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Aproveitamento e transferência de créditos acumulados de ICMS na exportação de mercadorias

As operações de exportação de mercadorias, nos termos do artigo 155, parágrafo 2º, inciso X, alínea "a", da Constituição Federal de 1988 ("CF/88"), são imunes ao pagamento do Imposto Sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação ("ICMS"), razão pela qual, muitas sociedades, na consecução de suas atividades, vêm acumulando créditos de ICMS relativos à aquisição de insumos utilizados em seus processos de industrialização de produtos a serem exportados.

quarta-feira, 31 de agosto de 2005

Atualizado em 30 de agosto de 2005 09:22

Aproveitamento e transferência de créditos acumulados de ICMS na exportação de mercadorias.


Tércio Chiavassa*


Diego Caldas R. de Simone*


As operações de exportação de mercadorias, nos termos do artigo 155, parágrafo 2º, inciso X, alínea "a", da Constituição Federal de 1988 ("CF/88"), são imunes ao pagamento do Imposto Sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação ("ICMS"), razão pela qual, muitas sociedades, na consecução de suas atividades, vêm acumulando créditos de ICMS relativos à aquisição de insumos utilizados em seus processos de industrialização de produtos a serem exportados.


Tais créditos, nos termos do artigo 25, § 1º, inciso II, da Lei Complementar nº 87, de 13.9.1996 ("LC nº 87/96"), podem ser transferidos pelo sujeito passivo a outros contribuintes do mesmo Estado, mediante a emissão, pela autoridade estadual competente, de documento que reconheça o crédito.


No entanto, embora a Constituição expressamente reconheça o direito à manutenção e ao aproveitamento desses créditos de ICMS acumulados, como forma de desonerar a carga tributária nas exportações, diversos Estados - ao arrepio das disposições constitucionais e da legislação de regência - impõem restrições ao aproveitamento desses créditos, notadamente no que se refere à possibilidade de sua transferência a outros contribuintes, o que compromete a eficácia do dispositivo constitucional ratificado pelo legislador complementar.


Muitos contribuintes, em razão do grande volume de exportações realizadas, que superam em muito às operações tributadas e aptas a absorverem o valor dos créditos acumulados apurados mensalmente em suas escritas fiscais, vêem frustrados - de maneira absolutamente inconstitucional e ilegal - o seu legítimo intuito de transferir seus créditos acumulados de ICMS decorrentes da exportação de mercadorias.


Exportação de mercadorias - Crédito acumulado de ICMS - Impossibilidade de sua restrição.


A par da possibilidade constitucionalmente garantida de manutenção e aproveitamento dos saldos credores de ICMS acumulados em decorrência da exportação de mercadorias, a LC nº 87/96 determina, em seu artigo 25, § 1º, que os saldos credores de ICMS acumulados por estabelecimentos exportadores podem ser, na proporção que estas saídas representem do total das saídas realizadas pelo estabelecimento: (i) imputados pelo sujeito passivo a qualquer estabelecimento seu no Estado; e (ii) havendo saldo remanescente, transferidos pelo sujeito passivo a outros contribuintes do mesmo Estado, mediante a emissão pela autoridade competente de documento que reconheça o crédito.


Existem duas hipóteses distintas e inconfundíveis em relação ao aproveitamento dos créditos acumulados de ICMS: (i) outros saldos credores, previstos na legislação estadual (artigo 25, § 2º, da LC nº 87/96) e (ii) os créditos acumulados em relação às operações de exportação de mercadorias para o exterior (artigo 25, § 1º, da LC nº 87/96).


No primeiro caso -- outros saldos credores, conforme indicada no artigo 25, § 2º, da LC nº 87/96 -- é dado ao legislador estadual a prerrogativa de, dentro dos limites estabelecidos, definir as condições para eventuais transferências de créditos acumulados de ICMS. Isto porque, se o crédito se acumulou porque o Estado concedeu uma isenção ou previu uma alíquota diferenciada mais baixa, por exemplo, deve caber ao próprio Estado o juízo quanto à conveniência e oportunidade de ocorrer a respectiva transferência.


Situação diversa, contudo, é a segunda hipótese, referente aos créditos acumulados em relação às operações de exportação.Aqui, afigura-se evidente a auto-aplicabilidade do artigo 25, § 1º, da LC 87/96, não sendo dado ao legislador ou às autoridades fiscais estaduais a imposição de qualquer restrição ao aproveitamento dos créditos do ICMS advindos de exportação de mercadorias.


Nesta situação, não há espaço para a lei ou regulamento estadual e muito menos para as autoridades fiscais disporem sobre a conveniência ou oportunidade da transferência, uma vez que a disciplina concernente à transferência dos créditos originados em razão da exportação de mercadorias já está diretamente regulada pela LC nº 87/96. Em outras palavras, o direito de transferir saldo credor de ICMS decorrente de exportações origina-se diretamente da LC nº 87/96, sem qualquer interferência da vontade do Estado.


A única exigência para que a transferência seja realizada é a emissão pela autoridade competente de "documento que reconheça o crédito", mero ato formal de reconhecimento de situação fática, ou seja, mero reconhecimento da efetiva realização das exportações que originaram o crédito acumulado que se pretende transferir, não envolvendo manifestação de vontade do Estado que restrinja o direito a esse aproveitamento. A função das autoridades fiscais, neste particular, é simplesmente afirmar a existência e o montante do crédito acumulado em relação às operações.


