A imortalidade e a herança de Ruy Barbosa (III)
O livro do advogado polonês Louis Begley, "O caso Dreyfus - Ilha do Diabolo, Guantánamo e o pesadelo da História", é um registro minucioso do processo, da condenação e da revisão do famoso affaire Dreyfus, considerado um dos maiores erros judiciários do século passado. Mas não há uma linha sequer acerca da defesa pública de Alfred Dreyfus promovida por Ruy Barbosa.
quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011
Atualizado em 2 de fevereiro de 2011 10:03
A imortalidade e a herança de Ruy Barbosa (III)
Não foi Émile Zola o primeiro defensor do Capitão Dreyfus
René Ariel Dotti*
O livro do advogado polonês Louis Begley, O caso Dreyfus - Ilha do Diabolo, Guantánamo e o pesadelo da História (Companhia das Letras, 2010), é um registro minucioso do processo, da condenação e da revisão do famoso affaire Dreyfus, considerado um dos maiores erros judiciários do século passado. Mas não há uma linha sequer acerca da defesa pública de Alfred Dreyfus (1859-1935) promovida por Ruy Barbosa (1849-1923).
A imortal Águia de Haia estava exilada em Londres (1894) ao tempo em que a infamante condenação foi imposta pelo Conselho de Guerra: destituição das honras militares e degredo perpétuo na Ilha do Diabo (Guiana Francesa). E já no segundo dia após a execução pública das penas, Ruy Barbosa escreveu um artigo sobre o caso, deplorando as circunstâncias que cercaram a acusação da suposta traição do jovem militar em favor da Alemanha e as características do julgamento - a portas fechadas -, além da cerimônia degradante da liturgia da sentença. O texto chegou ao Brasil pelas mãos de um amigo e foi publicado no Jornal do Commercio, do Rio de Janeiro, na edição de 3 de fevereiro de 1895. A corajosa iniciativa do autor da Oração aos moços antecedeu a célebre carta de Émile Zola (1840-1902), J'Accuse, publicada no jornal L'Aurore, em 13 de janeiro de 1898, nominalmente dirigida ao Presidente Felix Faure.
Em 19 de fevereiro de 1898, o jornal El Tiempo, de Buenos Aires, traduziu e reproduziu, integralmente, o artigo de Ruy Barbosa, destacando ser aquele o primeiro arrazoado em favor de Dreyfus. A edição era muito oportuna porque coincidia com a revisão do processo e a restituição do status do oficialato. O periódico argentino afirmou que as conclusões do jurista brasileiro, consideradas como "aventurosas temeridades" de sua preocupação jurídica ou de sua mania liberal, foram confirmadas pela justiça francesa. E também aludia às Cartas da Inglaterra, escritas por Ruy durante o exílio para se proteger da perseguição imposta pelo vice-presidente da República, Floriano Peixoto (1854-1895), o famoso Marechal de Ferro, e que assumiu a presidência em face da renúncia do Marechal Deodoro da Fonseca (1827-1892), ocorrida em 23 de novembro de 1891 (Segue).
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*Advogado do Escritório Professor René Dotti e professor universitário. Presidente da Comissão da OAB para analisar e propor emendas ao projeto do novo CPP. Detentor da Medalha Mérito Legislativo da Câmara dos Deputados (2007)
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