Direito dos empregadores
Embora compostos de brilhantes juristas e magistrados do melhor nível intelectual, moral e jurídico, anteriormente, o TST e os tribunais trabalhistas sofriam a influência de juízes classistas, muitas vezes sem qualquer conhecimento jurídico.
segunda-feira, 5 de março de 2012
Atualizado às 11:28
José Alberto Couto Maciel
Direito dos empregadores
O direito substantivo do trabalho sempre teve como objetivo a defesa do trabalhador, economicamente o mais fraco na relação de emprego, garantindo a ele os direitos sociais, criados através da legislação trabalhista e das convenções e acordos coletivos, que têm a função principal de estabelecer condições de trabalho e suprir o vácuo da lei , cuja elaboração não acompanha a evolução do trabalho no país.
O direito processual do trabalho, porém, ao contrário, nunca objetivou a concessão de direitos aos empregados, como se ao magistrado coubesse distribuir os lucros das empresas mediante decisões judiciais ideológicas, porque a proteção do trabalhador decorreu sempre da lei e não da Justiça.
Exatamente por essas razões é que existem os Tribunais Trabalhistas, uma Justiça especializada que aplica a lei protetora de uma das partes, mas de acordo com os ditames desta mesma lei, imparcialmente, e, por isso mesmo, essa Justiça passou a ser composta de Juízes togados, composição essa que passou a existir após a extinção dos juízes classistas, mediante a Emenda Constitucional n. 24, de 09 de dezembro de 1999.
Anteriormente, porém, os Tribunais trabalhistas, e, em especial, o Tribunal Superior do Trabalho, e sendo este que retrata a realidade nacional da jurisprudência, sobre ele é que gostaria de refletir neste artigo, embora compostos de brilhantes juristas e magistrados do melhor nível intelectual, moral e jurídico, sofriam em seus julgados a influência de juízes classistas, muitas vezes sem qualquer conhecimento jurídico, determinando um número elevado de decisões baseadas mais na ideologia do que no próprio direito vigente.
Tive a oportunidade de acompanhar o Tribunal Superior do Trabalho, desde sua inauguração em Brasília, quando defendi, na primeira seção do Pleno, um processo em que se discutia a existência de transferência de empregado, quando o trabalhador era transferido de uma agência do Banco da cidade de São Paulo para Guarulhos, pois defendia o brilhante advogado adverso, Octávio Bueno Magano, que não se tratava de transferência uma vez que Guarulhos se encontrava dentro do que poderíamos considerar a grande São Paulo.
Desde aquela época até os dias de hoje, continuo sustentando oralmente no Tribunal Superior do Trabalho, bem como atuando com recursos em todas as Turmas e Seções, daí entender que posso, efetivamente, fazer a análise que agora me proponho.
O Tribunal Superior do Trabalho, com a atuação dos classistas e com uma composição de Ministros togados, muitos de carreira, vindos dos Regionais, e que ainda não tinham o entendimento de que estavam em um Tribunal que unificava para o país teses de direito, não ingressando nos fatos, começou a ter uma característica de maior proteção ao trabalhador, sendo que, a partir de 1986, tal fato passou a ser de conhecimento nacional, daí projetos e uma voz corrente, inclusive na doutrina, no sentido de que essa Corte superior trabalhista deveria ser extinta, criando-se uma câmara junto ao antigo Tribunal Federal de Recursos (atual Superior Tribunal de Justiça), para julgar os conflitos trabalhistas relativos às questões de direito.
Abro um parênteses para evidenciar o destaque da figura do Ministro Marcelo Pimentel, Presidente do
TST de 1986 a 1988, que usou de todo seu prestígio e conseguiu demonstrar a relevância do Tribunal para o país e o entendimento de que o que estava havendo era apenas uma fase diversificada da jurisprudência.
Em certo momento, e de acordo com o Presidente Pimentel, foi feito um jantar em minha residência, onde estiveram presentes Senadores, Deputados, Magistrados e o próprio Presidente da República interino na época, quando então, em discurso memorável, o Ministro Marcelo Pimentel conseguiu apaziguar os que pretendiam a extinção do TST, e dar ênfase à relevância desta Suprema Corte Trabalhista..
De lá para cá, com a saída dos classistas, formou-se o Tribunal Superior do Trabalho com Juízes de brilhantes trajetórias, e de saudosa atuação. Magistrados como Coqueijo Costa, Russomano, Thélio da Costa Monteiro, (antes Sussekind, Délio Maranhão e Tostes Malta), Carlos Alberto Barata e Silva, Luiz José Guimarães Falcão, Biságlia, Vieira de Mello, Marco Aurélio Prates de Macedo, Marco Aurélio hoje brilhando no STF, Lima Teixeira, Raimundo Souza Moura, Renato Machado, e muitos outros que deram grandeza a essa Corte.
