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Judiciário: para além do bem e do mal

Em discordância ao posicionamento do ministro Marco Aurélio registrado em artigo anteriormente publicado neste rotativo, o advogado faz outra leitura a respeito das competências do CNJ.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Atualizado em 19 de janeiro de 2012 14:57

André Brandão Fialho Ribeiro

Judiciário: para além do bem e do mal

Em artigo publicado em Migalhas , o Eminente Ministro do STF, Marco Aurélio de Mello, ao tratar da tão em voga competência do Conselho Nacional de Justiça e seu limites, expôs que "O texto constitucional ao definir-lhe as atribuições sinaliza, a mais não poder, a atuação subsidiária" do CNJ, em relação às Corregedorias dos Tribunais de Justiça Estaduais.

Em sua dissertação expõe o Eminente Ministro que:

"O texto constitucional ao definir-lhe as atribuições sinaliza, a mais não poder, a atuação subsidiária. Extrai-se do § 4º, inciso I, do artigo 103-B competir-lhe "zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito da sua competência, ou recomendar providências". Sob o ângulo das reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, prevê o inciso III que o recebimento e a apreciação hão de ocorrer "sem prejuízo da competência disciplinar e correcional dos tribunais, podendo avocar processos disciplinares em curso..." cabendo-lhe "rever, de ofício ou mediante provocação, os processos disciplinares de juízes e membros de tribunais julgados há menos de um ano" - inciso V. Então, forçoso é concluir pela atuação subsidiária, sem atropelos indesejáveis. A legitimação não é concorrente, muito menos excludente."

Respeitada a competência conferida ao Eminente Ministro pela suprema toga - de dar interpretação ao texto constitucional - ouso discordar do posicionamento transcrito acima.

Será que minha limitação intelectual me impede de enxergar a competência subsidiária do CNJ em relação às Corregedorias dos Tribunais, tão defendida pelo Exmo. Ministro Marco Aurélio?

Leiam o inteiro teor do §4º do art. 103-B da Constituição Federal e vejam se são limitados como eu ou se possuem o olho de thundera (que confere a visão além do alcance), tal como o Exmo. Ministro.

§ 4º Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura:

I - zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências;

II - zelar pela observância do art. 37 e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência do Tribunal de Contas da União;

III - receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, inclusive contra seus serviços auxiliares, serventias e órgãos prestadores de serviços notariais e de registro que atuem por delegação do poder público ou oficializados, sem prejuízo da competência disciplinar e correicional dos tribunais, podendo avocar processos disciplinares em curso e determinar a remoção, a disponibilidade ou a aposentadoria com subsídios ou proventos proporcionais ao tempo de serviço e aplicar outras sanções administrativas, assegurada ampla defesa;

IV - representar ao Ministério Público, no caso de crime contra a administração pública ou de abuso de autoridade;

V - rever, de ofício ou mediante provocação, os processos disciplinares de juízes e membros de tribunais julgados há menos de um ano;

VI - elaborar semestralmente relatório estatístico sobre processos e sentenças prolatadas, por unidade da Federação, nos diferentes órgãos do Poder Judiciário;

VII - elaborar relatório anual, propondo as providências que julgar necessárias, sobre a situação do Poder Judiciário no País e as atividades do Conselho, o qual deve integrar mensagem do Presidente do Supremo Tribunal Federal a ser remetida ao Congresso Nacional, por ocasião da abertura da sessão legislativa.

Quando leio na Constituição que ao CNJ compete RECEBER E CONHECER das reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, acredito estar diante de competência originária, que confere ao CNJ o poder de receber as reclamações e de conhecê-las, ao invés de remetê-las a quem quer que seja.

Já quando, da continuação da leitura, me deparo com "sem prejuízo da competência disciplinar e correicional dos tribunais", percebo, imediatamente, a existência de competência concorrente, de modo que, recebidas reclamações pelas Corregedorias, estas as conhecerão, e não as remeterão ao CNJ.

Num contrato, a cláusula que prevê a aplicação de multa àquele que infringir seus termos, sem prejuízo das perdas e danos decorrentes, quer dizer que, aquele que descumprir o contrato pagará uma multa, além das perdas e danos decorrentes da infração, a serem posteriormente apuradas. Uma e outra.

Quando o Legislador Constituinte disse que cabe ao CNJ receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, sem prejuízo da competência disciplinar e correicional dos tribunais, quis ele dizer que cabe ao CNJ, além das Corregedorias, receber e conhecer das referidas reclamações. Um e outra. Daí tratar-se de competências concorrentes, e não subsidiária.

Deste modo, reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário poderiam, ao meu entender, ser analisadas, concomitantemente, tanto pelo CNJ quanto pelas Corregedorias dos Tribunais, bastando que as mesmas reclamações sejam prestadas em ambos.

Não à toa o mesmo §4º prevê a possibilidade do CNJ "avocar processos disciplinares em curso" nas Corregedorias, certamente com o intuito de evitar que suas decisões conflitem com as decisões daquelas últimas ou que os reclamados recebam punições além da medida.

A competência do CNJ, além de originária e concorrente com a das Corregedorias, é de uma modalidade original, já que lhe confere o poder, inclusive, de "rever, DE OFÍCIO os processos disciplinares de juízes e membros de tribunais julgados há menos de um ano", que seria, nada mais, o poder de avocar, inclusive, processos disciplinares já decididos pelas Corregedorias, dentro daquele determinado prazo, o que, as estas últimas, não compete.

Quando tal revisão se der por provocação, aí sim, o CNJ estaria atuando como uma espécie de 2ª Instância Julgadora, com o papel de Revisor das decisões das Corregedorias.

Percebam que o Ministro Marco Aurélio omite partes do texto da Constituição numa construção que, aos menos atentos, convence pela subsidiariedade da Competência do CNJ em relação às Corregedorias.

E defende, ainda, em conclusão, que "descabe a inversão de valores constitucionais, a centralização de poderes, sempre perniciosa, fragilizando-se a independência dos tribunais".

Entretanto, entender pela subsidiariedade da competência do CNJ é justamente, e ao contrário do defendido pelo Ministro, centralizar, com há muito se vê, o poder nas Corregedorias. É, ademais, excluir a eficácia e aplicabilidade de parte do texto da Constituição que garante ao CNJ "receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário", relegando ao Conselho o papel de mero revisor.

Numa coisa, ao menos, concordo com o Ministro, pois, efetivamente, "Há de prevalecer não a vitrine, a potencialização de certos enfoques, a visão dos predestinados, mas a percepção da realidade, afastando o enfoque daqueles que não se mostram compromissados com o amanhã, com dias melhores."

Oxalá, aquele a quem pertencem os olhos que vêem tudo, limpe as lentes do Excelentíssimo Senhor Ministro, clareando-lhe os enfoques e ampliando o contraste do azul e branco dos céus do amanhã.

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* André Brandão Fialho Ribeiro é advogado da banca Deda & Gordilho Advogados Associados

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