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Direito Processual Civil

Donaldo Armelin

Há duas décadas, aproximadamente, a disciplina do processo civil brasileiro vem sofrendo alterações direcionadas ao atingimento da efetividade exigida pelos usuários dos serviços judiciários, na busca da prestação jurisdicional reclamada.

terça-feira, 9 de agosto de 2005

Atualizado às 08:48

Direito Processual Civil


Donaldo Armelin*

Há duas décadas, aproximadamente, a disciplina do processo civil brasileiro vem sofrendo alterações direcionadas ao atingimento da efetividade exigida pelos usuários dos serviços judiciários, na busca da prestação jurisdicional reclamada. A incorporação por amplas camadas da população de um sentido mais agudo de cidadania, fez com que se passasse a reclamar maior rapidez na solução judicial dos conflitos de interesses submetidos à apreciação do Judiciário.

Em um tipo de civilização, que se denominou algures "de urgência" o fator tempo erige-se como condicionante de um desempenho desejado da atividade jurisdicional. Esse aspecto do tema do nosso tempo na órbita processual, ou seja, da efetividade, põe em destaque a necessidade de aparelhar a estrutura legal do processo civil bem assim como a estrutura do Poder Judiciário, sem o que nem a celeridade processual nem a qualidade adequada da prestação jurisdicional poderão ser alcançadas.

No concernente à dogmática processual vigente, inúmeras alterações já foram concretizadas, com arrimo em posições doutrinárias respeitáveis e outras estão em curso conforme anteprojetos e projetos de lei elaborados por processualistas de escol. A despeito dos elevados propósitos que norteiam tais reformas propostas e do respaldo dos processualistas que as endossam, não se tem aprioristicamente qualquer certeza quanto ao seu resultado referenciado ao binômio: celeridade e qualidade da prestação jurisdicional. Ainda não se dispõe de estatísticas forenses adequadas e completas que suportem, na esfera da praxe forense, uma previsão de êxito quanto aos propósitos que as animam. Mas não podem deixar de ser encorajadas, não obstante impliquem eventual risco de erosão na sistemática do vigente Código de Processo Civil.

Contudo, as alterações desse Código, não têm, por si sós, aptidão para solucionar a crise pela qual passa a atividade jurisdicional no país. Impende uma reestruturação e ampliação da estrutura do Poder Judiciário, a fim de assegurar-lhe condições de atender ao desiderato consubstanciado o binômio celeridade e qualidade na prestação jurisdicional.

Há um limite para a carga de trabalho atribuída a cada órgão do poder judiciário, diretamente vinculado ao número de juízes que nela atuam. Não se pode exigir do juiz, nesse conceito integrados os desembargadores e ministros, mais do que a sua capacidade normal de trabalho pode suportar. Por mais brilhante, moderno e atualizado que seja o sistema processual, dependerá ele sempre de uma realidade fática inarredável: o juiz tem limites físicos para a sua produção intelectual no exercício da jurisdição. Nenhum juiz terá condições de prestar uma tutela jurisdicional da qualidade desejada, se esmagado por milhares de processos.

O dia para o juiz, como para qualquer outro trabalhador, tem sempre vinte e quatro horas, que devem ser distribuídas de modo adequado para garantir a possibilidade de desempenho de cada magistrado nos seus misteres.

O processo no Brasil atingiu a previsão de Capelletti, quanto a se converter em um fenômeno de massa. Apenas no Estado de São Paulo, o site do Tribunal de Justiça aponta em andamento, no ano de 2004, 13.403.469 feitos, envolvendo aqueles cíveis e criminais. O segundo grau de jurisdição acusa a distribuição de 500.546 recursos. Evidencia-se, pois, considerando o número de juízes e desembargadores em atividade, a sobrecarga de trabalho que oprime o Judiciário Paulista. A redução dessa carga não deve ser atingida mediante a compressão dos usuários dos serviços judiciais, através de restrições e sanções adicionais às já existentes, que, de resto, o Judiciário normalmente delas não utiliza.

Faz-se necessário dar maior operatividade ao que agora está explicitado em texto constitucional, ou seja, ao inciso XIII do art. 93 da Carta Magna, com a nova redação que lhe emprestou a Emenda Constitucional n. 45 de 30 de dezembro de 2004, verbis: o "numero de juízes na unidade jurisdicional será proporcional à efetiva demanda judicial e à respectiva população". Fazer com que tal norma não seja entendida como meramente programática, mas sim de atuação imediata.

Para estabelecer a proporcionalidade constitucionalmente imposta será mister fixar, levando-se em consideração as especificidades das matérias versadas, um padrão medido de eficiência de cada órgão judiciário, impondo, assim, uma correção adequada entre o número desses órgãos e o dos feitos a eles submetidos.

Evidentemente essa otimização da estrutura judiciária terá um custo, seguramente inferior àqueles social e econômico que resultam da morosidade da prestação jurisdicional. Acresce ainda que essa providência permitirá que as reformas impostas à legislação processual tornem-se mais efetivas, porque atuarão sobre uma estrutura judicial equilibrada, permitindo assim a melhor prospecção e eliminação das imperfeições da disciplina do processo. As reformas atuais incidem, de um modo geral, sobre os reflexos da situação atual do Judiciário, atuando sobre seus efeitos e não sobre a sua causa mais importante.

Depois da adequação da estrutura judiciária estadual ou federal poder-se-ão ser cobrados os resultados desejados pela sociedade e corrigidos adequadamente os defeitos da legislação processual. Adite-se a essas providências a imposição de especialização de câmaras e juízos nas situações em que isso se tornar possível e a melhoria da prestação jurisdicional evidenciar-se-á.

A busca de eficiência mediante a especialização é um princípio universal do qual não deve distanciar-se o Judiciário. Sem dúvida tais considerações podem ser mais pertinentes à situação do Judiciário no Estado de São Paulo, em que o congestionamento da via judicial torna-se patente. Outros Estados Federados poderão estar livres desse fenômeno, o que não impede a observância do preceito constitucional retro transcrito.

Mas essa disparidade chama a atenção para a necessidade de se dar uma exata compreensão ao permissivo constitucional (art.24, XI) autorizador dos Estados legislarem, ainda que concorrentemente, sobre procedimento em matéria de processo.

Suficiente será para tanto, além da vontade política dos Estados, definir com precisão, preferentemente, mediante lei, os lindes do processo e do procedimento, permitindo sejam extremadas para fins de exercício de competência legislativa, as respectivas áreas. Não é conveniente atrelar alguns Estados Federados a normas procedimentais que se desvendem como empecilhos à celeridade do processo. Diferenças sócio-econômicas e culturais não devem ser atreladas a um comportamento único na tela procedimental. Claro está que, como exercício de competência concorrente, a legislação estadual poderá submeter-se às normas nacionais correlatas, mas essa possibilidade não esgarça os efeitos favoráveis de uma disciplina estadual sobre o procedimento onde e quando isso se fizer mister.

A efetividade do processo, conceito polissêmico, aqui tomado como o resultado da conjugação da celeridade e Justiça na prestação jurisdicional será prestigiada com a adoção dessas providências . Não serão apenas as reformas em andamento que ensejarão esse desiderato, até porque não se resolvem problemas de natureza também econômica, como é o da necessária adequação da estrutura do Judiciário aos seus misteres, apenas mediante lei. Impende acumular os vários meios propiciadores das necessárias modificações para que sejam atingidas as metas desejadas por todos os operadores do direito e, mais, ainda pela sociedade, que não mais aceita pacientar a demora na prestação jurisdicional.

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Doutor pela PUC/SP e Desembargador aposentado do TJ/SP





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