O Supremo Tribunal Federal e o interrogatório nos procedimentos especiais
A lei 11.719/08 alterou alguns dispositivos do CPP relativos à suspensão do processo, emendatio libelli, mutatio libelli e aos procedimentos, passando o interrogatório do acusado a ser o último ato processual da audiência de instrução e julgamento, o que veio a fortalecer a ideia de considerá-lo, além de mais um meio de prova, um autêntico e importante meio de defesa.
sexta-feira, 1 de abril de 2011
Atualizado em 31 de março de 2011 09:11
O Supremo Tribunal Federal e o interrogatório nos procedimentos especiais
Rômulo de Andrade Moreira*
Na sessão plenária realizada no dia 24 de março, os Ministros do Supremo Tribunal Federal decidiram aplicar a nova regra do Código de Processo Penal (clique aqui), modificada pela lei 11.719/08 (clique aqui), que alterou o momento de realização do interrogatório dos acusados para o fim da fase de instrução criminal. Por unanimidade dos votos, eles negaram provimento a um agravo regimental interposto pelo Ministério Público Federal na Ação Penal (AP) 528 (clique aqui). No recurso, sustentava-se que os argumentos da norma especial - lei 8.038/90 (clique aqui), que mantém o sistema tradicional - prevaleciam sobre a geral, que coloca o interrogatório do réu ao final da instrução. De acordo com o relator, Ministro Ricardo Lewandowski, o Plenário do Supremo já havia iniciado a discussão se a mudança legislativa do CPP afetava ou não a lei 8.038/90, mas ainda não havia conclusão do debate. O Supremo sinalizou que o interrogatório é um instrumento de defesa do réu e, portanto, deve ser colocado ao final. Assim, em vista da previsão da lei 11.719/08 que modificou o artigo 400 do CPP e transferiu o interrogatório para o final do processo, Lewandowski despachou na AP 528 no sentido de que os réus sejam interrogados ao final do processo, considerando a nova sistemática mais favorável a defesa. "Não se pode negar que se trata de um tema de altíssima relevância dado o reflexo que a referida inovação legal exerce sobre o direito constitucional, a ampla defesa, embora não tenha tido ainda o Supremo Tribunal Federal a oportunidade de posicionar-se definitivamente a respeito dele, nem mesmo em sede de questão de ordem", avaliou o Ministro Ricardo Lewandowski. Ele lembrou que o tema chegou a ser debatido pelos ministros anteriormente, em uma questão de ordem suscitada na AP 470 (clique aqui), contudo, como naquela ação penal o interrogatório já havia sido realizado, a discussão não prosseguiu. Para o relator, "parece-me relevante constatar que se a nova redação do artigo 400, do CPP, possibilita ao réu exercer de modo mais eficaz a sua defesa, tal dispositivo legal deve suplantar o estatuído no artigo 7º, da Lei 8038, em homenagem aos princípios constitucionais que são aplicáveis à espécie", afirmou. Segundo ele, é mais benéfico à defesa possibilitar que o réu seja interrogado ao final da instrução, depois de ouvidas as testemunhas arroladas, bem como após a produção de outras provas como eventuais perícias. Nesse caso, conforme o relator, o acusado terá a oportunidade de esclarecer divergências "que não raramente afloram durante a edificação do conjunto probatório". Quanto à discussão sobre o aspecto formal, o ministro entendeu que o fato de a lei 8.038/90 ser norma especial em relação ao CPP, "em nada influencia o que até aqui se assentou". "É que, a meu sentir, a norma especial prevalece sobre a geral apenas nas hipóteses em que estiver presente alguma incompatibilidade manifesta insuperável entre elas, nos demais casos, considerando a sempre necessária aplicação sistemática do direito, cumpre cuidar para que essas normas aparentemente antagônicas convivam harmonicamente". Dessa forma, o relator negou provimento ao agravo regimental, entendendo que o interrogatório deve ocorrer no final do processo.
