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Como se fazem boas leis

Fernando B. Meneguin e Marcelo Guedes Nunes

O ordenamento jurídico e o poder Judiciário detêm a capacidade de alterar profundamente o desenvolvimento econômico de uma sociedade. Tanto as leis quanto as decisões judiciais fornecem um conjunto de incentivos aos cidadãos e empresas, que têm reflexos sobre a eficiência das transações econômicas.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Atualizado em 19 de maio de 2011 10:01


Como se fazem boas leis

Fernando B. Meneguin*

Marcelo Guedes Nunes**

O ordenamento jurídico e o Poder Judiciário detêm a capacidade de alterar profundamente o desenvolvimento econômico de uma sociedade. Tanto as leis quanto as decisões judiciais fornecem um conjunto de incentivos aos cidadãos e empresas, que têm reflexos sobre a eficiência das transações econômicas. Por exemplo, uma lei de patentes, que proteja as inovações tecnológicas e gere lucros aos inventores, será um incentivo para o desenvolvimento científico. Por outro lado, uma Justiça que crie dificuldades para credores obterem seus direitos faz crescer a taxa de juros, pois, não havendo segurança judiciária de que o crédito será recuperado rapidamente, a tendência é que já se inclua na taxa de juros um adicional para cobrir as perdas com créditos não pagos.

Antever o efeito de uma legislação ou o resultado de uma disputa judicial diminui o grau de incerteza no mercado. Para ambos os casos, existem ferramentas que podem ajudar a antecipar o reflexo das leis ou o que será decidido nos tribunais. Falamos da "avaliação de impacto legislativo" e da jurimetria.

A disciplina chamada legística ocupa-se de como fazer as leis, de forma metódica e sistemática, tendo por objetivo aprimorar a qualidade desses atos normativos. A avaliação de impacto legislativo, técnica integrante da legística, é extremamente útil para analisar os efeitos decorrentes da aplicação de uma legislação. Entende-se, assim, que a avaliação legislativa deve examinar ex ante se a legislação será: efetiva, ou seja, se o comportamento adotado pelos destinatários da norma estará de acordo com o esperado; eficaz, no sentido de que o texto legal deve estar formulado para que os objetivos sejam alcançados; e eficiente, isto é, se os benefícios oriundos da lei compensarão os custos impostos por ela, além de serem os menores possíveis. A avaliação de impacto legislativo deveria ser elaborada no âmbito das Casas Legislativas relativamente aos projetos de lei relevantes, de forma a municiar os parlamentares com análises técnicas sobre os projetos. No entanto, também a iniciativa privada pode elaborar as avaliações de impacto, pois se beneficiará das informações consolidadas na medida em que o tema da proposição interesse aos negócios.

Uma das ferramentas mais úteis para a avaliação de impacto legislativo é a jurimetria. Define-se jurimetria como a aplicação dos métodos da Estatística e da Probabilidade ao estudo e elucidação dos fenômenos jurídicos. Enquanto a forma clássica de estudo do Direito se preocupa em identificar os possíveis significados das normas gerais e abstratas (como as que encontramos nas leis), a proposta da jurimetria é avaliar como o Direito se manifesta concretamente nas inúmeras sentenças, acórdãos, contratos, fatos e atos jurídicos produzidos diariamente na sociedade. Se, por exemplo, a análise da norma que regula a obrigação de indenizar do Código Civil é feita através de um estudo de seu significado gramatical, histórico, sistemático ou teleológico, o estudo do universo de acórdãos proferidos pelos tribunais brasileiros com base nessa norma exige modelos aptos a entender a sua multiplicidade e, ao mesmo tempo, resumir a sua variabilidade, permitindo a elaboração de cálculos de probabilidade a respeito do comportamento dos tribunais.

Ao compreender o Direito "de baixo para cima", partindo do plano concreto para chegar à abstração da lei, a jurimetria traz elementos importantes a serem considerados na elaboração de políticas públicas, que, nas democracias, passam frequentemente pela atividade legislativa. Entender o perfil dos conflitos levados ao Poder Judiciário ajuda a compreender as características da demanda pela atividade jurisdicional. Esse indicador é fundamental para que o Poder Público identifique os casos de hiperregulação (excesso de normas para casos irrelevantes) e hiporregulação (ausência de normas para casos relevantes). Da mesma forma, entender como os juízes aplicam as normas gerais auxilia a identificar a mens judicanti (como pensam os juízes) e a evitar conflitos entre a dicção das leis e a mentalidade de quem as aplica, dando mais estabilidade e previsibilidade ao sistema. O mesmo pode ser dito a respeito da eficácia de garantias contratuais, da recuperabilidade de créditos, das causas de inadimplemento e de todos os fatos jurídicos que borbulham no plano concreto e cotidiano da vida em sociedade. A compreensão desses conjuntos de eventos nos mostra a realidade do Direito, que nada mais é do que a plataforma sobre a quais futuras reformas serão edificadas.

As decisões sobre a realização de investimento produtivo dependem das previsões acerca dos lucros futuros e de quão confiável são essas previsões ou expectativas. O nível de confiança, por sua vez, depende da disponibilidade de boa informação e de um sistema jurídico transparente e estável. Nesse ponto é que a avaliação de impacto legislativo e a jurimetria surgem como peças fundamentais na construção de um país moderno, pois fornecem dados aos agentes privados, diminuindo as suas incertezas, e auxiliam os agentes públicos a produzir leis mais adequadas à realidade do país. O Brasil é uma economia emergente, com um enorme potencial de crescimento, que só se manifestará em toda a sua grandeza se soubermos implementar corretamente as reformas institucionais de que o nosso país precisa. Compreender a realidade da aplicação do Direito para, a partir dessa base, avaliar de forma mais precisa o impacto de novos sistemas legislativos é o caminho para que as reformas institucionais atinjam os seus objetivos.

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*Diretor do Centro de Estudos da Consultoria do Senado Federal

**Diretor do IDSA - Instituto de Direito Societário Aplicado. Sócio-titular do escritório Guedes Nunes, Oliveira e Roquim Sociedade de Advogados

 

 

 

 

 

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