Reajuste do salário mínimo
Ante mais um impasse acerca do reajuste anual a ser aplicado ao valor do salário mínimo, o Governo Federal, em dezembro de 2010, elevou o salário mínimo de R$ 510,00 para R$ 540,00 (reajuste de 5,9%), passando a vigorar a partir de 1º de janeiro de 2011.
quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011
Atualizado às 09:20
Reajuste do salário mínimo
Armando Bergo Neto*
Ante mais um impasse acerca do reajuste anual a ser aplicado ao valor do salário mínimo, o Governo Federal, em dezembro de 2010, elevou o salário mínimo de R$ 510,00 para R$ 540,00 (reajuste de 5,9%), passando a vigorar a partir de 1º de janeiro de 2011. O governo, no entanto, admite chegar ao valor máximo de R$ 545,00. Ocorre que as centrais sindicais almejam o salário mínimo saltando para R$ 580,00 e a oposição quer o mínimo em R$ 600,00, valor que fora propalado pelo candidato Serra como "factível e importante", quando em campanha para o cargo de presidente da República, na recente eleição de 2010.
Ano após ano essa "luta", esse "cabo-de-guerra" de um lado puxado pelos trabalhadores - na medida em que aproximadamente 25 milhões de brasileiros recebem um salário mínimo mensal, sendo que dentre estes, aproximadamente 16 milhões são de aposentados -, na tentativa de recompor seu exíguo poder de compra; na outra extremidade, o Governo Federal puxando-o, como de costume, por não poder reajustar o mínimo de uma maneira mais condizente, tendo em vista que isso aumentaria sobremaneira o déficit da Previdência Social, segundo é alegado, invariavelmente.
Convenhamos, a questão do reajuste anual do salário mínimo já se tornou cansativa e ridícula. Serve apenas como moeda de troca, serve para atos demagógicos, tanto governamentais, de políticos oposicionistas, quanto de entidades que dizem representar os interesses dos trabalhadores. Os responsáveis pelo debate sobre o mínimo ficam "jogando para a torcida", na tentativa de auferir dividendos políticos, na intenção de demonstrar que estão lutando pelo poder de compra dos cidadãos. Como seria bom se pudéssemos acreditar que isso é verdade...
Qualquer das propostas de reajuste para o salário mínimo brasileiro acima apresentadas não podem, em verdade, ser tidas como sérias, corretas, de acordo com nosso ordenamento jurídico. De fato, o inciso IV, do artigo 7º, da CF/88 (clique aqui) diz, textualmente: "São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: ...salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim" (grifei).
Mas qual o valor que hoje atenderia às necessidades vitais e básicas elencadas em nossa Constituição Federal? Segundo o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos - DIEESE, o valor seria de R$ 2.194,76, isto é, 4,06 vezes superior ao mínimo atual de R$ 540,00, valor que seria apto à manutenção de uma família composta por quatro pessoas.
Mas, então, por que a discussão em torno de R$ 545,00, R$ 580,00 e R$ 600,00 para o salário mínimo nacionalmente unificado? Das duas uma: ou a Carta Magna não vale nada, é letra morta, ou estamos vivendo num país surrealista, onde são desprezadas as construções refletidas e o encadeamento lógico, valendo mesmo a irracionalidade e o inconsciente. Tanto o salário mínimo vigente quanto o que passará a viger após a concessão de reajuste definitivo são inconstitucionais, na medida em que contrariam frontalmente o dispositivo constitucional acima invocado, já que o valor indicado pelo DIEESE é de, repita-se, R$ 2.194,76.
O povo brasileiro, bem como nossa classe política, quando atuam na qualidade de consumidores, de donas-de-casa ou de chefes de família, tem a total ciência de que o valor do salário mínimo vigente e os valores registrados nos anos anteriores nunca foram suficientes para cobrir sequer a mínima parte do rol de necessidades básicas contido no dispositivo constitucional em referência.
O Brasil necessita parar, urgentemente, de ser o país do faz-de-conta! Já estamos cansados. Ou se altera a norma constitucional, ou, de uma vez por todas, que a lei fixe, anualmente, o correto valor - com base nos estudos técnicos apontados pelo DIEESE - que seja apto para suprir as necessidades vitais básicas de todas as famílias brasileiras.
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*Advogado
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