Entendemos acertada e importante esta decisão do Supremo Tribunal Federal, assentando que a modificação no procedimento comum quanto ao momento da realização do interrogatório também se aplica aos procedimentos especiais, inclusive, por força de raciocínio, à lei de drogas (11.343/06 - clique aqui).
Como se sabe, a lei 11.719/08 alterou alguns dispositivos do Código de Processo Penal relativos à suspensão do processo, emendatio libelli, mutatio libelli e aos procedimentos, passando o interrogatório do acusado a ser o último ato processual da audiência de instrução e julgamento, o que veio a fortalecer a ideia de considerá-lo, além de mais um meio de prova, um autêntico e importante meio de defesa.
Já havia entendimento doutrinário segundo o qual em todos os procedimentos penais, inclusive na lei de drogas, deveria ser o interrogatório feito por último, em razão do disposto no art. 400 do CPP. Neste sentido, Reinaldo Daniel Moreira, Boletim do IBCCrim, nº. 194, p. 15.
Pois bem.
Como afirma a doutrina, com a reforma, "o interrogatório e, por conseguinte, a autodefesa ganharam ainda mais importância, principalmente porque aquele ato passou a ocupar o derradeiro momento da persecução penal, permitindo, assim, ao réu, apresentar a sua versão dos fatos após ter tido contato pessoal com todas as demais provas produzidas, principalmente as orais. Trata-se, como se percebe, de importante inovação, que confere ao acusado uma maior possibilidade de defender-se, até porque, como se sabe, talvez em razão da falta de investimentos ou, até mesmo, de cultura em investigação, quase sempre os processos criminais são decididos com base nas provas testemunhais colhidas. No entanto, obviamente, para que o réu possa desempenhar sua autodefesa de maneira ampla, é essencial que ele esteja pessoalmente presente durante a realização da audiência de instrução e julgamento e, também, a da tomada de todos os testemunhos que ocorram fora desta. Tal afirmação já era válida na sistemática anterior, com fundamento na CF e, até mesmo, na Lei Adjetiva vigente, mas tornou-se inquestionável doravante, tendo em vista a supramencionada alteração na ordem da colheita das provas e, bem assim, o entendimento do STF quanto à hierarquia dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos. Quanto a este último aspecto, cumpre destacar que o Brasil é signatário do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de Nova York, aprovado pelo Dec. Leg. nº 266/1991 e promulgado pelo Dec. nº 592/92, o qual expressamente prevê, como direitos de todos os que sejam acusados criminalmente, "de estar presente no julgamento e de defender-se pessoalmente" (art. 14, 3, d)."1
Assim, "na lei nova prevalece outra orientação: o interrogatório é o momento mais importante da autodefesa; é a ocasião em que o acusado pode fornecer ao juiz sua versão pessoal sobre os fatos e sua realização após a colheita da prova permitirá, sem dúvida, um exercício mais completo do direito de defesa, inclusive pela faculdade de permanecer em silêncio (art. 5º, LVIII, CF)."2
A propósito, vejamos este julgado:
"O interrogatório do acusado somente após a ouvida das testemunhas de acusação e defesa resulta de inovação processual penal que não pode ceder, sobretudo quando aqueles residem exclusive ou predominantemente fora do distrito de culpa. Entendimento diverso, sem observância dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, implica em indesejável violação das garantias constitucionais da ampla defesa e do devido processo legal." (TJ/MT - 1ª C. Bem. Decl. 119968/09 - rel. Paulo Inácio Dias Lessa - j. 27.10.2009).
Hoje, mais do que antes, se aceita a ideia de
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Para
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Veja-se a
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Não esqueçamos
O interrogado tem
Adepto desta
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1 Pupo, Matheus Silveira. Uma nova leitura da autodefesa. Boletim IBCCRIM, São Paulo, ano 16, n. 196, p. 14-15, mar. 2009.
2 Ada Pellegrini Grinover e outros, Juizados Especiais Criminais, São Paulo: RT, 3ª. ed., 1999, p. 176.
3
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5
6 Luigi Ferrajoli, Derecho y Razón, 3ª. ed., Madrid: Trotta, 1998, p. 607.
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*Procurador-Geral de
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