A Lei dos Crimes Ambientais
Antes da existência da Lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, as infrações ambientais eram previstos em diferentes diplomas legais Haviam dispositivos no Código Penal, na Lei de Proteção à Fauna, no Código Florestal e em outros textos esparsos. Na prática, eram pouco conhecidos. Raramente aplicados.
quinta-feira, 11 de agosto de 2005
Atualizado às 07:41
A Lei dos Crimes Ambientais
Vladimir Passos de Freitas*
Antes da existência da Lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, as infrações ambientais eram previstos em diferentes diplomas legais Haviam dispositivos no Código Penal, na Lei de Proteção à Fauna, no Código Florestal e em outros textos esparsos. Na prática, eram pouco conhecidos. Raramente aplicados.
A Lei dos Crimes ambientais foi um divisor de águas. Foi atacada ao início, pela forma e conteúdo. A começar por aqueles que diziam que seus crimes deveriam estar previstos no Código Penal e não em uma lei especial. A findar pelos que lhe atribuíam o erro de desfigurar o Direito Penal convertendo as sanções em mera reparação do dano. Passados mais de 7 anos, seus resultados são animadores. É possível afirmar que ela foi e é decisiva na proteção do meio ambiente brasileiro. Vejamos.
A simples edição da lei fez com que as pessoas tomassem conhecimento da existência de crimes e se preocupassem com o dano ambiental. Com efeito, antes dela o desconhecimento era completo. Nem mesmo as autoridades policiais e judiciárias tinham ciência de todos os tipos penais, por vezes perdidos em leis de natureza administrativa como o Código de Mineração. Conhecer é o primeiro passo para a busca da eficiência.
A partir da nova realidade surgiram as especializações. A Polícia Militar, que em muitos estados já atuava sob a forma de Polícia Florestal, criou equipes especializadas. Em menor escala, também a Polícia Civil. A Polícia Federal, mais recentemente, criou Departamentos específicos em todas as superintendências. O Ministério Público, que foi o primeiro a preocupar-se com o tema, aprimorou-se. A magistratura estadual criou Varas Ambientais em Cuiabá e Manaus e, mais recentemente, a Justiça Federal semi-especializou Varas em Curitiba, Florianópolis e Porto Alegre.
O empresariado conscientizou-se. Em parte pela gravidade dos danos ambientais, motivo de preocupação de toda a sociedade, independentemente de idade ou classe social. Em parte porque a nova lei tornou possível processar criminalmente as pessoas jurídicas. A sociedade civil mobilizou-se. Foram criadas ONGs de origens e propósitos diversos. O IBAMA beneficiou-se com a previsão legal de infrações administrativas (art. 70), matéria estranha ao Direito Penal ambiental que acabou sendo incluída na lei.
Além disto, a nova lei inovou em muitos aspectos. O primeiro deles foi permitindo que os crimes com pena de prisão até 1 ano (agora 2 anos) pudessem ser objeto de transação, e os sancionados com o mínimo de 1 ano, pudessem ser alvo de suspensão do processo. Estes acordos judiciais, condicionados à reparação do dano ambiental, fizeram com que milhares de acordos fossem celebrados em todo o território nacional. Não há estatísticas. Mas de sul a norte, o Ministério Público propõe formas práticas de não instaurar ou suspender a ação penal, que, aceitas, são homologadas pelos juízes. Privilegia-se a proteção e restauração do meio ambiente e não a prisão do infrator.
As pessoas jurídicas foram responsabilizadas (art. 3º). Apesar de resistência de setores mais tradicionais do Direito Penal, acabou-se a antiga prática de punir o último elo da cadeia delitiva, ou seja, o vigia da empresa ou o motorista do caminhão. Vários processos penais foram abertos, muitos terminaram por acordos, alguns resultaram em condenação. Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça reconheceu a possibilidade da pessoa jurídica responder penalmente por seus atos (RESP 564.960-SC, Rel. Gilson Dipp, j. 02.06.2005).
As penas passaram a ter finalidade francamente direcionada à recuperação do dano ambiental (arts. 6º a 24). A pena corporal ficou restrita a casos de gravidade evidente, como formação de quadrilha para a prática de crime ambiental. Na maioria absoluta das condenações ao infrator vem sendo dada a oportunidade de prestar serviços a favor do ambiente. Para as pessoas de baixo grau de instrução e escolaridade passou a ser admitida atenuante da pena. Àquele que abate um animal para saciar sua fome ou de sua familiar a lei reconhece estado de necessidade (art. 37, I).
A nova lei definiu o crime de poluição (art. 54) e reconheceu a importância de proteger o ordenamento urbano e o patrimônio cultural (arts. 62 a 65). Da mesma forma tornou crime a conduta daqueles que atuam contra a administração ambiental (arts. 6 a 69), matéria antes atípica ou prevista em termos genéricos e ineficientes no Código Penal. Atenta à globalização, previu a Lei 9.605/98 forma de cooperação internacional para a preservação do meio ambiente (arts. 77 e 78), infelizmente ainda sem aplicação efetiva.
Em suma, muito fez e muito ainda fará a lei dos crimes ambientais a favor das presentes e futuras gerações. Ela tem defeitos, sem dúvida. Por exemplo, foi omissa na parte processual nas ações penais contra as pessoas jurídicas (arts. 26 a 28). Equivocou-se ao prever crime de dano culposo (art. 40, par. 3º). Não importa. Estas falhas não maculam o texto legal, que sem dúvida complementou a proteção ao meio ambiente no Brasil, ao lado da Constituição Federal, da Lei da Polícia Nacional do Meio Ambiente (6.938/81) e da Lei da Ação Civil Pública (7.347/85).
Passada o momento de elaboração de leis, que temos modernas e boas, temos que passar à fase mais difícil e importante: torná-las efetivas. É responsabilidade de todos nós brasileiros, fazer cumprir a legislação ambiental, em especial a Lei dos Crimes Ambientais.
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