A crônica de uma violência anunciada - I
O escritor colombiano Gabriel Garcia Márquez (Prêmio Nobel de Literatura em 1982), é autor de uma das grandes obras de ficção, cujo título original é "Crônica de uma morte anunciada". Um resumo da internet conta o último dia do personagem Santiago Nasar, num quebra-cabeças envolvendo peças que se encaixam pouco a pouco pelas versões de testemunhas que estiveram perto dos protagonistas. É a história do assassinato de Santiago pelos irmãos Vicário, sem chance de defesa.
segunda-feira, 25 de janeiro de 2010
Atualizado em 22 de janeiro de 2010 14:53
A crônica de uma violência anunciada - I
O Coritiba Foot Ball Club merece a sentença de maldição?
René Ariel Dotti*
O escritor colombiano Gabriel Garcia Márquez (Prêmio Nobel de Literatura em 1982), é autor de uma das grandes obras de ficção, cujo título original é "Crônica de uma morte anunciada". Um resumo da internet conta o último dia do personagem Santiago Nasar, num quebra-cabeças envolvendo peças que se encaixam pouco a pouco pelas versões de testemunhas que estiveram perto dos protagonistas. É a história do assassinato de Santiago pelos irmãos Vicário, sem chance de defesa. "No romance, quase todos os habitantes do lugarejo onde mora a vítima, ficam sabendo do homicídio premeditado algumas horas antes (daí o título), mas não fazem nada de concreto para proteger a vítima ou impedir os algozes (...)". "Do padre ao delegado de polícia, todos sabiam muito antes de morrer, que Santiago tinha Pedro e Pablo à sua espera, com as facas afiadas dos porcos. No entanto, por medo, receio ou covardia, comodismo, ou mero sadismo, ninguém avisou Santiago, preferindo antes observa-lo, inocente, ingênuo, caminhando impávido e sereno para a morte".
Mas, ao contrário da ignorância de Santiago quanto ao homicídio premeditado, o Coritiba sabia muito bem das ameaças concretas de violência anunciada para o jogo contra o Fluminense. E, três dias antes, o presidente Jair Cirino dos Santos encaminhou ofício ao secretário da Segurança do Paraná, denunciando fato gravíssimo com as seguintes palavras: "Fomos surpreendidos com várias manifestações de torcedores, que não se identificaram, dizendo que elementos integrantes das torcidas organizadas circularam pelas filas incitando-os a promover um quebra-quebra no estádio, independentemente do resultado do jogo."
Portanto e muito antes da partida, tornou-se público, notório e irreversível o rompimento absoluto de relações entre a administração do Coritiba e pessoas do grupo criminoso. Seguiu-se o pedido de socorro, nestes termos: "Solicitamos os bons e costumeiros préstimos de Vossa Excelência no sentido de desencadear um processo para o enfrentamento dos fatos relatados".
Apesar disso, no primeiro julgamento foram aplicadas as penas máximas previstas pelos arts. 211, 213 e 213, º 1º do Código Brasileiro de Justiça Desportiva, totalizando 30 mandos de jogos e R$ 610.000,00 de multa, quantidades inéditas na história dos clubes brasileiros! Basicamente, as acusações foram:
a) deixar de manter o local com infraestrutura necessária para a segurança e a plena garantia do evento;
b) deixar de tomar providências capazes de prevenir e reprimir desordens, invasão de campo e o lançamento de objetos.
Mas, como condenar o clube que, dias antes, pediu socorro ao Estado que tem o dever constitucional de propiciar segurança pública aos cidadãos ? Foram contratados seguranças privados em número superior às partidas anteriores. Sem o poder de polícia (detenção) e o uso de armamento, o que mais poderia fazer o Coritiba? (Segue)
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*Professor titular de Direito Penal da Universidade Federal do Paraná - UFPR, foi membro do Tribunal de Justiça Desportiva da Federação Paranaense de Futebol e diretor-jurídico do Coritiba Foot Ball Club. É um dos advogados que redigiu o recurso para o Superior Tribunal de Justiça Desportiva - STJD.
Advogado do Escritório Professor René Dotti
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