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Corretagem de imóveis e a conduta do mediador

Gustavo Surian Balestrero

Seria razoável que o corretor pudesse então responder pelas perdas e danos daí decorrentes? Seria juridicamente aceitável que, sem concorrer de qualquer forma para o evento danoso, tivesse o corretor que arcar com a restituição de valor que só o promitente vendedor recebeu ou mesmo da comissão?

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Atualizado em 31 de janeiro de 2011 12:04

Corretagem de imóveis e a conduta do mediador

Gustavo Surian Balestrero*

Atualmente a corretagem está disciplinada no Código Civil Brasileiro (CC)1. E antes da vigência da atual Lei Privada, exceto pela regulamentação da profissão de corretor de imóveis2, as questões relativas à corretagem imobiliária eram primordialmente resolvidas pelos usos e costumes, sobremodo consolidados pela jurisprudência.

A despeito de ter sido positivada no ordenamento jurídico, deparamo-nos atualmente com uma avalanche de demandas judiciais sobre corretagem de imóveis em que se busca, com amparo no Código de Defesa do Consumidor (CDC)3, a responsabilização objetiva da imobiliária. Ajuíza-se, v.g., ação visando à rescisão de contrato de compra e venda cumulada com devolução do sinal pago ao promitente vendedor, imputando responsabilidade objetiva a quem apenas mediou o negócio. Desta forma a imobiliária arcaria, ao final, independentemente de culpa (negligência, imprudência ou imperícia), com a devolução de quantia que jamais se credenciou a receber.

Pois bem. Não se pretende negar peremptoriamente a possibilidade da incidência pontual do CDC em litígios nascidos de contratos imobiliários, a depender das características da relação jurídica concreta. Até porque a lei geral (CC) e a especial (CDC) não são diplomas antagônicos e assim deverão ser aplicados de forma coordenada. Ou seja, e em melhores palavras, "Não há conflito real entre estas leis, somente antinomias (...), que podem ser resolvidas com o uso da aplicação ordenada, subsidiária e especial do CDC e do CC/2002. Útil, pois, a idéia de 'diálogo' das fontes, diálogo significa aplicação simultânea, coordenada e sistemática destas duas leis principais e coexistentes no Direito Privado Brasileiro"4.

Todavia, no que diz respeito ao mediador do negócio, a responsabilidade está diretamente ligada à conduta desempenhada na intermediação.

Com efeito. A norma geral - que regulamentou a corretagem imobiliária - prevê que o mediador tem a obrigação de executar seus préstimos com diligência e prudência, informando e esclarecendo às partes acerca de segurança e risco do negócio (CC, art. 723). É do texto legal, pois, a necessidade de se sopesar a conduta do mediador para eventual responsabilização civil.

Vale dizer, o mediador somente pode ser responsabilizado se agiu de forma culposa em negócio imobiliário frustrado. Num caso, por exemplo, em que o corretor aproximou as partes sem aferir a situação do bem ou a idoneidade dos vendedores, faltando assim com diligência e prudência na mediação, poderia ele ser responsabilizado a devolver a comissão.

Nesse sentido, é o lapidar voto do E. Desembargador OCTAVIO HELENE, do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo: "O corretor somente pode ser responsabilizado perante a compradora se lhe atribuída e comprovada a culpa ..."5.

Enfim, não nos parece legítima a novel prática em que se busca a responsabilização objetiva das imobiliárias e corretores, independentemente de se observar suas condutas, sob pena de se arrostar princípios constitucionais, como o da razoabilidade. É dizer, os mediadores não poderão, depois de corretagem eficaz, serem uma espécie de "garantia" líquida e certa de obrigações assumidas exclusivamente por terceiros.

Cogite-se, v.g., de hipótese na qual o corretor afira a situação do imóvel a ser negociado e a idoneidade dos interessados, providenciando as respectivas certidões. Contudo, depois de as partes firmarem promessa de compra e venda, o vendedor deixa de apresentar certidão de distribuidor, pois dias após assinar o aludido compromisso teve seus bens bloqueados em execução fiscal, ainda não aforada à época da prévia diligência do corretor.

Seria razoável que o corretor pudesse então responder pelas perdas e danos daí decorrentes? Seria juridicamente aceitável que, sem concorrer de qualquer forma para o evento danoso, tivesse o corretor que arcar com a restituição de valor que só o promitente vendedor recebeu ou mesmo da comissão?

Negativa é a resposta a ambas as indagações.

Não seria razoável e nem juridicamente aceitável condenar o comitente genericamente por inadimplemento de um dos contraentes, tudo sob o manto da responsabilidade objetiva. Aliás, caso assim entendido, além de se estar afrontando o art. 14 do CDC - que exige defeito na prestação de serviço para a responsabilização -, o objetivo maior da Lei Consumerista - de equilibrar as relações jurídicas - estaria sendo desvirtuado, uma vez que se estaria onerando demasiadamente os corretores e, sem dúvida alguma, embaraçando-lhes a atividade profissional.

Deste modo, não obstante o crescente número de demandas ajuizadas com fulcro no CDC, imputando objetivamente responsabilidade às imobiliárias e corretores, é imperioso sopesar a conduta do mediador para a eventual responsabilização civil.

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1 Lei Federal 10.406, de 11 de janeiro de 2002 (arts. 722 e ss) - clique aqui.

2 Lei Federal 6.530, de 12 de maio de 1978 - clique aqui.

3 Lei Federal 8.078, de 11 de setembro de 1990 - clique aqui.

4 MARQUES. Cláudia Lima. Superação das Antinomias pelo Diálogo das Fontes: o Modelo Brasileiro de Coexistência entre o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil de 2002. In Revista do Direito do Consumidor, vol. 51, Rio de Janeiro: RT, 2004, pág. 67, (g.n.).

5 TJ/SP, Apelação Cível nº 994.06.134575-3, 10ª Câmara de Direito Privado, rel. Des. OCTAVIO HELENE, j. 14/9/2010.

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*Advogado do escritório Manuel Alceu Affonso Ferreira Advogados

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