Imposto não poderia ser elevado por decreto
A partir da questão do IPI sobre veículos, o advogado acredita que o decreto não poderia ter sido usado para elevar alíquotas que haviam sido reduzidas por meio de MP.
segunda-feira, 3 de outubro de 2011
Atualizado às 08:07
Plínio J. Marafon
Imposto não poderia ser elevado por decreto1
Regra não poderia ter sido usada para "restabelecer" alíquotas que haviam sido reduzidas por medida provisória
A reviravolta do governo na questão do IPI sobre veículos chega a surpreender.
Isso porque, em 2 de agosto, a MP 540 (clique aqui) reduziu as alíquotas do imposto para os veículos, até 31 de julho de 2016, desde que atendidos os requisitos fixados em ato do Poder Executivo.
Ocorre que a mesma MP estendeu a redução aos veículos de procedência estrangeira, atendidos os limites e condições estabelecidos em ato do Poder Executivo. Mesmo estando em fase de convalidação, essa MP está produzindo efeitos jurídicos.
Tanto é que, após 45 dias, surge o decreto 7.567 (clique aqui), que excluiu as importadoras das alíquotas reduzidas (artigo 2º), alterou as alíquotas (artigo 10) e entrou em vigor na data de sua publicação.
O IPI é daqueles tributos cuja legislação que o institua ou aumente deve esperar 90 dias para produzir efeitos (Constituição, artigo 150, inciso 3, alínea c - clique aqui).
A polêmica é se o decreto "elevou" tributo que havia sido reduzido pela MP, e se poderia fazê-lo. O parágrafo 1º do artigo 153 da Constituição permite que decretos alterem as alíquotas do IPI, dentro dos limites fixados em lei.
Já o parágrafo 6º do art. 150 diz que "qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos (...), só poderá ser concedido mediante lei específica (...)".
A MP concedeu isenção ou subsídio, ao reduzir as alíquotas, dado que não houve redução de base de cálculo, crédito presumido etc.?
Ao escolher uma MP, o legislador se comprometeu e implicitamente se enquadrou no parágrafo 6º citado, caso contrário poderia ter concedido a redução por decreto.
Daí que a primeira conclusão leva à impossibilidade de decreto revogar conteúdo de MP, excluir beneficiários dos incentivos e reduzir seu prazo de validade.
Para tanto, seria preciso que o Congresso o fizesse, ao converter a MP em lei, ou a rejeitasse, dando espaço a futuro decreto equivalente.
Quanto aos 90 dias de anterioridade, há que atentar para o fato de o STF ter decidido não ser ela aplicável quando há uma mera revogação de isenção (RE 204.062). Se a tese a ser oposta ao Fisco é a de que a redução da alíquota equivale a uma isenção parcial, os 90 dias não se aplicarão.
Mas, uma vez concedido por lei, pode um benefício sob condição e por prazo certo ser retirado? O artigo 178 do CTN (clique aqui) proíbe a revogação de isenção dada dessa forma.
Mas, certamente, a União vai alegar que ele não é aplicável porque não houve isenção, mas mera redução de alíquota, dentro da flexibilidade que ela possui para manejar o IPI por decreto, dentro dos limites legais.
Mas a argumentação do confronto à OMC é bastante apreciável, dado que essa mesma tese, vista ao contrário, foi arguida quando da interpretação de que o crédito prêmio do IPI foi extinto, em virtude de ele contrariar as regras daquela entidade.
Portanto, é possível contestar o decreto 7.567 sob as óticas da hierarquia das leis ("revogou" um direito concedido por MP) e pelas regras da OMC.
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1 Artigo publicado na Folha de S.Paulo, de 27/9/11.
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* Plínio J. Marafon é advogado do escritório Marafon, Jacob Netto & Guariento Advogados
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