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A contradição do Supremo

A questão da ficha limpa e o caso das uniões homoafetivas. A primeira vista, pode parecer estranho que possa haver contradição entre duas matérias tão diversas, mas houve, pois na primeira prevaleceu a regra diante dos princípios, e no segundo prevaleceram os princípios diante da regra.

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Atualizado em 29 de junho de 2011 16:18

A contradição do Supremo

Américo Masset Lacombe*

O Supremo Tribunal Federal, em dois julgamentos recentes, incidiu em uma séria contradição. Os casos não tratam da mesma matéria. São eles:

A questão da ficha limpa e o caso das uniões homoafetivas. À primeira vista, pode parecer estranho que possa haver contradição entre duas matérias tão diversas, mas houve. Na primeira, prevaleceu a regra diante dos princípios e, na segunda, prevaleceram os princípios diante da regra.

A própria Constituição (clique aqui) estabeleceu uma série de regras que são ressalvas a princípios. Podemos citar, como exemplo, a regra fixada no § 1º, do artigo 153, que permite ao Poder Executivo, nas condições estabelecidas em lei, alterar alíquotas dos impostos de importação, exportação, IPI e IOF, que nitidamente ressalva o princípio da legalidade, estabelecido genericamente no artigo 5º, II, e, especificamente, no artigo 150, I. Nesses casos, não há dúvidas, devem prevalecer as regras.

No caso da ficha limpa havia a dúvida se deveria prevalecer o princípio da moralidade que resume tudo o que contém o § 9º, do artigo 14, e que está também explicitado no artigo 37, ou se deveria prevalecer a regra do artigo 16, que dispõe que "a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até 1(um) ano da sua vigência." Prevaleceu corretamente a regra1.

No caso das uniões homoafetivas deu-se prevalência aos princípios da dignidade da pessoa humana e do pluralismo, cujo conceito vai muito além do pluralismo político. Pluralismo é tolerância com diversidades e divergências. Neste caso, os princípios prevaleceram sobre a regra contida no § 3º, do artigo 226, que estabelece que "para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar..."

O que se pede ao Supremo Tribunal Federal é a definição do que deve prevalecer, se o princípio ou a regra. Ou, então, que diga em que casos prevalecem o princípio e em que casos devem-se dar preferência às regras. A opinião pessoal de cada um é menos importante do que a segurança que a Suprema Corte pode nos dar ao estabelecer um critério único.

Se o Supremo Tribunal Federal fizer a opção pela prevalência dos princípios em qualquer caso, deverá admitir a tese de Otto Bachof, vale dizer da existência de normas constitucionais inconstitucionais.

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1 A palavra processo sendo utilizado em seu sentido vulgar e não no sentido técnico de lei processual. A Constituição emprega a palavra processo em sentido vulgar, ainda no § 1º, do artigo 215, que fala em "processo civilizatório nacional", e no inciso I, do § 1º, do artigo 225, que diz incumbir ao Poder Público "preservar e restaurar os processos ecológicos...".

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*Advogado em São Paulo. Mestre e doutor em Direito pela PUC/SP. Desembargador Federal aposentado


 

 

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