superior e cada qual mostrando um carro mais superior ainda, o estacionamento sozinho já é palco de horrores.
Noutro dia, chovendo muito (porque a natureza é a mesma prá todos), um tutor (não cheguei a ver se era um pai ou uma mãe) investido dos poderes que a roupa de grife e o carro importado conferem às cabeças pequenas, optou por deixar seu rebento mais perto da porta, prá ele não se molhar, bem em cima da faixa de segurança, no meio da rua, para que todas as outras pessoas tivessem que enfiar o pé na poça, já que ele tinha ocupado o único espaço livre de água.
Outro tutor, tomado pela raiva que a injustiça causa, bateu com a mão no carro e gritou "olha a faixa", o que, aliás, é o que vem sendo veiculado até na TV. O primeiro pôs a cabeça prá fora, porque aí valia a pena se molhar, e gritou um palavrão. O outro ameaçou voltar prá chutar a porta. Um terceiro felizmente aplacou os ânimos de todos. Se não fosse por esse, poderia ter havido agressão física, quiçá até o disparo de uma arma e uma tragédia. Não era falta de dinheiro, de espaço, de organização. Era falta de educação, lá do começo.
No outro pólo, vi no telejornal uma matéria sobre crianças se agredindo verbal e fisicamente, em escolas públicas espalhadas pelo país. Essas não tinham exatamente bens materiais para disputar, mas se estapeavam por que uma chamou a outra de gorda, e isso hoje em dia é bullying, então dá o direito de esbofetear a cara da primeira, e os pais vêm defender, e cada um acha que tem mais direito do que o outro e vira tudo uma bagunça porque ninguém sabe o certo. Porque a esses também falta a educação conceitual, fundamental, de como é a vida em comunidade e como são as regras da convivência.
E com apenas dois resumidos exemplos, já fica fácil demonstrar que não adianta passar aos nossos filhos os nossos iPads, Blackberries, Guccis e domínio do inglês e do espanhol. Se não dermos a eles a educação basilar, aquela que mostra onde é a lixeira e onde é proibido estacionar, que explica como usar "por favor" e "obrigada" e que equaliza direito e obrigação, a vida de todos, ricos e pobres, negros e brancos, gordos e magros, crianças e adultos, vai virar um inferno. Mais.
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* Luciana Gualda é diretora jurídica do Laboratório Aché e membro do Jurídico de Saias
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