Modernidade

Alessandra Raffo Schneider*

Sempre me considerei alguém ultramoderna. Daquelas mulheres hi-tech que não possuem agenda, tão pouco livros de receita, mas imprimem do cyberspace tudo o que precisam, de um ingresso para cinema ao último texto de lei. Assim, pouco havia me surpreendido que os novos estagiários de Direito não tenham Códigos Civis ou Penais, mas sejam ágeis em vasculhar a rede em busca de respostas. Ainda que me perguntasse se algo ficaria do passado que conhecemos, pouco me apegava às marcas do tempo e sabores de outrora.

Mas como há coisas cujo prazer nos deixam indelével sensação de felicidade, também sempre me vi atraída pelos museus (não virtuais), pelas salas de concerto e de maneira ainda mais incorrigível pelos livros. Estes últimos, fadados ao desaparecimento segundo alguns, sempre me devolveram a experiência de liberdade desacorrentada de baterias, teclas, erros inexplicáveis. Estes em sua graciosa paciência me permitem dobrá-los, sublinhá-los, acompanham-me da espreguiçadeira da piscina até na decolagem do avião, quando seus iguais eletrônicos forçosamente são desligados.

Foi numa destas tardes de nostalgia que comprei um dicionário. Depois de muito procurar na internet, onde só se vendiam as edições em CD, permiti-me adquiri-lo pessoalmente, sentir sua robustez e peso, mal conseguindo descê-lo da prateleira. Muitos me perguntaram: "Para quê? Se tudo se acha na rede?". Simplesmente queria tê-lo e decidida o levei, com o mesmo fervor e deleite feminino que teria ao ter comprado um belo par de sapatos.

De volta à minha casa, meu filho de 14 anos me procurou... Lia um romance escrito no começo do século XX, cujas palavras desconhecia e já desistira das mal sucedidas buscas no computador. Apresentei-lhe o enorme dicionário, e em seus olhos vi a descrença de que encontraríamos ali algo que ele em terabytes de informação não achara. Uma a uma as palavras foram sendo decifradas, nenhuma faltava, todas precisamente descritas em fartura de detalhes. O dicionário ocupou seu lugar de prestígio em nossa biblioteca, respeitado até pelos membros mais jovens da família.

Qual o aprendizado deste episódio? Para mim, a certeza de que há preciosidades que sempre terão seu lugar, que há valores e riquezas que sobreviverão a todas as mudanças da sociedade. Ainda, ocorreu-me a consciência da complementaridade do conhecimento humano, ilimitado, que se constrói de muitas formas, seja com a criação coletiva das redes sociais, seja com a profundidade da pesquisa individual de um livro.

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