Ainda sobre o papel e a conduta do advogado-empregado
Esse tema já o vimos cuidando em dois artigos anteriores, na tentativa de colocar o profissional no lugar que nos parece certo, dentro da empresa. Desta feita, até repetindo alguns pensamentos, pois assim parece necessário, porque se cuida da vida de um profissional, que, se alcança uma posição de destaque, suficiente para guindá-lo a ser um "in-house", não pode ser um tanto negligente consigo, embora isso ocorra de freqüente.
terça-feira, 15 de março de 2005
Atualizado em 14 de março de 2005 15:15
Ainda sobre o papel e a conduta do advogado-empregado
Jayme Vita Roso*
Esse tema já o vimos cuidando em dois artigos anteriores, na tentativa de colocar o profissional no lugar que nos parece certo, dentro da empresa. Desta feita, até repetindo alguns pensamentos, pois assim parece necessário, porque se cuida da vida de um profissional, que, se alcança uma posição de destaque, suficiente para guindá-lo a ser um "in-house", não pode ser um tanto negligente consigo, embora isso ocorra de freqüente.
Tentemos esquecer o que já foi escrito e tentemos abordar o "in-house", com algumas aparentemente novas roupagens. Conhecemo-las, mas só as praticamos para outros: é um mal que aflige a maioria dos advogados. É um mergulho dentro do trabalho, sem aferição do seu mérito, expletivo pela natureza, importância e destaque social.
O advogado "in-house" e um possível guia para preservar a relação privilegiada cliente-advogado.
Esse tema é incendiário, com labaredas se espalhando por todos os lados, mormente nos Estados Unidos, após o caso Enron. Centrou-se a discussão em torno de recomendações feitas por um advogado, via e-mail, lembrando à Andersen (auditoria) a política de retenção ou conservação ou guarda ou proteção de documentos, referentes às funções pelos auditores exercidas e as inerentes responsabilidades, vinculadas à administração de companhia. E ainda seguem os debates, alçados aos Tribunais, que avaliam a conduta dos advogados e dos auditores, não só naquele desastroso evento, como em similares que se repetiram em seguida.
Toda gente passou a saber que a Andersen fizera o contrário, razão porque processada por "obstrução da justiça".
Entrou em discussão nos tribunais americanos o tema que encima esta consideração: o papel do advogado "in-house" e a questão do privilégio advogado-cliente da informação.
Valhamo-nos, para este enfoque, das precisas contribuições que Joseph J.Siprut nos proporcionou ao escrever o artigo "An In-House Counsel's Guide to Preserving Attorney-Client Privilege"1. O objetivo da articulada exposição de Siprut foi mostrar que, naquela relação apontada no título, cuida-se da proteção e, sobretudo, da preservação do privilégio. É a confidencialidade levada à baila, a sério. Sintetizamo-la, quanto possível: a) é obrigação do advogado proteger a informação confidencial do cliente; b) a informação é propriedade do cliente, cabendo ao advogado encorajá-lo a falar franca e livremente e, se preciso, pedir tantas e quantas informações adicionais forem necessárias para inteirar-se do tema, que lhe é colocado pelo cliente.
Que contribuição trouxe Siprut para a abordagem do tema?
Siprut é tão preciso, quanto claro, mais ainda objetivo, em espelhar o privilégio advogado-cliente, e, ao fazê-lo, genericamente, transcrevamos, o que escreveu:
"The attorney-client privilege protects certain communications between an attorney and client from compelled disclosure, thereby fostering open dialogue between the attorney and the client without fear that what is said to the lawyer will be relayed to a potential adversary. The privilege applies to clients who are individuals as well as to corporate clients- the corporation itself.
The privilege shields communications between attorneys and their clients from discovery, and it therefore provides the basis for objection to demands for discovery of materials or communications that otherwise might be discoverable. The basic elements needed to establish privilege are (i) a communication (ii) made in a confidence (iii) between an attorney (iv) and a client (v) for the purpose of seeking or obtaining legal advice.
