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Cobertor curto

Confira as reflexões do autor sobre desoneração de setores e produtos, flexibilização de direitos, sindicatos com fins arrecadatórios e redução de tributos.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Atualizado em 2 de setembro de 2011 11:55

Jefferson Cabral Elias

Cobertor curto

Por mais que se insista no discurso - e, tristemente, é nisso que se permanece - de ser necessário desonerar a folha de pagamento dos empregadores para permitir o avanço do país, pouco se faz para que a situação realmente se altere. Ninguém se dispõe a qualquer concessão efetiva!

O Governo não aceita qualquer redução na receita decorrente do pagamento de uma infinidade de tributos; os trabalhadores não concordam em discutir a flexibilização de direitos; e os sindicatos fazem enorme pressão para se manterem ativos, justificando o subsídio estatal, mas defendem opacamente os interesses dos trabalhadores.

A pesada conta deste jogo de interesses é paga pela iniciativa privada, que se desdobra para atender às exigências brasileiras para o desenvolvimento e exercício de qualquer atividade empresarial no país. Enquanto isso, a economia chinesa alcança seguidos recordes de crescimento!

Discurso capitalista? Não, de fato. Pretende-se que o tratamento dos trabalhadores assemelhe-se com o da China? Também não. Apenas um pouco de bom senso e visão periférica do atual cenário político e econômico mundial. Por etapas:

A ânsia de arrecadação estatal é quase infinita, e por mais que se discurse acerca da desoneração para este ou aquele setor ou produto - o que visivelmente prejudica o restante das empresas -, sempre há uma contrapartida. Ou seja, entrega-se com uma mão e retira-se com a outra.

Há muito é ultrapassado o tempo apropriado de o Governo deixar o discurso de lado e agir energicamente. O aumento contínuo dos gastos públicos, para a manutenção de uma máquina pública absurdamente inchada - e ainda assim lenta e burocrática em muitos aspectos - impede uma redução tributária efetiva.

Os trabalhadores, por seus representantes não admitem quaisquer modificações na vasta cadeia de direitos trabalhistas conquistados.

E não se está, aqui, a apregoar a supressão de direitos, mas meramente a rediscussão de algumas garantias que hoje são incompatíveis com o processo produtivo moderno, e com uma sociedade que pretende ser próspera.

Vale rememorar que a Consolidação das Leis do Trabalho - CLT - foi aprovada em 1º de maio de 1943. Desde então, muita coisa mudou, especialmente na forma como a maioria dos trabalhadores vê a relação com o empregador.

Certamente devem ser protegidos os trabalhadores menos esclarecidos, que infelizmente ainda representam significativa parcela da população nacional, mas não seria desperdício algum avaliar o que pensam os profissionais, hoje muito mais qualificados, que ingressaram há pouco no mercado de trabalho, e de forma indispensável, aqueles que ainda virão.

A forma alternativa com que a geração "Y" enxerga a solução de questões cotidianas - alternativa porque foge de conceitos já envelhecidos -, dá um claro sinal de que no futuro próximo não mais será possível conviver com o arcaico modelo que utilizamos.

Outro aspecto que deve ser visto com cautela é a atuação fragilizada - porque não acompanha o dinamismo das relações trabalhistas -, das entidades sindicais.

É inegável a crise de representatividade enfrentada atualmente, o que torna cada vez menos justificada a existência de diversos sindicatos. É com tristeza que se vê que a matriz sindical é mantida com o subsídio estatal, ou seja, por milhares de trabalhadores.

E não se fala aqui de significativos e atuantes sindicatos, com passado de lutas e participação efetiva na construção deste país. Fala-se do imenso número de sindicatos criados com intuito manifestamente arrecadatório e que, de fato, representam interesses mais próximos dos seus dirigentes, que da pequena parcela de trabalhadores que pretendem representar.

Essa quase inesgotável fonte de recursos colocou em segundo plano a discussão de temas relevantes para a classe trabalhadora do país, assim como a pulverização da representatividade sindical.

Não é sem motivo que o Governo posterga, a cada incerta, a discussão sobre a extinção do imposto sindical, sob o argumento de que ainda não houve consenso quanto à alternativa para a fonte de subsistência das entidades sindicais. Não houve e, no ritmo de criação de novas entidades que se segue, não haverá.

Enquanto isso, o trabalhador, que não se sente devidamente representado, não acompanha, como antigamente, a atuação de seu sindicato. Como resultado, a falta de cobrança de uma postura mais enérgica das entidades de classe, permite que o modelo atual - e lucrativo - ganhe sobrevida.

Um encontro recentemente realizado em São Paulo, que contou com a participação de empresários e do representante do Governo para assuntos trabalhistas, permitiu algumas das considerações acima.

Na ocasião, falou-se na possibilidade de redução de impostos, mas na impossibilidade de extinção de direitos.

Também foi mencionado que o sistema previdenciário deve ser encarado como investimento do país e não como custo, porquanto os aposentados movimentam boa parte do consumo interno, e em muitos casos são chefes de família.

Surge, a propósito, daí um sinal de que o cenário não é tão próspero como se anuncia. Se os índices da economia e do emprego fossem efetivamente positivos, não seriam vistos tantos aposentados chefiando famílias com pessoas em idade economicamente ativa.

Não fosse também o excesso de corrupção e fraudes no sistema previdenciário, provavelmente não haveria déficit e não seriam necessárias reformas e mais reformas com o objetivo de aumentar a contribuição do Estado e da idade para a jubilação.

Defendeu-se, ainda, que sem o imposto sindical as entidades sindicais não subsistiriam, porém, nada se disse sobre a eficácia de suas atuações.

Vai longe a discussão, mas não é difícil de enxergar aonde estão alguns dos principais entraves do setor produtivo do país.

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*Jefferson Cabral Elias é advogado especialista em Direito do Trabalho, do escritório De Vivo, Whitaker, Castro e Gonçalves Advogados










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