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Legitimidade do repasse do custo de PIS e COFINS

Eduardo Talamini e Aline Lícia Klein

O julgamento do REsp 976.836 foi concluído na sessão do dia 25.8.2010 da 1ª Seção do STJ. Por seis votos a três, foi dado provimento ao recurso da Brasil Telecom para se reconhecer a legitimidade do repasse do custo econômico do PIS e da COFINS nas tarifas de telefonia. O recurso voltava-se contra acórdão proferido pelo TJRS que havia reputado ilegal o repasse do custo das contribuições sociais.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Atualizado em 24 de setembro de 2010 13:49


Legitimidade do repasse do custo de PIS e COFINS

Eduardo Talamini*

Aline Lícia Klein**

1. O julgamento do REsp 976.836

O julgamento do REsp 976.836 foi concluído na sessão do dia 25.8.2010 da 1ª Seção do STJ. Por seis votos a três, foi dado provimento ao recurso da Brasil Telecom para se reconhecer a legitimidade do repasse do custo econômico do PIS e da COFINS nas tarifas de telefonia. O recurso voltava-se contra acórdão proferido pelo TJ/RS que havia reputado ilegal o repasse do custo das contribuições sociais.

Há grande quantidade de ações no Judiciário brasileiro, tanto individuais quanto coletivas, que questionam a legalidade do repasse econômico do custo das contribuições sociais nas tarifas de telefonia.

Como o REsp 976.836 submeteu-se ao procedimento de julgamento dos recursos repetitivos (CPC, art. 543-C), esse mesmo entendimento deverá ser aplicado às demais ações que tramitam em todo o país questionando a legitimidade do referido repasse.

2. A legalidade do repasse do custo econômico do PIS e da COFINS

A questão do repasse do custo econômico das contribuições sociais nas tarifas de telefonia é alheia a qualquer consideração estritamente tributária. Não se trata de discutir quem é o sujeito passivo da obrigação tributária, ou coisa que o valha. A questão simplesmente concerne à formação das tarifas das operadoras de modo a cobrir os custos envolvidos na prestação dos serviços.

Para as outorgas regidas pelo regime de direito público, a questão é resolvida a partir do princípio do equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão. As imposições tributárias suportadas pela operadora repercutem na equação econômico-financeira do contrato e, justamente por isso, incidem sobre a tarifa. Aplicam-se ao caso as várias disposições constitucionais e legais sobre equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão, inclusive quanto à necessidade de revisão da equação econômica diante da alteração da carga tributária.

Note-se que as contribuições sociais incidem sobre o faturamento das empresas. A sua repercussão na equação econômico-financeira é aferível diretamente. A incidência das contribuições sociais implica diminuição concreta da receita arrecadada pelas operadoras através das tarifas cobradas dos usuários, redução essa que corresponde exatamente ao montante devido pela operadora a título de PIS e COFINS incidente sobre aquela receita.

Sob esse aspecto, as contribuições sociais diferenciam-se do imposto sobre a renda. Este apresenta efeitos diversos no universo de contribuintes. Um aumento da carga do imposto de renda não repercute diretamente nos custos da empresa, na mesma proporção do seu aumento, tendo em vista a necessidade de considerar outros fatores, tais como lucros ou prejuízos acumulados. Justamente por terem repercussão direta e imediata sobre os custos das operadoras, independente de qualquer consideração da situação específica de cada empresa, os encargos decorrentes das contribuições sociais incluem-se na hipótese de incidência da regra do § 3º do art. 9º da Lei nº 8.987/95 (clique aqui).

A solução é idêntica para as outorgas que se submetem ao regime privado. Muitas delas iniciaram-se sob a forma de concessão, de modo que as tarifas cobradas pelas hoje autorizatárias foram definidas a partir dos valores definidos em licitação. As propostas apresentadas consideraram justamente as regras vigentes, que permitem o acréscimo do custo financeiro das contribuições sociais sobre os valores líquidos das tarifas. Além disso, mesmo no regime privado, as tarifas devem ser formadas considerando-se o custo dos serviços prestados. É o que consta, por exemplo, dos arts. 35 e 37 do Regulamento do SMP (Anexo à Resolução 477/2007 da ANATEL - clique aqui).

Por fim, mesmo em um ambiente sujeito exclusivamente ao direito privado e ao livre mercado, não se pode impedir o agente econômico de incluir nos preços por ele praticados o custo financeiro dos tributos arcados pela oferta de mercadorias ou prestação de serviços. Trata-se de princípio inerente à economia: todos os custos incorridos ou gerados para a disponibilização do produto ou serviço integrarão a composição do seu preço. "Não existe almoço grátis" - na célebre frase popularizada por Milton Friedman.