A client can expressly waive the privilege or can be deemed to constructively waive it through (i) disclosure of any part of a communication to a third party, including certain company employees, outside auditors, underwriters, etc.; (ii) production of privileged documents; ( iii) deposition testimony; or ( iv) legal advice that is combined with or otherwise provided for a specific business purpose. In addition to waivers of the privilege, communications otherwise privileged will not be protected if they are in furtherance of contemplated or ongoing criminal or fraudulent conduct pursuant to the 'crime/fraud exception' to the privilege".2
E Siprut conclui, com sabedoria:
"The role of in-house counsel in today's times is often a hybrid version of both attorney and business advisor. When these two roles begin to merge and in-house counsel dons both 'businessperson hat' and 'lawyer hat', protective actions should be taken to distinguish between the two roles wherever possible for purposes of retaining the attorney-client privilege."3
Outras facetas da função do "in-house".
Não exagerando o discurso, mas dando quantas possíveis idéias para serem discutidas, aceitas ou não, implantadas ou não, compartilhadas com terceiros ou não, ainda nos atrevemos a sugerir:
O advogado interno deve mapear a sua função dentro do organograma da empresa, cabendo-lhe, com exclusividade, fundamentar a implantação e a execução das estratégias do seu departamento ou divisão.
O advogado interno, chave mestra no controle da governança, deve levá-la a todos os níveis, mas previamente discutida, programada e codificada para ser implantada.
O advogado interno, ainda que seja empregado, tem com a empresa a relação de cliente-advogado, cabendo provisionar e proporcionar serviços legais ou jurídicos, bem como ampará-la no que lhe for possível, enquanto advogado.
Encarregado do departamento jurídico, o advogado "in-house" deve se preparar para administrá-lo, com a implicação dessa tarefa de levá-lo a funcionar como executivo, controlando e supervisionando uma equipe que lhe seja hierarquicamente subordinada. E um dos principais cometimentos será estabelecer estratégias para ser eficiente seu departamento, bem como desenvolver uma estratégia de risco jurídico para a empresa.
Compete-lhe, dentro da organização, valorizar a função do seu departamento, e, para isso, procurando fazer com que os outros departamentos compreendam quanto pode agregar ao conjunto, através de comunicados precisos, objetivos e compreensíveis.
Normalmente, cada departamento jurídico tem um orçamento e deve viver, convivendo, com ele, sem esquecer que a época presente é de eliminar o supérfluo e qualquer ostentação.
Saber valorizar o cargo e a função própria, com discrição, bem como dos demais membros da equipe, enquadra-se na árdua listagem, por isso, compete-lhe: a) saber interpretar o "trade-off" entre aprendizado, desenvolvimento e implantação dos sistemas de prevenção de riscos para os administradores; b) aprender a delegar; c) entender que não há comunicação, sem eficiente "feed-back" e d) sem soberbia, construir um estilo próprio, adequado à própria personalidade, tendo respeito aos demais, colegas ou não.
Deixar transparecer a todos que a eficiência das comunicações repousa no bom senso, nas informações que passará sem retórica, com estilo direto, o que aplainará o relacionamento, se isso for feito com elegância.
Isso tudo, ainda, pode ser ampliado, em cada tópico que se abordou, donde comum lembrarmos um antigo refrão americano: "O advogado trabalha muito, vive bem e morre pobre". Acrescento que o advogado, que só busca a riqueza, mercantiliza a profissão, maculará a dignidade própria e da nobre Classe.
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Notas bibliográficas
1 J. SIPRUT, Joseph. "An in-house counsel's guide to preserving attorney-client privilege". Illinois Bar Journal, Chicago, nº 11, p. 586-588, nov.2004.
2 Ibidem. p. 587.
3 Ibidem. p. 588.
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* Advogado do escritório Jayme Vita Roso Advogados e Consultores Jurídicos