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Simplificação Fiscal

Tive o privilégio de assistir palestra do Prof. Jose Juan Ferreiro Lapatza, Professor da Universidade de Barcelona, na sala da Congregação da Faculdade de Direito do Largo São Francisco.

segunda-feira, 14 de março de 2005

Atualizado às 08:03

Simplificação Fiscal


Alessandra Okuma*

No início de março tive o privilégio de assistir palestra do Prof. Jose Juan Ferreiro Lapatza, Professor da Universidade de Barcelona, na sala da Congregação da Faculdade de Direito do Largo São Francisco.

Convidado pelo programa de pós-graduação desta Universidade - notadamente pelos Professores Paulo de Barros Carvalho e Heleno Taveira Tôrres - o Professor Lapatza teceu importantes considerações sobre o papel do jurista na sociedade, ressaltando que - atualmente - as questões de política fiscal vêm sendo discutidas apenas por economistas e não por advogados. Este panorama conduz à edição de inúmeras leis eivadas de lacunas, contradições e obscuridades, tornando o sistema jurídico desconexo e desordenado.

Segundo o Prof. Lapatza, também é função do jurista orientar a produção normativa, zelando pela harmonia, simplicidade e coerência do sistema jurídico.

Para ele, a tão desejada simplificação fiscal levaria a uma arrecadação mais eficiente e justa, não é utopia, mas poderá ser alcançada adotando-se a metodologia adequada, que a seguir será descrita.

Estados democráticos de direito são pautados pela liberdade e igualdade. Por isso, a tributação deve seguir as quatro regras fundamentais de Adam Smith (que se refletem em substância no axioma geralmente apresentado: "equity", "efficiency", "transparency"): 1) quem pertence a algum Estado deve contribuir com os gastos de modo proporcionalmente adequado às respectivas capacidades econômicas; 2) o tributo que cada um deve pagar deve ser certo e não arbitrário; 3) os tributos devem ser cobrados no momento e da forma mais conveniente para quem é chamado a pagá-los; 4) os tributos devem ser disciplinados de modo a evitar os excessos de arrecadação em relação com as efetivas necessidades do Estado.1

A função do jurista, desde os tempos da antiga Roma, é observar a realidade e produzir regras que devem ser seguidas para conduzir a sociedade ao comportamento desejado. Assim, a simplificação fiscal pressupõe a observação da realidade, envolvendo a análise de estatísticas e do direito comparado. As estatísticas são indicadores que denotam a eficácia social das normas e, portanto, não podem ser ignoradas pelos juristas, no propósito de se alcançar a simplificação fiscal. A análise do direito comparado poderá trazer soluções que reduzam os litígios entre o Fisco e os contribuintes e permitam uma arrecadação fiscal mais eficiente.

Nesse particular, o Prof. Lapatza criticou o modelo adotado pela legislação brasileira - semelhante ao modelo espanhol - no qual o contribuinte é obrigado a proceder ao autolançamento do imposto sobre a renda, descrevendo os fatos produtores de rendimento e qualificando-os segundo as categorias especificas de rendimentos. Para ele, a atividade do contribuinte deveria se limitar à declaração dos fatos produtores de renda, sendo competência da administração qualificá-los e calcular o imposto devido. O Prof. Lapatza defende que a preocupação dos agentes administrativos em conferir a qualificação das categorias de rendimentos feita pelos contribuintes afasta-os de sua função principal: a busca de fatos produtivos de rendimentos não declarados com o propósito de combater a sonegação fiscal.

Renomado professor citou experiências bem sucedidas na Inglaterra, Estados Unidos e Itália, que com a criação de "câmaras de arbitragem" reduziu-se o contencioso administrativo e permitiu-se a solução de litígios sobre o valor atribuído aos bens ou direitos ou sua qualificação jurídica.

Deveras, a simplificação fiscal compreende a edição de normas gerais e abstratas. Exceções, regimes especiais e benefícios fiscais devem ser evitados por amor à simplicidade. Quanto mais normas de exceção; mais lacunas, obscuridade e contradições; mais complexa se torna a atividade hermenêutica; menos certo e seguro se torna o Direito e menos eficaz a arrecadação.

Deve ser observado com reservas o "mito" de que os contribuintes devem ser tributados pela renda efetiva. Não obstante seja indispensável que a tributação respeite ao capacidade contributiva, para tanto, não é obrigatório que a tributação grave a renda efetivamente auferida pelo contribuinte. Ora, nem mesmo a atual legislação do imposto sobre a renda é suficiente para tributar apenas a renda efetiva dos contribuintes, eis que são permitidas inúmeras deduções ou amortizações que não correspondem ao percentual real. A tributação da renda, por estimativa, num percentual do faturamento adequadamente fixado para refletir a capacidade contributiva do contribuinte permitira a simplificação da escrituração fiscal, a facilitaria o exercício da atividade empresarial e a atividade fiscalizatória. Eventuais distorções, inevitáveis qualquer que seja o regime de apuração de rendimentos, poderiam ser levadas à apreciação dos Tribunais administrativos ou do Poder Judiciário.

Diante da relevância e das considerações feitas pelo Prof. Lapatza, trago-as ao conhecimento público, instigando-os a pensar a esse respeito, como pessoalmente venho fazendo...
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1UCKMAR, Victor. As tendências fiscais do início do Terceiro Milênio, in Direito Tributário Internacional Aplicado, volume II. TÔRRES, Heleno Taveira (coord.). São Paulo: Quartier Latin, 2004, p.30.
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*Advogada do escritório Demarest e Almeida Advogados









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