O Direito Societário no Brasil
Durante muitos anos as mazelas de nossa economia impediram o crescimento sustentado do país. A combinação de alto déficit fiscal do Estado, taxas de juros sempre crescentes (que estimulam a utilização da pequena poupança interna para a compra de títulos do governo), taxas de inflação altas e pequenos surtos de crescimento econômico, seguidos de períodos de retração da economia, afastava o investimento privado e impedia o desenvolvimento do mercado de capitais.
quinta-feira, 11 de agosto de 2005
Atualizado às 07:49
O Direito Societário no Brasil
Luiz Leonardo Cantidiano*
Durante muitos anos as mazelas de nossa economia impediram o crescimento sustentado do país. A combinação de alto déficit fiscal do Estado, taxas de juros sempre crescentes (que estimulam a utilização da pequena poupança interna para a compra de títulos do governo), taxas de inflação altas e pequenos surtos de crescimento econômico, seguidos de períodos de retração da economia, afastava o investimento privado e impedia o desenvolvimento do mercado de capitais. Após o período que se seguiu à implementação do plano de estabilização econômica, o mercado de capitais interno teve um alento, até mesmo por força da flexibilização das regras sobre investimentos externos em nosso país. As dificuldades que foram enfrentadas depois de nos defrontarmos com algumas crises externas, em conjunto com a percepção, pelos investidores, de que o sistema legal vigente lhes assegurava reduzida proteção, impediu que o mercado pudesse continuar crescendo. Esse quadro foi agravado pelo incremento do custo fiscal, especialmente pela incidência nas operações internas de CPMF. Tudo isso levou a uma enorme retração do nosso mercado de capitais, especialmente o mercado de ações.
Quando assumi a presidência da CVM estava plenamente consciente de que era necessário alterar com urgência esse quadro, sob pena de não conseguirmos fazer com que a economia pudesse voltar a crescer de forma organizada.
O país necessitava, com urgência, desenvolver os mercados primário e secundário de valores mobiliários, de modo a permitir que o investidor estivesse estimulado a direcionar sua poupança à subscrição de novos valores mobiliários de emissão das companhias abertas, certo de que, quando necessário ou desejável, teria liquidez para desfazer-se do investimento realizado.
Focado nessa linha de atuação é que a Comissão de Valores Mobiliários tem procurado, ao longo dos últimos tempos, modernizar o ambiente regulatório de nosso mercado, deixando-o apto a possibilitar sua ampla utilização no financiamento da atividade produtiva em nosso país. Durante os quase dois anos de minha gestão, com o apoio inestimável do competente quadro técnico da CVM, nos dispusemos a criar um ambiente regulatório moderno que dê, aos agentes econômicos, condições de acessar o mercado de forma mais ágil e menos onerosa.
Além de ter havido recente alteração da lei societária, com a concessão de mais e melhores direitos aos investidores (Lei nº 10.303/01), também fora alterada a lei que regula a atividade da CVM, com a outorga a seus dirigentes, depois de aprovados pelo Senado Federal, de um mandato fixo.
A CVM, ao longo dos últimos anos, reformulou a regulamentação aplicável às sociedades por ações e ao mercado de valores mobiliários, cumprindo destacar as instruções que tratam (a) da divulgação de informações e da política de negociação de valores mobiliários por pessoas que tenham acesso a tais informações, (b) da realização de ofertas públicas de compra de ações, sejam voluntárias, sejam obrigatórias, (c) da atuação do formador de mercado, (d) da oferta pública, nos mercados primário e secundário, de valores mobiliários, (e) de emissão pública de debêntures padronizadas, (f) de exercício da atividade de analista de valores mobiliários, (g) de criação de fundos de investimento em participação (private equity), (h) de fundos de investimento de direitos creditórios, (i) de fundos de investimento e (j) de consolidação, pelas companhias abertas, de demonstrações elaboradas por sociedades de propósito especial.
Esforço adicional está sendo feito, no Congresso Nacional, para modernizar a legislação no que diz respeito à elaboração e divulgação de demonstrações financeiras. Segundo projeto elaborado pela CVM, que está sendo debatido em nosso parlamento, criaremos um órgão técnico, de natureza privada, que será incumbido de sugerir alterações na legislação de modo a torná-la compatível com os modernos padrões contábeis, sempre que necessário.
De outro lado, avançamos bastante no debate de instrução que deve ser brevemente submetida à audiência pública, cuidando do registro de companhias abertas classificadas em categorias diferenciadas, segundo os valores mobiliários emitidos e o porte das respectivas emissoras.
Papel importante no desenvolvimento do nosso mercado de valores mobiliários vem sendo desenvolvido pela Bolsa de Valores de São Paulo, não apenas pela implantação dos segmentos especiais de negociação (Níveis 1 e 2 e Novo Mercado), que asseguram melhor proteção aos investidores, mas também pelo incessante trabalho de popularização do mercado acionário, estimulando a criação de clubes de investimento, do que tem resultado expressivo crescimento de nossa base acionária.
Dentre as medidas que, a meu juízo, ainda faltam ser regulamentadas, teríamos o mercado de acesso (cujo projeto parece estar em fase avançada na Bovespa) e a possibilidade de uma parcela do fluxo de depósitos futuros do Fundo de Garantia de Tempo de Serviço (FGTS) ser utilizada na subscrição de novas ações de emissão de companhias listadas no Nível 2 da Bovespa ou no Novo Mercado.
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* Advogado do escritório Motta, Fernandes Rocha Advogados
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