3. Os fundamentos acolhidos pelo STJ

O acórdão do julgamento do REsp 976.836 ainda não foi disponibilizado. No entanto, a partir das notícias divulgadas pela Coordenadoria de Editoria e Imprensa do STJ, é possível identificar os fundamentos que prevaleceram na 1ª Seção do STJ.

O STJ reconheceu que os valores de PIS e COFINS incidentes sobre as tarifas pagas pelos usuários de telefonia integram os custos econômicos que podem ser repassados aos usuários para fins de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de delegação do serviço.

O valor das tarifas deve ser suficiente para garantir o reembolso das despesas envolvidas na prestação do serviço. Entre tais despesas, incluem-se os custos econômicos dos tributos pagos pelas operadoras. Para que o serviço não seja deficitário, é necessário incluir tais custos nas tarifas.

Além disso, o STJ considerou que, por incidirem sobre o faturamento das empresas, as contribuições sociais repercutem diretamente sobre os valores das tarifas cobradas dos usuários. Diferenciam-se, assim, do regime aplicável aos impostos incidentes sobre a renda.

Reconheceu-se também que o referido repasse não viola nenhum dos dispositivos do Código de Defesa do Consumidor (clique aqui). O Relator Ministro Luiz Fux destacou o caráter de lei especial que as normas específicas do serviço de telefonia apresentam em relação às normas consumeristas.

Esses aspectos foram confirmados pela ANATEL, ao se manifestar nos autos do REsp 976.836. A Agência destacou que homologa o valor líquido das tarifas e que permite que, sobre ele, incidam os valores dos custos dos tributos que podem ser repassados. Enfatizou também o impacto econômico da decisão, indicando que a proibição do repasse e a determinação de devolução aos usuários dos valores das contribuições sociais provavelmente implicaria aumento das tarifas de telefonia.

4. Observações finais

O julgamento em questão apresenta grande relevância em termos regulatórios. Privilegiou-se a preservação das condições em que os serviços de telefonia foram delegados aos particulares. A fixação das tarifas sempre considerou a possibilidade de a elas ser acrescido o custo econômico das contribuições sociais incidentes sobre os valores recebidos pelas operadoras. As atividades das operadoras sempre consideraram a possibilidade de cobrança de tarifas de tal modo. A mudança das regras dos instrumentos de delegação já vigentes implicaria forte abalo do setor, que passaria a atuar de modo deficitário, e a consequente responsabilização do Estado, que editou tais regras.

Além do impacto regulatório, não se pode deixar de destacar a relevância econômica do julgamento. A Brasil Telecom chegou a divulgar cálculo segundo o qual, caso tivesse que devolver os valores cobrados dos seus usuários correspondentes ao repasse das contribuições sociais, apenas entre os anos de 2006 e 2009, teria que desembolsar o valor de R$2,1 bilhões. Já o seu lucro total no período teria sido de R$1,3 bilhão (Valor Econômico, edição de 26/08/2010).

Considerando-se que o repasse do custo econômico das contribuições sociais é praticado por todas as operadoras e que é expressamente previsto desde muito antes da privatização do setor, pode-se dimensionar o grande impacto econômico que eventual decisão em sentido contrário poderia ter. Além disso, esses dados comprovam que a prestação do serviço seria absolutamente deficitária caso fossem praticadas as atuais tarifas e não fosse possível fazer o repasse econômico das contribuições sociais. Note-se que o impacto econômico dessa decisão acabaria implicando a necessidade de se revisar os instrumentos de outorga em vigor e o provável aumento das tarifas cobradas dos usuários.

Bibliografia:

TALAMINI, Eduardo e KLEIN, Aline Lícia. Legitimidade do repasse do custo de PIS e COFINS. Informativo Justen, Pereira, Oliveira e Talamini, Curitiba, nº 43, setembro de 2010, disponível em https://www.justen.com.br/informativo.php?informativo=43&artigo=475, acesso em 22/9/2010.

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*Livre-docente, doutor e mestre (USP). Professor (UFPR), advogado do escritório Justen, Pereira, Oliveira & Talamini Advogados Associdos

**Mestre em Direito do Estado (UFPR), advogada do escritório Justen, Pereira, Oliveira & Talamini Advogados Associdos

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