Outros continuam esses momentos de grandeza como os atuais integrantes da Corte e a diretoria formada pelo brilhante Presidente Dalazen, Vice, Cristina Peduzzi e Corregedor, o notável Ministro Levenhagen.
Acontece que, e já vem de algum tempo, houve uma amplitude de processos a alcançar a Corte Superior, processos especialmente vindos de órgãos diretos ou indiretos do Governo, processos com teses repetidas de empresas, processos com milhares de petições de sindicatos profissionais, processos em que os empregados, como nada pagam para ingressar com uma reclamação, nem honorários nem custas, pedem o absurdo para receber uma pequena parte, ou alcançar uma revelia, enfim, processos que demonstram a inabilidade do Congresso Nacional em legislar no sentido de reduzir essa carga que passou a atravancar nossos Tribunais trabalhistas, bem como acontece com outros Tribunais do país.
E frente à inércia do Congresso Nacional, o que fizeram os magistrados, como se vê no Tribunal Superior do Trabalho?
Começaram a limitar o direito procurado pelas partes através de medidas judiciais, não decorrentes da lei, mas jurisprudenciais, como a exigência do prequestionamento, o não conhecimento dos recursos por detalhes ínfimos, a não admissão das revistas e o julgamento dos agravos mediante planilhas, quando são julgadas centenas em uma só decisão plural,
a limitação dos embargos no TST a divergências específicas, a transcendência, (ainda não aplicada), as multas, bem como decisões que deveriam ser colegiadas, por despachos individuais, súmulas, orientações jurisprudenciais e outros artifícios a fim de, certamente, reduzir o volume de processos em seus gabinetes, omitindo-se, porém, em teses das mais relevantes, em meio a essa enxurrada de processos em tramitação.
Mas não é só isso. O Conselho Nacional de Justiça passou a cobrar dos Ministros, como se os processos fossem mercadorias, um determinado número de julgamentos por ano, obrigando aos magistrados a atuar como estatísticos e fiscais do volume processual a ser julgado, além da função para a qual foram nomeados que é a de julgar.
O Tribunal Superior do Trabalho, após algum tempo aplicando essas medidas restritivas nos recursos, rapidamente alcançou a uma celeridade tal, que sua Seção de Dissídios Individuais quase não tem processos para elaborar a pauta semanal de julgamento, e, em pouco tempo, talvez tenha essa pauta de ser quinzenal.
Da mesma forma, acontecerá com as Turmas , sendo que, uma das maiores conseqüências, ao meu ver nefasta, é a de que, não havendo conhecimento dos recursos de revista no Tribunal que unifica a jurisprudência para o país, unificada ficará a jurisprudência a nível dos Tribunais regionais, regionalizando-se o Direito do Trabalho que é federal.
Mas é de se notar que, a maioria dos recursos são originária de empresas, ou em razão das súmulas e OJs compostas em defesa do social, ou em decorrência do próprio entendimento de alguns magistrados que, à luz de seus conhecimentos de primeiro grau, sentiram a necessidade de equilibrar os benefícios dos trabalhadores com o ganho das empresas, principalmente nas instâncias ordinárias.
Ora, se não há um equilíbrio de forças, aplicando-se o social sobre o direito e se, na maioria, os recursos não são conhecidos, e restritos a uma não apreciação de teses jurídicas pela Suprema Corte Trabalhista, ficam mantidas as decisões regionais, criando-se uma jurisprudência favorável aos trabalhadores, como, aliás, pode se constatar da redação das inúmeras súmulas e OJs do Tribunal Superior do Trabalho e dos Tribunais Regionais do Trabalho.
Certamente que os empregadores não são anjos, e que merecem a condenação a eles impostas quando agem de forma contrária à lei, mas se recorrem porque a lei lhes dá esse direito, e se em seus recursos há, em muitos casos, condenações ilegais a ser reparadas, não é crível que não possam ter uma defesa que a todos igualmente é concedida pela Constituição Federal.
Por outro lado, se a reforma para acelerar processos continuar a ser feita desse modo, podando os recursos e seus julgamentos, pensando em exagero máximo, a melhor reforma era não existir mais processos, ou seja, extinguir-se o Tribunal, ou será que voltaremos à velha idéia de transformação do TST em câmara do Superior Tribunal de Justiça?
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* José Alberto Couto Maciel é advogado da banca Advocacia Maciel e membro da Academia Nacional de Direito do Trabalho
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