Nesse sentido, vale conferir julgado do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, no ROMS nº 13.544, que decidiu pela impossibilidade de restrições da legislação estadual ao direito de aproveitamento dos créditos acumulados de ICMS em decorrência de operações de exportação, bem como pela possibilidade de sua transferência

"TRIBUTÁRIO - ICMS - CRÉDITOS ACUMULADOS - TRANSFERÊNCIA A TERCEIROS(CF/88, ART. 155, § 2º, XII e ART. 25, § 1º, II, LC 87/96)

1. O legislador constitucional estabeleceu hipótese de transferência de crédito acumulado, mas delegou à lei complementar a disciplina desta imunidade ou isenção heterônoma.

2. A LC 87/96 estabeleceu no art. 25 duas hipóteses de transferência de crédito acumulado do ICMS. No § 1º, os créditos oriundos de operações de exploração de matéria-prima ou produtos industrializados, como previsto no art. 3º inciso II. No § 2º, delegou ao legislador estadual a escolha das hipóteses, quando pretendesse o contribuinte transferir o seu crédito a terceiro.

3. Hipótese dos autos em que a transferência a terceiros refere-se a créditos oriundos de operações disciplinadas no art. 3º, II, da LC 87/96.4. Recurso provido.

"

É importante transcrever ainda, trecho do voto da Ministra ELIANA CALMON, relatora do ROMS cuja ementa encontra-se transcrita no item anterior:

"Pelo texto, não é dado ao legislador estadual qualquer vedação ao aproveitamento dos créditos de ICMS, sob pena de infringir o princípio da não-cumulatividade, quando este aproveitamento se fizer em benefício de qualquer outro estabelecimento seu, no mesmo Estado, ou de terceiras pessoas, observando-se para tanto a origem no art. 3º. É exatamente esta última a hipótese dos autos, porque a empresa objetiva transferir os créditos acumulados para terceiros.Parece que o Tribunal a quo, ao examinar a querela, olvidou o § 1º e partiu para a interpretação da hipótese do inciso II do § 2º do art. 25 da LC 87/96, o qual não tem aplicação à espécie.Assim sendo, concluo que têm as recorrentes inteira razão, quando afirmam o equívoco do Tribunal na interpretação do texto pertinente com o pedido, o que lhes garante, sem nenhuma legislação estadual, obter a declaração de crédito de que fala o inciso II, § 1º, da Lei Complementar 87/96, razão pela qual dou provimento ao recurso para conceder a segurança nos termos pedidos." (destaque nosso)

Na mesma linha, o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA recentemente ratificou o posicionamento exarado no julgado transcrito acima, conforme se depreende do julgamento do RMS 13.969 (DJ 4.4.2005):


"TRIBUTÁRIO. ICMS. CRÉDITOS ACUMULADOS DE ICMS SOBRE MATÉRIA-PRIMA DESTINADA A EXPORTAÇÃO. TRANSFERÊNCIA A TERCEIROS. AUTO-APLICABILIDADE ART. 25, § 1º,

I, LC 87/96I - 'A LC 87/96 estabeleceu no art. 25 duas hipóteses de transferência de crédito acumulado do ICMS. No § 1º, os créditos oriundos de exploração de matéria-prima ou produtos industrializados, como previsto no art. 3º inciso

II. No § 2º, delegou ao legislador estadual a escolha das hipóteses, quando pretendesse o contribuinte transferir o seu crédito a terceiro' (RMS nº 13.544, Rel. Min. ELIANA CALMON, DJ de 02/06/2003, p. 229).II - Tratando-se a hipótese dos autos da espécie do art. 3º, II, da LC nº 87/96, vez que se trata de exportação de madeira, é de se dar provimento ao recurso ordinário."


Ademais, é importante notar que, também recentemente, o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL concedeu medida liminar nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade ("ADI") 3390, ajuizada pela Confederação Nacional da Indústria, suspendendo a eficácia do Decreto nº 4.482, de 28.12.2004, do Estado do Rio de Janeiro ("Decreto nº 4.482/04"), que impunha restrições ao aproveitamento e à utilização de créditos de ICMS decorrentes de exportação.


A Constituição explicitamente reconhece o direito à manutenção e aproveitamento dos créditos de ICMS acumulados em decorrência da exportação de mercadorias (artigo 155, parágrafo 2º, inciso X, alínea "a" da CF/88) e a LC nº 87/96 garante a possibilidade de transferência desses créditos sem qualquer restrição por parte da legislação estadual ou das autoridades fiscais (artigo 25, § 1º, II, LC nº 87/96). Portanto, não há como se furtar à conclusão de que qualquer restrição nesse sentido acaba por restringir -- ilegal e inconstitucionalmente -- o direito de aproveitamento desses créditos.


Conclusões


Ante todo o exposto, podemos concluir que não é permitido às Autoridades Fiscais Estaduais restringirem o aproveitamento dos créditos de ICMS acumulados em decorrência da exportação de mercadorias, bem como a sua transferência, seja para estabelecimentos do mesmo titular ou estabelecimentos interdependentes, seja para o pagamento de fornecedores ou mesmo para terceiros. Qualquer restrição nesse sentido acaba por restringir -- ilegal e inconstitucionalmente -- o direito de aproveitamento e transferência desses créditos.

Persistindo tais restrições, é cabível medida judicial, com muito bons argumentos para sustentar judicialmente a ilegalidade e inconstitucionalidade das legislações estaduais, para afastar eventuais restrições e permitir a utilização e a transferência dos créditos acumulados
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*Advogados do escritório Pinheiro Neto Advogados

*Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

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