Defensoria pública: cidadania na Constituição
E é de uma boa organização e funcionamento dos serviços da Defensoria Pública que teremos um resultado envolvido em uma contribuição inestimável à administração e democratização da Justiça do nosso país.
terça-feira, 13 de março de 2012
Atualizado em 12 de março de 2012 14:54
Megbel Abdalla Ribeiro Ferreira
Defensoria Pública: cidadania na Constituição
É de Pontes de Miranda de quem colhemos a lição de que "Assistência Judiciária e benefício da justiça gratuita não são a mesma coisa. O benefício da justiça gratuita é direito à dispensa provisória de despesas, exercível em relação jurídica processual, perante o juiz que promete a prestação jurisdicional. É instituto de direito pré-processual. A Assistência Judiciária é organização estatal, ou paraestatal, que tem por fim, ao lado da dispensa provisória das despesas, a indicação de advogado. É instituto de direito administrativo".
Das funções essenciais à Justiça destaca-se a instituição da Defensoria Pública, que o Legislador Constituinte estabeleceu nos dispositivos do art. 134, do Texto Constitucional em vigor, como órgão do Estado incumbido da orientação jurídica e da defesa, em todos os graus, dos direitos daqueles que são juridicamente necessitados.
A Defensoria Pública, como instrumento de ação democrática essencial à administração da justiça, sendo órgão que tem a missão constitucional de atuar em favor de grande parcela da sociedade porque entra neste contexto para defender a ordem jurídica, a exata aplicação da lei, tendo por objeto, como instrumento, o cidadão, criminoso ou não, cuja defesa retrata o interesse público, é instituição destinada a marcar, neste século, caminhos que levam à cidadania plena, porquanto realiza uma das muitas funções do Estado, quando presta assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos.
E é de uma boa organização e funcionamento dos serviços da Defensoria Pública que teremos um resultado envolvido em uma contribuição inestimável à administração e democratização da Justiça do nosso País.
O Eminente Ministro José Néri da Silveira, do Supremo Tribunal Federal, em palestra proferida em Corumbá, no IV Seminário sobre Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul, dizia que "árdua é a missão do Defensor Público; frustrante, por vez, pela precariedade de condições do assistido, para a obtenção dos meios de prova indicados à causa. Não menos exato é, entretanto, que vale a pena suavizar, com competência e com carinho, a aflição dos que nada possuem, e muito sofrem; dar o amparo da lei e da justiça aos que não podem, embora queiram lutar por seus direitos; trazer a paz e a esperança ao coração dos que se desajustam ou se desesperam, por não conhecer os seus direitos; mostrar, enfim, aos pobres e humildes, que a Pátria também lhes pertence, garantindo-lhes a igualdade na salvaguarda de seus direitos, da liberdade, da honra e na conquista de seus legítimos desejos de participar dos benefícios sociais e realizar as prerrogativas de sua cidadania. Certamente, sempre é bom dar pétalas d'alma a suavizarem, um pouco, a vida dos que, sem culpa e sem sandália, caminham por estradas de espinhos".
Sabemos que o exercício pleno da cidadania é o modo mais legítimo e eficaz de limitação do Poder Estatal. E, daí vem a advertência das palavras de Montesquieu em que "a liberdade política somente existe nos governos moderados. Mas nem sempre ela existe nos governos moderados. Só existe quando não se abusa do poder, mas é uma experiência eterna que todo homem que detém o poder é levado a dele abusar: e vai até onde encontra limites. Quem o diria? A própria virtude precisa de limites. Para que não se abuse do poder é necessário que pela disposição das coisas o poder limite o poder".
Seguindo as pegadas de Aristóteles vamos encontrar a milenar expressão de que o homem é um animal político, é um ser social. Hobbes também concorda com esta assertiva. Acontece que é da natureza do homem ser social. O homem é social por destinação e não por convenção. Essa é a sua dita. Por isso, o cidadão é forjado politicamente, não administrativamente. O cidadão é um conceito político, não é propriamente um conceito administrativo.
Então, a cidadania, nessa perspectiva não é algo que vem da natureza ou da convenção. A cidadania tem que ser construída na medida em que as condições sociais também são construídas. A cidadania é a expressão da vontade política do indivíduo, tanto para a constituição e desenvolvimento como para a contenção do poder público. Seu exercício exige, sempre, comportamento ativo.
A cidadania, como a modelou a vigente Carta Política, que já se mantém por mais duas décadas, constitui um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, ao lado da soberania estatal, do pluralismo político, do respeito à dignidade da pessoa humana e dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa.
Em sua natural acepção, a cidadania, se manifesta nesse maravilhoso universo do Estado Democrático de Direito, em a soberania popular que é exercida pelos representantes eleitos pelo povo, no cumprimento da lei que é legitimamente editada pelo Congresso Nacional, no acesso ao Poder Judiciário, seja em defesa de direitos privados, seja em defesa do interesse da coletividade, através de pronunciamentos públicos, de manifestações populares pacíficas.
A Defensoria Pública e a cidadania, em mais de duas décadas da Constituição Cidadã, desaguam naturalmente em a Justiça e a Paz Social. Esta terceira observação só depende de nós, da nossa boa vontade, do nosso esforço intelectual e físico, de grupo e de classe. Esta terceira reflexão deve ser recebida, elaborada e praticada por todos nós que fazemos a Ordem dos Advogados do Brasil, O Ministério Público, as Procuradorias do Estado e do Município, o Poder Judiciário, enfim, o conjunto de todos os cultores do Direito para, unidos, buscarmos uma sociedade mais justa, onde as desigualdades sejam reduzidas a proporções mínimas, a justiça se faça para todos e a paz social seja realmente alcançada. Todos devem contribuir para a realização da justiça e da paz social e, para repetir as palavras de Víctor Hugo, "Se vocês forem mil, eu serei um deles; se vocês forem cem, eu estarei entre eles; se forem dez, vocês me verão entre eles; e se for apenas um, eu serei ele".
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* Megbel Abdalla Ribeiro Ferreira é advogado, membro da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB-MA, membro efetivo do IBDP - Instituto Brasileiro de Direito Processual e associado ao IBCCRIM - Instituto Brasileiro de Ciências Criminais