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Réquiem ao equilíbrio econômico-financeiro dos contratos administrativos

Tema sempre controverso nos contratos firmados pela Administração Pública, o equilíbrio econômico-financeiro é usualmente repelido pelo gestor do contrato. De modo geral, parte-se sempre da premissa de que o particular contratado é o responsável por seu próprio infortúnio e os pleitos de recomposição da equação contratual são sempre infundados e fruto da própria incompetência do executor do contrato.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Atualizado em 11 de janeiro de 2010 11:49


Réquiem ao equilíbrio econômico-financeiro dos contratos administrativos

Caio de Souza Loureiro*

Tema sempre controverso nos contratos firmados pela Administração Pública, o equilíbrio econômico-financeiro é usualmente repelido pelo gestor do contrato. De modo geral, parte-se sempre da premissa de que o particular contratado é o responsável por seu próprio infortúnio e os pleitos de recomposição da equação contratual são sempre infundados e fruto da própria incompetência do executor do contrato.

Esquece-se, contudo, que a proteção ao equilíbrio econômico-financeiro decorre do próprio texto constitucional, que em seu art. 37, XXI, assegura a manutenção das "condições efetivas da proposta". Trocando em miúdos, a Constituição (clique aqui) reconhece a importância de acautelar a proposta do particular, feita ainda no certame licitatório e com a qual concebeu a execução do objeto contratado. Essa proteção, longe de constituir benefício desproporcional ao particular, visa proteger aqueles que se dispõem a contratar com a Administração naquilo que lhe é mais sensível: as condições econômicas do contrato. Com isto, viabiliza-se o próprio processo de contratação, provavelmente deserto se o particular não pudesse contar com garantias do retorno dos investimentos.

Ora, diante do amplo rol de prerrogativas da Administração contratante, seria ingênuo supor do interesse de alguém que se dispusesse a contratar com o poder público se não tivesse uma mínima garantia de manutenção das condições econômicas do contrato. Para isto, presta-se a proteção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, permitindo ao particular requisitar à Administração o reajuste das cláusulas contratuais sempre que as condições econômicas forem alteradas fora da sua margem de ingerência. A garantia ao equilíbrio econômico-financeiro é, assim, meio hábil a proteger o particular e, com isto, manter o interesse do setor privado nas contratações públicas.

É esta premissa basilar dos contratos administrativos que vem sendo esquecida e combatida nos últimos tempos. Parte-se sempre da precipitada afirmação de que todo pedido de recomposição contratual é indevido e atende somente aos interesses do particular. Vive-se uma realidade kafkaniana, na qual o direito do contratado é suprimido sem a menor apuração das suas razões: é sempre ele o culpado pela situação de desequilíbrio; é sempre ele o aproveitador que busca aumentar o seu quinhão à custa do erário.

Essa convenção é extremamente perversa com o particular e, levada ao extremo, poderá comprometer seriamente o sucesso das contratações públicas. Não se nega que em alguns casos o desequilíbrio é realmente ocasionado pelo particular, que não merece contar com os benefícios dos mecanismos de recomposição. Contudo, espraiar esta conclusão para todos os contratos é, além de ingênuo, maléfico ao interesse público.

Negar ao particular, prima facie, o direito ao equilíbrio econômico-financeiro é ingênuo por ignorar premissas incontornáveis. A primeira delas é a burocracia da Administração, que pode acarretar o atraso e a má execução das obrigações que lhe cabem na relação contratual. Em alguns casos, o particular é dependente de atos da Administração que, quando não praticados ou feitos em atraso comprometem a equação contratual. Nestes casos, indubitável o direito à recomposição, sendo certo que o desequilíbrio foi ocasionado exclusivamente pela Administração, desidiosa no cumprimento das suas obrigações.

Outra situação comum é a interferência exorbitante da Administração na execução do contrato. Muitas vezes - devidamente, ou não - a Administração altera o projeto executivo, o que pode onerar a execução contratual. Esta alteração nem sempre é acompanhada da devida recomposição econômica do contrato, o que acarreta prejuízos ao particular, cuja faculdade de se recusar a continuar a executar o contrato poderá ensejar a aplicação de penalidades extremamente gravosas.

Ademais, não se pode ignorar a imprevisibilidade. Por mais que Administração e particular atendam as suas obrigações contratuais, a execução do contrato poderá ser comprometida por fatores externos. São muitas as variáveis na execução de determinados contratos (desastres naturais, alterações legislativas, condições geológicas desconhecidas, dentre outras) e é draconiano impor ao particular que assuma o risco por todas elas, pena de arcar com ônus excessivo na execução contratual.

Vê-se desse breve apanhado que o pleito à recomposição do equilíbrio econômico-financeiro nem sempre é desprovido de razão. Pelo contrário. A prática dos contratos administrativos é farta em exemplos de como a execução pode se tornar indevidamente onerosa ao particular por circunstâncias alheias a sua vontade e que, portanto, merecem ser consideradas na revisão das condições contratuais. Esta atitude não representa a outorga de benefício indevido ao particular, indo antes ao encontro da previsão constitucional, sensível à necessidade de se prover mecanismos de garantia do direito do contratado, como pré-requisito ao sucesso dos contratos administrativos.

Bem por isso que os pleitos de recomposição da equação contratual devem ser analisados tendo por princípio a necessidade de garantir as condições econômicas originais do contrato. Ao contrário do que é usualmente propagado, o particular contratado nem sempre é o vilão da história, pois nem é o caso de conceber a relação contratual como uma relação maniqueísta, mas, sim, como uma relação simbiótica, na qual direitos e deveres devem ser observados por ambas as partes.

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*Advogado associado do escritório Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Sociedade de Advogados

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