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O alcance da LC 118/05 - O "novo prazo" para repetição de indébito

Juliana Borges

Nos últimos meses, a atenção dos contribuintes e demais pessoas que operam com o Direito Tributário está bem disputada; tantas foram as mudanças ocorridas na legislação.

segunda-feira, 18 de abril de 2005

Atualizado em 15 de abril de 2005 09:52


O alcance da LC 118/05 - O "novo prazo" para repetição de indébito


Juliana Borges*


Nos últimos meses, a atenção dos contribuintes e demais pessoas que operam com o Direito Tributário está bem disputada; tantas foram as mudanças ocorridas na legislação. Uma delas, em especial, propomo-nos a analisar em breves linhas: o prazo para o contribuinte reaver um valor pago a título de tributo sujeito ao lançamento por homologação.

As hipóteses mais comuns de restituição contemplam o pagamento feito a mais e o indevido. Para esses casos, o Código Tributário Nacional - CTN sempre estabeleceu (desde 1966) o prazo de cinco anos (art. 168, I). Entretanto, muito se discutiu sobre qual seria o termo inicial desses cinco anos, uma vez que a redação do CTN "limitava-se" a fixar tal termo no fato da "extinção do crédito tributário", que, para alguns, ocorre na data do pagamento e, para outros, na data da homologação expressa ou tácita desse mesmo pagamento.

A homologação expressa, equivalente a uma chancela fiscal efetiva sobre o recolhimento feito pelo contribuinte, deve ser feita pela Administração em até cinco anos contados da ocorrência do fato gerador do tributo (art. 150, § 4º, do CTN). Em não havendo essa ação por parte do Fisco, dentro desse qüinqüênio, o recolhimento está homologado tacitamente.

Por isso, quem considera o pagamento como termo inicial do prazo decadencial e prescricional do contribuinte entende que após cinco anos desse recolhimento já não é mais possível requerer sua devolução. Para quem a "extinção do crédito tributário" somente se verifica com a homologação, acaba alargando esse prazo para dez anos, uma vez que cinco passam para que ocorra a homologação (tácita) e mais cinco se iniciam a partir dela.

Foi desse último modo que se consolidou a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, garantindo aos contribuintes o direito de pleitear suas restituições em até dez anos da data do recolhimento.

Para afastar a interpretação jurisprudencial desfavorável ao erário, foi promulgada a Lei Complementar nº 118, de 9/2/2005. O art. 3º dessa lei impôs que se considere o pagamento como causa da extinção do crédito tributário. Apesar de sua redação sugerir que o legislador promoveu uma interpretação autêntica do art. 168, I, do CTN, na prática, o prazo decenal concedido pelo STJ aos contribuintes foi reduzido para cinco anos.

Problema maior é a intenção do Fisco de aplicar essa nova regra a todo e qualquer caso. Fundada na permissão de retroatividade feita pelo CTN às leis interpretativas (art. 106, I), está a pretensão de que, a partir da vigência da nova lei, seja respeitado o prazo de cinco anos, independentemente da data do pagamento questionado, ou de o contribuinte já ter apresentado seu pedido administrativo de restituição ou de estar em trâmite sua ação de repetição de indébito.

Que o legislador possa alterar prazos, desde que utilize o veículo normativo próprio para determinada matéria, não se discute (no caso, a exigência constitucional de lei complementar foi respeitada). Contudo, somente por se declarar interpretativa, pode a lei nova retroagir, cortando pela metade um direito já assegurado aos contribuintes pelo Poder Judiciário?

O CTN não possuía redação tão explícita quanto a acrescentada pela nova LC. Mas, não obstante a possibilidade de interpretações diversas para o art. 168, I, os contribuintes acreditavam que lhes seria aplicado, em última instância, o entendimento do STJ.

Tudo indica que o próprio STJ fará com que a segurança jurídica prevaleça. Os holofotes estão voltados para a Primeira Seção, que está apreciando a aplicação da LC 118 a um caso de repetição de indébito. Os Ministros, que foram favoráveis ao contribuinte, estão considerando que a lei interpretativa, por não inovar a ordem jurídica, não pode causar prejuízo, reduzindo um direito.

Entretanto, está havendo um consenso entre os Ministros do STJ no que diz respeito apenas aos "processos já ajuizados", às "ações em curso". Ora, entendemos que também aqueles contribuintes que ainda estão inertes em relação aos seus pedidos de restituição mereçam ser protegidos. Até a edição da nova lei, quem possuía um recolhimento de tributo, feito há mais de cinco anos mas há menos de dez, estava tranqüilo quanto à possibilidade jurídica de requerer sua devolução.

Um contribuinte, que tivesse feito um recolhimento indevido há oito anos, contava com a certeza de ainda possuir mais dois anos para sair em busca de seu direito. Também para esses casos a nova LC não pode gerar efeitos, sob pena de a mera interpretação prejudicar o que poderia ser classificado, em sentido amplo, como direito adquirido. Assim, a interpretação veiculada pela LC de 2005 somente deveria incidir sobre os pagamentos feitos a partir de sua vigência; para os recolhimentos anteriores continuaria valendo o prazo de dez anos.

Outro aspecto que merece ser abordado é o art. 4º, da LC 118, que prevê a entrada em vigor dessa nova lei após cento e vinte dias contados da publicação. Quer dizer, apesar de o art. 106, I, do CTN, determinar a aplicação retroativa de uma lei expressamente interpretativa, é evidente que esse artigo refere-se a uma lei que esteja vigorando.

Somente a lei que já iniciou seu período de vigência pode ser aplicada, seja aos casos ocorridos sob sua égide ou aos pretéritos, em caso de autorizada retroação. O que não se pode é retroagir lei que sequer entrou em vigor, que ainda esteja com sua eficácia suspensa. Ou seja, somente após a LC 118 entrar em vigor - o que ainda não ocorreu - é que deveria ser discutida a possibilidade de retroatividade da nova interpretação.

Note-se que o art. 4º, da LC 118, não diz que o art. 3º entrará em vigor desde a data da publicação; a lei toda inicia sua vigência cento e vinte dias após a publicação, com a possibilidade de, a partir daí, ter aplicação retroativa o art. 3º.

Sendo assim, salvo melhor juízo, a interpretação do art. 168, I, do CTN, ainda não está vinculada à nova lei.

Por essa razão, em não sendo acolhida a tese que defendemos acima, de que a aplicação da LC 118 deveria tomar por referência a data do pagamento que se pretende restituir, mas, prevalecendo o entendimento manifestado por alguns Ministros do STJ, de que a nova lei não atingirá os processos em curso, acreditamos que também as ações propostas antes do início da vigência desse novo dispositivo não deverão sofrer sua influência.
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*Advogada do escritório Ferrari e Borges e Sakate Advogados






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